O cara que disse que o dinheiro não compra felicidade não sabia onde fazer compras”, disse o irreverente roqueiro David Lee Roth. Será mesmo? Não faz muito tempo, a imprensa noticiou que a New Economics Foundation havia divulgado o seu Happy Planet Index, com base em indicadores nacionais como a expectativa de vida, o bem-estar dos cidadãos e o nível de impactos ambientais.
A surpreendente conclusão foi que o arquipélago de Vanuatu, no Pacífico, lar de pescadores e pequenos agricultores, liderava o ranking dos países mais felizes, embora o seu PIB seja o 207o do planeta. Enquanto isso, o Brasil ficava em 65o lugar e os Estados Unidos amargavam o 150o, um dos últimos da pesquisa.
Essa desconexão— ou mesmo antagonismo—entre a riqueza e a felicidade tem sido reiteradamente comprovada pela academia. Um dos pesquisadores que se debruçam sobre o tema é o britânico Andrew Oswald, da Universidade de Warwick, na Inglaterra.
Para ele, o enriquecimento vem acompanhado de uma competitividade mais agressiva, primeiro com os vizinhos e colegas, depois com as celebridades. Precisamos adquirir não porque o produto nos tornará mais felizes, mas porque outros o possuem. Isso, naturalmente, aumenta a ansiedade do indivíduo.
Alguns experimentos que Oswald promoveu demonstraram que dois terços dos indivíduos estudados aceitariam reduzir suas próprias posses se isso também empobrecesse outras pessoas.
Além disso, diz o pesquisador, você se acostuma com os seus bens e perde o entusiasmo por eles. Para completar, os seres humanos são incompetentes na identificação do que os faria felizes, de modo que fazem opções equivocadas. As compras não têm eficiência do ponto de vista da aquisição de bem-estar e satisfação.
Para corroborar, Oswald cita pesquisas que indicam que as mulheres americanas brancas se mostram muito mais infelizes do que as suas mães e que os índices de suicídio per capita dos EUA são os mesmos do início do século XX, embora o valor atualizado dos salários tenha subido seis vezes desde então. Além disso, os britânicos estariam sofrendo cada vez mais de depressão e de estresse no trabalho.
Num artigo que publicou no jornal Financial Times no início do ano, ele lembra que a Inglaterra atravessa o mais longo período de crescimento econômico desde o início do século XVIII—sem que isso tenha ampliado a felicidade reinante. “Quando toda a sociedade se torna mais rica, o bem-estar permanece, em média, o mesmo”, diz.
“Há muitas evidências estatísticas e laboratoriais que comprovam uma heresia: uma vez que um país encheu seus cofres, não há por que enriquecer ainda mais”, escreve. Por isso, argumenta, insistir na promoção do crescimento econômico poderia ser um equívoco.
Os estudos de Oswald encontram ressonância nos trabalhos da socióloga Juliet Schor, professora de Harvard. Ela calcula que o americano médio trabalha o equivalente a um mês adicional por ano em relação a 30 anos atrás. Juliet escreve em seu livro The Overworked American que “a cultura das horas extras se espalha como câncer”. Isso estaria multiplicando os divórcios e outros problemas sociais.
Nesse contexto, as compras serviriam como uma espécie de compensação pela perda de tempo e da qualidade de vida. Estabelece-se aí um círculo vicioso. Você trabalha mais para comprar e manter o que comprou e compra mais para compensar esse esforço extra.
Se o maravilhoso mundo das compras não traz a felicidade, então, o que traz? Há indícios de que ela pode estar relacionada, principalmente, ao estado civil e às relações sociais do sujeito. O professor holandês Ruut Veenhoven, da Universidade Erasmus, de Roterdã, criou um amplo banco de dados sobre o tema. Ele acredita que a educação e a renda são responsáveis por uns 5% da felicidade do indivíduo. Paradoxalmente, indica países ricos, como a Dinamarca e a Suíça, como campeões no tema—em contraste com os Achados do Happy Planet Index.
Argumenta, porém, que eles se destacam não apenas pela afluência, mas também pela democracia e tolerância. Outros fatores que o pesquisador não considera prioritários para a felicidade são a inteligência e a saúde. Já o aprimoramento das relações sociais e uma maior intimidade com os mais próximos responderiam por algo entre 10% e 15%.
Com base em suas estatísticas, Veenhoven aponta o casamento—mas não a geração de filhos—como fator promotor da felicidade.
Também recomenda duas ou três doses de álcool por dia (que, diz, relaxa e colabora para a socialização), um chocolatinho, hobbies ao ar livre (em contraste com aqueles domésticos) e o trabalho voluntário. Ou, se preferir, rebata David Lee Roth com uma frase de Drummond: “Ser feliz sem motivo é a mais autêntica forma de felicidade”.