Ações de ecoterrorismo no mundo afora chamam a atenção para causas ambientais e o direito dos animais. Uma acaba de receber aval da Justiça. Mas até que ponto seriam aceitáveis?
Seria a sabotagem válida para promover os valores da ética e da sustentabilidade? Um número surpreendente de militantes da causa ambiental e do direito dos animais parece acreditar que sim. E uma decisão recente da Justiça inglesa lhes deu razão.
Em setembro, um tribunal do condado de Kent concedeu ganho de causa a ativistas do Greenpeace que invadiram e picharam uma termoelétrica a carvão, causando prejuízos no valor de 35 mil libras. O júriconcluiu que é legítimo danificar a propriedade alheia se isso puder evitar um dano ainda maior – no caso, o aquecimento global. A usina emite 20 mil toneladas diárias de gás carbônico, mais que a soma dos 30 países menos poluidores.
Ações como esta são mais comuns do que se imagina. Em junho, a Frente de Libertação dos Animais incendiou veículos e instalações da Charles River, um grande criadouro de cobaias da região de Lyon, na França. No ano passado, a Tecniplast, fabricante de gaiolas da mesma região, sofreu ataque semelhante. O Bite Back, um website apócrifo baseado na Califórnia, traz fotos e depoimentos de gente que se gaba de seus atos de ecossabotagem, sem identificar quem são os autores. Ele registra centenas de episódios de liberação de animais de matadouros e laboratórios, com veracidade difícil de comprovar. Sobre o ataque à Tecniplast, podemos ler: “Quando entramos no edifício, foram necessários menos de cinco minutos para garantir que a celebração fosse inesquecível… O fogo se espalhou rapidamente. Que espetáculo esplêndido iluminou a noite!” E ameaçaram: “Isto é só um aviso. A Tecniplast ainda não viu nada…”
Panetones envenenados
É difícil colocar todas as ações dessa natureza num só saco. Algumas praticamente não usam violência, como o ato do Greenpeace em Kent, mas outras são extremamente agressivas. É o caso de uma operação do braço italiano da Frente de Libertação dos Animais, que em 1998 anunciou que havia envenenado panetones produzidos pela Nestlé, em um protesto contra a decisão da empresa de adotar trigo transgênico em suas receitas. A ação obrigou a empresa a recolher o produto, a um custo superior a US$ 30 milhões.
Esse terror natalino se afasta da tradição da desobediência civil que originou a maioria dos atos de ecossabotagem. Um bom exemplo do uso da não-violência na militância é dado pelas ações navais do Greenpeace, que já no início dos anos 70 posicionava suas embarcações de modo a bloquear a passagem de baleeiros ou impedir testes nucleares.
Um dos maiores propagandistas desse tipo militância, o escritor anarquista Edward Abbey, ganhou fama no fim dos anos 50 com o lema: “Mantenha a beleza dos EUA… queime um outdoor”. Seu best-seller The Monkey Wrench Gang, de 1975, tem até hoje um batalhão de seguidores. Um dos seus personagens é visto ajoelhado no topo de uma barragem, rezando para que um terremoto destrua esta “rolha” que freava o Rio Colorado. O romance, aliás, deve virar filme em breve, com Richard Dreyfus e Jack Nicholson nos papéis principais.
Mas, como se viu no episódio dos panetones, nem todos os ecossabotadores se limitam a bloquear estradas ou orar pela intervenção da força da natureza. O grupo mais notório por sua militância agressiva é o Sea Shepherd, dissidente do Greenpeace que ganhou fama em 1986, quando dois dos seus ativistas causaram um prejuízo de US$ 1,8 milhão a uma fábrica de processamento de carne de baleia de Reykjavik, capital da Islândia, além de afundarem dois navios baleeiros – outros US$ 2,8 milhões em perdas.
Práticas extremadas como essas são freqüentemente classificadas como ecoterrorismo – conceito inadequado, porque esses ativistas costumam respeitar a vida, ao contrário dos terroristas convencionais. Mas o FBI não vê distinção. A agência já declarou que o ecoterrorismo é a principal ameaça terrorista originada dentro das fronteiras americanas. Tremei, devastadores e torturadores de animais!
*jornalista especializada em meio ambiente