Por Regina Scharf – Jornalista especializada em meio ambiente
Lembra do tempo em que, se perguntassem qual a relação do esporte com a degradação ambiental, você diria que a Mata Atlântica perde tantos campos de futebol por dia? Bons tempos aqueles.
A mudança climática, a perda da biodiversidade e a poluição ameaçam reduzir um punhado de modalidades a uma mera lembrança. É o que avisa uma recente reportagem da bíblia dos torcedores americanos, a Sports Illustrated. Na capa, a imagem de um jogador de beisebol com água pelos joelhos.
A vítima mais óbvia são os esportes de inverno. O último Campeonato Mundial de Esqui teve um inegável gosto de fim de festa. As estações de inverno de Val d’Isère, na França, e de St.-Moritz, na Suíça, foram obrigadas a cancelar as provas da competição que sediariam devido à falta de neve.
A etapa de Hochfilzen, na Áustria, só aconteceu porque 15 mil metros cúbicos de neve foram trazidos do Grossglockner, o pico mais alto do país. O progressivo aumento da temperatura reduziu em 12 dias a temporada de esqui nos Alpes ao longo de duas décadas. E os resorts que vivem da neve estão desenvolvendo programas primaveris, com direito a spas e caminhadas, por medo de hospedarem apenas moscas no futuro.
Outros esportes de inverno correm risco de desaparecer, como as corridas de trenós puxados por cães, promovidas no Alasca, ou a tradicional maratona sobre patins que percorre várias cidades holandesas quando os canais congelam, mas que só pôde ser promovida uma vez nos últimos 20 anos.
Mas modalidades mais tropicais também estão ameaçadas. É o caso do montanhismo – que exige paisagens bem conservadas – ou do mergulho subaquático, ameaçado pelo aquecimento global, a crescente poluição dos mares e o encolhimento dos cardumes, dos mangues e dos bancos de corais.
Não se trata apenas do comprometimento de importantes opções de lazer. O peso dessas perdas para a economia é imenso. Dados levantados pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente indicam que a Suíça, sozinha, deverá perder entre US$ 1,5 bilhão e US$ 2,1 bilhões anuais em 2050 devido ao derretimento de suas neves “eternas”.
Evidentemente, as práticas esportivas não são apenas vítimas inocentes da ação de terceiros. Elas também têm culpa no cartório da insustentabilidade.
O esporte profissional exige que os atletas se desloquem com freqüência para participar de campeonatos, queimando combustível em carros e aviões. Demanda também a construção de estádios com capacidade cada vez maior e estacionamentos imensos, que impermeabilizam o solo e entopem as vias de escoamento do tráfego. E sobrecarregam a infra-estrutura das cidades que sediam competições importantes.
Além disso, hordas de corredores, montanhistas, ciclistas, participantes de ralis e mergulhadores avançam sobre ambientes até então isolados.
Um esporte particularmente delicado do ponto de vista ambiental é o golfe, que exige a manutenção de cerca de 30 hectares de gramados, geralmente à custa de pesticidas e muita irrigação artificial. São raros os campos que aproveitam a cobertura vegetal original.
A boa notícia é que os esportistas estão começando a usar a sua popularidade para educar os fãs.
Famoso pela máscara prateada e por uma manobra batizada de “mergulho suicida”, El Hijo del Santo é uma das maiores estrelas da luta livre mexicana. Entre uma chave de pernas e um nocaute, ele visita comunidades costeiras da América do Norte, pregando o tratamento de esgotos e a conservação da vida oceânica.
O megaskatista paulista Bob Burnquist optou pela promoção do estabelecimento de hortas orgânicas em escolas americanas, enquanto a tenista Martina Navratilova luta para melhorar o acesso à água potável nos países pobres. Mas o patrono dos esportistas engajados foi Sir Peter Blake, o grande velejador neozelandês assassinado por piratas no Amapá em 2001. Ele liderava uma série de expedições internacionais para monitorar os efeitos do aquecimento e da poluição sobre os oceanos.
Já existem, inclusive, equipes calculando e tentando minimizar a sua pegada ecológica. É o caso do Colorado Rapids, time júnior de futebol do estado americano do Colorado que se gaba de ser o primeiro time neutro em termos de carbono. Eles têm estimado o valor das suas emissões, que são compensadas com reflorestamento e investimento em energias alternativas.
É, do jeito como as coisas vão, só uma categoria de desportistas poderá ignorar as mudanças: os enxadristas.
E olhe lá.