Tratamento tributário e creditício diferenciado em função dos impactos ambientais encontra-se presente em inúmeras leis e decretos aprovados nas três últimas décadas. Mas falta regularmentar muitos dispositivos e implementá-los
Foi em plena ditadura militar que o governo federal instituiu o que pode ter sido o primeiro instrumento econômico robusto para desestimular a economia marrom e impulsionar operações industriais mais limpas no Brasil. Assinado em 3 de outubro de 1975 pelo general Ernesto Geisel, então presidente da República, o Decreto 76.389/1975 estabeleceu em seu artigo 5º a restrição de incentivos, benefícios fiscais e financiamento em bancos públicos a empresas que descumprissem medidas de prevenção ou correção das perdas e inconvenientes causados pela poluição ambiental gerada por suas atividades. No mesmo artigo, também é prevista a suspensão das operações da empresa. Não há acompanhamento sobre a aplicação do artigo 5º do Decreto 76.389 pelo governo, pelo Legislativo nem pela sociedade civil nem pelas entidades representativas do mundo corporativo. Enfim, é muito provável que o decreto tenha virado letra morta.
O dispositivo legal foi mencionado pelo economista Marcio Pochmann, professor do Instituto de Economia da Unicamp e ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), no seminário “Política tributária e sustentabilidade: uma plataforma para a nova economia”, realizado em Brasília no dia 29 de outubro pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) em parceria com o Instituto Ethos e a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado (CAE). Pochmann listou quase uma dúzia de leis e decretos aprovados nas últimas três décadas com previsão de incentivos fiscais e restrições creditícias e tributárias em função do impacto ambiental da atividade econômica.
Outro exemplo eloquente de que o tratamento diferenciado já faz parte da legislação brasileira há muito tempo, muito antes até mesmo da Rio-92, é a Lei 6.938, de agosto de 1981, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA). Ela possui pelo menos 11 dispositivos prevendo incentivos ou restrições financeiras vinculados à promoção da proteção ambiental e do uso racional dos recursos naturais.
Há, ainda, a Lei 9.433/1997, conhecida como Lei das Águas, que introduziu a cobrança pelo uso dos recursos hídricos, e o artigo 8º do Decreto 5.746/2006, que isenta do Imposto sobre Propriedade Territorial Rural (ITR) as Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN). O benefício vale para RPPNs federais, estaduais e municipais.
No novo Código Florestal, aprovado em maio de 2012 (Lei 12.651/2012), há um punhado de incentivos previstos para os produtores que recuperarem áreas de preservação permanente (APPs) e reserva legal (RL) e contribuírem para a oferta de serviços ambientais, como o sequestro de carbono e a conservação da biodiversidade, dos recursos hídricos e do solo.
Vantagens tributárias na esfera estadual incluem o ICMS Ecológico, estabelecido nas legislações de 17 estados, embora implementado em apenas dez estados até o momento. O mecanismo redistribui uma parcela da arrecadação do imposto entre os municípios com parte de seu território sob uso econômico limitado ou proibido devido à presença de unidades de conservação.
Dezenas de cidades aprovaram leis ou discutem projetos de lei criando o IPTU Verde, que chega a oferecer descontos de até 80% no valor desse imposto, caso de São Bernardo do Campo, no ABC Paulista. O município pioneiro no instrumento foi São Carlos, em 2008, no interior de São Paulo.
Entre outras cidades, o IPTU Verde já é realidade em Guarullhos (SP), Curitiba (PR), Goiânia (GO) e Chapecó (SC). Em geral, o programa reduz o imposto de domicílios com sistemas de reúso da água da chuva, aquecimento solar, eficiência energética, utilização de materiais sustentáveis na construção, áreas verdes e coleta seletiva de lixo.
Os dispositivos mencionados representam apenas uma amostra das dezenas de leis, decretos e regulamentos federais, estaduais e municipais que instituíram incentivos tributários ao desenvolvimento sustentável e à proteção ambiental. Isso sem contar as centenas de projetos de lei (PLs) sobre o tema que tramitam no Legislativo dos três níveis de governo. No âmbito federal, destacam-se duas propostas – o PL 792/2007, que institui a política nacional de pagamento por serviços ambientais, e o PL 5.974/2005, que cria o IR Ecológico, permitindo a pessoas físicas e jurídicas deduzirem do imposto de renda até 80% e até 40%, respectivamente, dos valores doados a projetos voltados ao uso sustentável dos recursos naturais.
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A solução da tributação do carbono em “Cide-carbono começaria valendo R$3,00“
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[:en]Tratamento tributário e creditício diferenciado em função dos impactos ambientais encontra-se presente em inúmeras leis e decretos aprovados nas três últimas décadas. Mas falta regularmentar muitos dispositivos e implementá-los
Foi em plena ditadura militar que o governo federal instituiu o que pode ter sido o primeiro instrumento econômico robusto para desestimular a economia marrom e impulsionar operações industriais mais limpas no Brasil. Assinado em 3 de outubro de 1975 pelo general Ernesto Geisel, então presidente da República, o Decreto 76.389/1975 estabeleceu em seu artigo 5º a restrição de incentivos, benefícios fiscais e financiamento em bancos públicos a empresas que descumprissem medidas de prevenção ou correção das perdas e inconvenientes causados pela poluição ambiental gerada por suas atividades. No mesmo artigo, também é prevista a suspensão das operações da empresa. Não há acompanhamento sobre a aplicação do artigo 5º do Decreto 76.389 pelo governo, pelo Legislativo nem pela sociedade civil nem pelas entidades representativas do mundo corporativo. Enfim, é muito provável que o decreto tenha virado letra morta.
O dispositivo legal foi mencionado pelo economista Marcio Pochmann, professor do Instituto de Economia da Unicamp e ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), no seminário “Política tributária e sustentabilidade: uma plataforma para a nova economia”, realizado em Brasília no dia 29 de outubro pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) em parceria com o Instituto Ethos e a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado (CAE). Pochmann listou quase uma dúzia de leis e decretos aprovados nas últimas três décadas com previsão de incentivos fiscais e restrições creditícias e tributárias em função do impacto ambiental da atividade econômica.
Outro exemplo eloquente de que o tratamento diferenciado já faz parte da legislação brasileira há muito tempo, muito antes até mesmo da Rio-92, é a Lei 6.938, de agosto de 1981, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA). Ela possui pelo menos 11 dispositivos prevendo incentivos ou restrições financeiras vinculados à promoção da proteção ambiental e do uso racional dos recursos naturais.
Há, ainda, a Lei 9.433/1997, conhecida como Lei das Águas, que introduziu a cobrança pelo uso dos recursos hídricos, e o artigo 8º do Decreto 5.746/2006, que isenta do Imposto sobre Propriedade Territorial Rural (ITR) as Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN). O benefício vale para RPPNs federais, estaduais e municipais.
No novo Código Florestal, aprovado em maio de 2012 (Lei 12.651/2012), há um punhado de incentivos previstos para os produtores que recuperarem áreas de preservação permanente (APPs) e reserva legal (RL) e contribuírem para a oferta de serviços ambientais, como o sequestro de carbono e a conservação da biodiversidade, dos recursos hídricos e do solo.
Vantagens tributárias na esfera estadual incluem o ICMS Ecológico, estabelecido nas legislações de 17 estados, embora implementado em apenas dez estados até o momento. O mecanismo redistribui uma parcela da arrecadação do imposto entre os municípios com parte de seu território sob uso econômico limitado ou proibido devido à presença de unidades de conservação.
Dezenas de cidades aprovaram leis ou discutem projetos de lei criando o IPTU Verde, que chega a oferecer descontos de até 80% no valor desse imposto, caso de São Bernardo do Campo, no ABC Paulista. O município pioneiro no instrumento foi São Carlos, em 2008, no interior de São Paulo.
Entre outras cidades, o IPTU Verde já é realidade em Guarullhos (SP), Curitiba (PR), Goiânia (GO) e Chapecó (SC). Em geral, o programa reduz o imposto de domicílios com sistemas de reúso da água da chuva, aquecimento solar, eficiência energética, utilização de materiais sustentáveis na construção, áreas verdes e coleta seletiva de lixo.
Os dispositivos mencionados representam apenas uma amostra das dezenas de leis, decretos e regulamentos federais, estaduais e municipais que instituíram incentivos tributários ao desenvolvimento sustentável e à proteção ambiental. Isso sem contar as centenas de projetos de lei (PLs) sobre o tema que tramitam no Legislativo dos três níveis de governo. No âmbito federal, destacam-se duas propostas – o PL 792/2007, que institui a política nacional de pagamento por serviços ambientais, e o PL 5.974/2005, que cria o IR Ecológico, permitindo a pessoas físicas e jurídicas deduzirem do imposto de renda até 80% e até 40%, respectivamente, dos valores doados a projetos voltados ao uso sustentável dos recursos naturais.
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