Considerar o meio ambiente na estaca zero do planejamento político pode ajudar a prevenir litígios, acelerar obras e ainda promover a sustentabilidade
Não é de hoje que os projetos de desenvolvimento no Brasil esbarram em contendas ambientais virtualmente intermináveis. Assim que o governo, sempre amparado pela mácula do apagão, opta por projetos polêmicos como termoelétricas e grandes hidrelétricas, ambientalistas põem-se a clamar pelos bagres, pelas populações de atingidos, pela mata vulnerável às oscilações da economia, contra as emissões de gases de efeito estufa. O mesmo vale para a política de transporte ou a industrialou a do desenvolvimento agrário.
Isso sem falar nas constantes intervenções judiciais, movidas pelo Ministério Público, e nos órgãos responsáveis por liberar licenças ambientais, pressionados ao mesmo tempo por mais celeridade e mais rigor no trato com os recursos naturais.
É, é truncado e confuso. Talvez por isso seja difícil imaginar que todo esse quadro de disputa pode ter uma raiz comum e a facilitação ser tão simples e elementar quanto o que diz a sabedoria de nossos avós: “É melhor prevenir do que remediar”.
Sempre que o capcioso dilema entre crescer e conservar cai nos holofotes do debate nacional, o alvo preferido é o licenciamento ambiental, processo pelo qual qualquer obra de fato ou potencialmente poluidora precisa atravessar antes que as máquinas comecem o seu trabalho. Mas o gargalo não necessariamente está aí.
Basta um olhar mais panorâmico para perceber que, antes que um projeto dê entrada no licenciamento ambiental, há uma política ou um programa setorial que o idealiza. Há análises de viabilidade econômica e técnica, o que implica aporte de investimentos, e um clima de expectativa por parte da iniciativa privada. Se lá na ponta do processo descobre-se que a obra aniquilaria uma população de espécies endêmicas, é tarde demais – ou custoso demais – para reverter a decisão tomada muito antes, no âmbito do planejamento estratégico.
Heureca
Essa percepção não é novidade. Já em 1987, o relatório Nosso Futuro Comum, produzido pela ONU, afirmava que “o principal desafio institucional dos anos 1990” seria fazer com que “as dimensões ecológicas das políticas sejam consideradas ao mesmo tempo que as econômicas (…) e outras dimensões – nas mesmas agendas e nas mesmas instituições”. O desafio permanece atual, mas foi justamente a partir da década de 90 que se disseminou o instrumento para realizar essa tarefa, conhecido como Avaliação Ambiental Estratégica (AAE).
Na União Européia, políticas, planos e programas de setores de alto impacto ambiental, como transportes e resíduos sólidos, são submetidos obrigatoriamente à AAE. O mesmo vale para o Canadá e também para alguns países em desenvolvimento, como a África do Sul. O instrumento é uma evolução da Avaliação de Impacto Ambiental (AIA), pois permite que a variável ambiental influencie decisões estratégicas quando ainda estão em aberto, em uma escala muito mais ampla que a de projetos específicos.
Dessa forma, é possível antecipar impactos ambientais cumulativos, ou seja, aqueles que parecem muito pequenos quando considerados em um único projeto, mas que, associados em cadeia – no caso de uma política -, tenderiam a se revelar como uma catástrofe oculta.
Aplicável a qualquer tipo de plano, esse instrumento também amplia a noção da origem dos impactos ambientais, que não aparecem apenas em obras. Políticas de isenção fiscal ou incentivos econômicos programáticos podem ter o mesmo efeito. Por fim, a AAE impede que planos de desenvolvimento e de meio ambiente sigam direções opostas, uma vez que as duas áreas são avaliadas simultaneamente.
“O Brasil optou por um caminho que vincula a avaliação de impacto ambiental apenas à instância de projeto. Mas o projeto é só o ponto final de uma linha de planejamento. Por isso é muito comum, em audiências públicas, ver pessoas querendo discutir outras coisas, por exemplo, por que o petróleo deve fazer parte da matriz energética nacional”, explica a secretária-executiva do Ministério do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, cuja tese de doutorado trata da aplicação da AAE no setor de petróleo e gás.
“Hoje, a avaliação de impacto ambiental não serve para dizer que algo não é viável. Mas apenas para fazer projetos com menor impacto negativo e, se possível, maximizar o lado positivo”, ecoa Luis Enrique Sánchez, professor livre-docente da Universidade de São Paulo, especialista em planejamento e gestão ambiental.
Izabella adverte que o tratamento das questões ambientais exclusivamente na etapa do licenciamento não compromete apenas o meio ambiente. Joga no colo do empreendedor uma série de empecilhos que poderiam ser evitados, criando um ambiente de negócios inseguro – o que também está ligado ao alto nível de judicialização dos licenciamentos ambientais no Brasil. Segundo a secretária, há setores do governo interessados em aplicar a AAE, como o Ministério dos Transportes, em seu Plano Nacional de Logística de Transportes.
Na prática
Poucos casos são tão simbólicos da falta de convergência entre as políticas quanto a oferta de 243 blocos de exploração de petróleo no arquipélago de Abrolhos, Sul da Bahia, em 2002. A Quinta Rodada de Licitações Internacionais para Exploração de Petróleo e Gás no Brasil incluía a região com a maior biodiversidade marinha do Atlântico Sul e santuário de reprodução para as ameaçadas baleias jubartes. Alarmados com a possibilidade de impactos ambientais irreversíveis, um conjunto de organizações da sociedade civil e universidades uniram-se para formular um estudo que segue os preceitos da AAE – embora, a rigor, a AAE só se aplique aos chamados três Ps: políticas, planos e programas, e a oferta de blocos seria apenas a ponta do processo.
“O que a gente fez foi demonstrar que aquele projeto era incompatível com outras políticas de desenvolvimento anteriores, baseadas na pesca e no turismo, além da legislação que já protegia aquela região”, relembra Guilherme Dutra, diretor do programa marinho da Conservação Internacional, entidade que liderou os estudos.
As organizações demonstraram, por exemplo, que as áreas ofertadas já haviam sido consideradas como as de maior sensibilidade às atividades de perfuração em toda a costa brasileira, pelo ELPN/Ibama. Lembraram que a região comportava o primeiro parque nacional marinho brasileiro e fora declarada pela Unesco, em parceria com o MMA, como Biosfera da Mata Atlântica e Sítio do Patrimônio Mundial Natural. Atentaram para o fato de que a região de Abrolhos já era alvo de investimentos da ordem de US$ 2,2 bilhões pelo Programa de Desenvolvimento do Turismo (Prodetur), para o período 1991-2012, e que a atividade representava 80 mil empregos diretos e indiretos.
O primeiro mérito estratégico, portanto, foi demonstrar a incompatibilidade entre as políticas de conservação, turismo e energia. O segundo foi estudar os impactos cumulativos de todas as fases pertinentes à atividade petrolífera.
A legislação brasileira só permite licenciamento fragmentado nesse tipo de atividade. Primeiro licenciam-se os levantamentos sísmicos, depois a perfuração e, em terceiro, a produção. “Isso é uma falha da legislação. Imagina se você descobre que não é viável produzir quando já investiu na fase sísmica e na perfuração! Uma avaliação ambiental estratégica poderia reduzir esse risco”, considera Dutra.
O resultado desse esforço é que, pela primeira vez no País, a oferta de blocos de exploração de petróleo foi suspensa por pressão da sociedade civil. Uma decisão conjunta do MMA e da Agência Nacional de Petróleo (ANP) retirou 163 blocos do leilão. Seguindo a tradição de interferência judicial, o Ministério Público da Bahia conseguiu uma liminar para excluir as demais áreas. Nem foi preciso chegar às vias de fato. Ao cabo da polêmica, potenciais investidores perderam qualquer interesse pelo banco de Abrolhos.
“Foi uma situação de ‘ganha-ganha'”, avalia Dutra, “se esses blocos tivessem sido leiloados, as empresas ganhadoras teriam que lidar com uma oposição muito forte de um conjunto de setores, sem falar na justiça”.
Pelo fim da papelada
Embora a institucionalização da AAE possa parecer relevante para o Brasil, há o risco de que a obrigatoriedade legal intensifique a burocracia, fazendo com que a nova etapa se transforme em mais uma formalidade. Quem alerta é Luis Enrique Sánchez: “As experiências internacionais têm uma série de pontos positivos, mas uma limitação é o enorme aporte de energia na preparação de documentos. As pessoas encarregadas das decisões muitas vezes não valorizam esse recurso, porque veem isso somente como uma exigência legal”.
Tal como o desenvolvimento sustentável, a AAE comporta um conjunto de princípios consensuais, mas uma enorme variedade de caminhos. As metodologias são flexíveis, aplicáveis a qualquer escala territorial, e pertinentes não só a governos, como também à iniciativa privada. Para o especialista, melhor seria que o Brasil amadurecesse a novidade.
Apenas em 2007 teve início o primeiro experimento na esfera governamental, em Minas Gerais (veja quadro abaixo). Em artigo recente, publicado no site do Instituto de Estudos Avançados (IEA), da USP, Sánchez escreveu: “A verdadeira medida do sucesso da AAE será sua capacidade de influenciar decisões, e não a feitura de relatórios volumosos e bem ilustrados”.
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Avaliação de Impacto Ambiental no Brasil – Das origens às tentativas de sofisticação
A Avaliação de Impacto Ambiental (AIA) surge pela primeira vez como instrumento da Política Nacional de Meio Ambiente, promulgada em 1981. Cinco anos depois, a primeira resolução do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) regulamentou o licenciamento ambiental, restringindo a obrigatoriedade da AIA apenas a essa etapa. Em 2002, um estudo encomendado pelo Ministério do Meio Ambiente recomendava que a AAE se tornasse obrigatória por lei e, em 2003, um projeto de lei com o mesmo objetivo foi impetrado pelo deputado federal Fernando Gabeira (PV-RJ). Ambas as propostas não prosperaram.
Primeiros passos – Minas Gerais começa a apostar na Avaliação Ambiental Estratégica. As obras avançam, diz gestor
Em 2007, o governo de Minas decidiu implantar, por meio de sua Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Semad), um processo de avaliação ambiental estratégica, envolvendo todas as secretarias relacionadas a obras públicas. Os estudos ainda estão em fase de elaboração, mas um projeto piloto já está em andamento na área de transportes.
O programa rodoviário do Estado (Proacesso) tem a missão de levar asfalto a 224 municípios e o projeto de engenharia foiconcebido em conjunto com os estudos ambientais. “As obras já estão acontecendo com mais velocidade e maior integração”, garante Leomar Azevedo, coordenador do Núcleo de Gestão Ambiental da Secretaria de Transportes e Obras Públicas (Setop). “Antigamente era muito comum acabar o recurso de uma obra e a recuperação ambiental ficava inacabada. Agora, não. A gente pode até licitar de novo, mas aí é para completar o conjunto”. É esperar para ver.[:en]Considerar o meio ambiente na estaca zero do planejamento político pode ajudar a prevenir litígios, acelerar obras e ainda promover a sustentabilidade
Não é de hoje que os projetos de desenvolvimento no Brasil esbarram em contendas ambientais virtualmente intermináveis. Assim que o governo, sempre amparado pela mácula do apagão, opta por projetos polêmicos como termoelétricas e grandes hidrelétricas, ambientalistas põem-se a clamar pelos bagres, pelas populações de atingidos, pela mata vulnerável às oscilações da economia, contra as emissões de gases de efeito estufa. O mesmo vale para a política de transporte ou a industrialou a do desenvolvimento agrário.
Isso sem falar nas constantes intervenções judiciais, movidas pelo Ministério Público, e nos órgãos responsáveis por liberar licenças ambientais, pressionados ao mesmo tempo por mais celeridade e mais rigor no trato com os recursos naturais.
É, é truncado e confuso. Talvez por isso seja difícil imaginar que todo esse quadro de disputa pode ter uma raiz comum e a facilitação ser tão simples e elementar quanto o que diz a sabedoria de nossos avós: “É melhor prevenir do que remediar”.
Sempre que o capcioso dilema entre crescer e conservar cai nos holofotes do debate nacional, o alvo preferido é o licenciamento ambiental, processo pelo qual qualquer obra de fato ou potencialmente poluidora precisa atravessar antes que as máquinas comecem o seu trabalho. Mas o gargalo não necessariamente está aí.
Basta um olhar mais panorâmico para perceber que, antes que um projeto dê entrada no licenciamento ambiental, há uma política ou um programa setorial que o idealiza. Há análises de viabilidade econômica e técnica, o que implica aporte de investimentos, e um clima de expectativa por parte da iniciativa privada. Se lá na ponta do processo descobre-se que a obra aniquilaria uma população de espécies endêmicas, é tarde demais – ou custoso demais – para reverter a decisão tomada muito antes, no âmbito do planejamento estratégico.
Heureca
Essa percepção não é novidade. Já em 1987, o relatório Nosso Futuro Comum, produzido pela ONU, afirmava que “o principal desafio institucional dos anos 1990” seria fazer com que “as dimensões ecológicas das políticas sejam consideradas ao mesmo tempo que as econômicas (…) e outras dimensões – nas mesmas agendas e nas mesmas instituições”. O desafio permanece atual, mas foi justamente a partir da década de 90 que se disseminou o instrumento para realizar essa tarefa, conhecido como Avaliação Ambiental Estratégica (AAE).
Na União Européia, políticas, planos e programas de setores de alto impacto ambiental, como transportes e resíduos sólidos, são submetidos obrigatoriamente à AAE. O mesmo vale para o Canadá e também para alguns países em desenvolvimento, como a África do Sul. O instrumento é uma evolução da Avaliação de Impacto Ambiental (AIA), pois permite que a variável ambiental influencie decisões estratégicas quando ainda estão em aberto, em uma escala muito mais ampla que a de projetos específicos.
Dessa forma, é possível antecipar impactos ambientais cumulativos, ou seja, aqueles que parecem muito pequenos quando considerados em um único projeto, mas que, associados em cadeia – no caso de uma política -, tenderiam a se revelar como uma catástrofe oculta.
Aplicável a qualquer tipo de plano, esse instrumento também amplia a noção da origem dos impactos ambientais, que não aparecem apenas em obras. Políticas de isenção fiscal ou incentivos econômicos programáticos podem ter o mesmo efeito. Por fim, a AAE impede que planos de desenvolvimento e de meio ambiente sigam direções opostas, uma vez que as duas áreas são avaliadas simultaneamente.
“O Brasil optou por um caminho que vincula a avaliação de impacto ambiental apenas à instância de projeto. Mas o projeto é só o ponto final de uma linha de planejamento. Por isso é muito comum, em audiências públicas, ver pessoas querendo discutir outras coisas, por exemplo, por que o petróleo deve fazer parte da matriz energética nacional”, explica a secretária-executiva do Ministério do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, cuja tese de doutorado trata da aplicação da AAE no setor de petróleo e gás.
“Hoje, a avaliação de impacto ambiental não serve para dizer que algo não é viável. Mas apenas para fazer projetos com menor impacto negativo e, se possível, maximizar o lado positivo”, ecoa Luis Enrique Sánchez, professor livre-docente da Universidade de São Paulo, especialista em planejamento e gestão ambiental.
Izabella adverte que o tratamento das questões ambientais exclusivamente na etapa do licenciamento não compromete apenas o meio ambiente. Joga no colo do empreendedor uma série de empecilhos que poderiam ser evitados, criando um ambiente de negócios inseguro – o que também está ligado ao alto nível de judicialização dos licenciamentos ambientais no Brasil. Segundo a secretária, há setores do governo interessados em aplicar a AAE, como o Ministério dos Transportes, em seu Plano Nacional de Logística de Transportes.
Na prática
Poucos casos são tão simbólicos da falta de convergência entre as políticas quanto a oferta de 243 blocos de exploração de petróleo no arquipélago de Abrolhos, Sul da Bahia, em 2002. A Quinta Rodada de Licitações Internacionais para Exploração de Petróleo e Gás no Brasil incluía a região com a maior biodiversidade marinha do Atlântico Sul e santuário de reprodução para as ameaçadas baleias jubartes. Alarmados com a possibilidade de impactos ambientais irreversíveis, um conjunto de organizações da sociedade civil e universidades uniram-se para formular um estudo que segue os preceitos da AAE – embora, a rigor, a AAE só se aplique aos chamados três Ps: políticas, planos e programas, e a oferta de blocos seria apenas a ponta do processo.
“O que a gente fez foi demonstrar que aquele projeto era incompatível com outras políticas de desenvolvimento anteriores, baseadas na pesca e no turismo, além da legislação que já protegia aquela região”, relembra Guilherme Dutra, diretor do programa marinho da Conservação Internacional, entidade que liderou os estudos.
As organizações demonstraram, por exemplo, que as áreas ofertadas já haviam sido consideradas como as de maior sensibilidade às atividades de perfuração em toda a costa brasileira, pelo ELPN/Ibama. Lembraram que a região comportava o primeiro parque nacional marinho brasileiro e fora declarada pela Unesco, em parceria com o MMA, como Biosfera da Mata Atlântica e Sítio do Patrimônio Mundial Natural. Atentaram para o fato de que a região de Abrolhos já era alvo de investimentos da ordem de US$ 2,2 bilhões pelo Programa de Desenvolvimento do Turismo (Prodetur), para o período 1991-2012, e que a atividade representava 80 mil empregos diretos e indiretos.
O primeiro mérito estratégico, portanto, foi demonstrar a incompatibilidade entre as políticas de conservação, turismo e energia. O segundo foi estudar os impactos cumulativos de todas as fases pertinentes à atividade petrolífera.
A legislação brasileira só permite licenciamento fragmentado nesse tipo de atividade. Primeiro licenciam-se os levantamentos sísmicos, depois a perfuração e, em terceiro, a produção. “Isso é uma falha da legislação. Imagina se você descobre que não é viável produzir quando já investiu na fase sísmica e na perfuração! Uma avaliação ambiental estratégica poderia reduzir esse risco”, considera Dutra.
O resultado desse esforço é que, pela primeira vez no País, a oferta de blocos de exploração de petróleo foi suspensa por pressão da sociedade civil. Uma decisão conjunta do MMA e da Agência Nacional de Petróleo (ANP) retirou 163 blocos do leilão. Seguindo a tradição de interferência judicial, o Ministério Público da Bahia conseguiu uma liminar para excluir as demais áreas. Nem foi preciso chegar às vias de fato. Ao cabo da polêmica, potenciais investidores perderam qualquer interesse pelo banco de Abrolhos.
“Foi uma situação de ‘ganha-ganha'”, avalia Dutra, “se esses blocos tivessem sido leiloados, as empresas ganhadoras teriam que lidar com uma oposição muito forte de um conjunto de setores, sem falar na justiça”.
Pelo fim da papelada
Embora a institucionalização da AAE possa parecer relevante para o Brasil, há o risco de que a obrigatoriedade legal intensifique a burocracia, fazendo com que a nova etapa se transforme em mais uma formalidade. Quem alerta é Luis Enrique Sánchez: “As experiências internacionais têm uma série de pontos positivos, mas uma limitação é o enorme aporte de energia na preparação de documentos. As pessoas encarregadas das decisões muitas vezes não valorizam esse recurso, porque veem isso somente como uma exigência legal”.
Tal como o desenvolvimento sustentável, a AAE comporta um conjunto de princípios consensuais, mas uma enorme variedade de caminhos. As metodologias são flexíveis, aplicáveis a qualquer escala territorial, e pertinentes não só a governos, como também à iniciativa privada. Para o especialista, melhor seria que o Brasil amadurecesse a novidade.
Apenas em 2007 teve início o primeiro experimento na esfera governamental, em Minas Gerais (veja quadro abaixo). Em artigo recente, publicado no site do Instituto de Estudos Avançados (IEA), da USP, Sánchez escreveu: “A verdadeira medida do sucesso da AAE será sua capacidade de influenciar decisões, e não a feitura de relatórios volumosos e bem ilustrados”.
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Avaliação de Impacto Ambiental no Brasil – Das origens às tentativas de sofisticação
A Avaliação de Impacto Ambiental (AIA) surge pela primeira vez como instrumento da Política Nacional de Meio Ambiente, promulgada em 1981. Cinco anos depois, a primeira resolução do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) regulamentou o licenciamento ambiental, restringindo a obrigatoriedade da AIA apenas a essa etapa. Em 2002, um estudo encomendado pelo Ministério do Meio Ambiente recomendava que a AAE se tornasse obrigatória por lei e, em 2003, um projeto de lei com o mesmo objetivo foi impetrado pelo deputado federal Fernando Gabeira (PV-RJ). Ambas as propostas não prosperaram.
Primeiros passos – Minas Gerais começa a apostar na Avaliação Ambiental Estratégica. As obras avançam, diz gestor
Em 2007, o governo de Minas decidiu implantar, por meio de sua Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Semad), um processo de avaliação ambiental estratégica, envolvendo todas as secretarias relacionadas a obras públicas. Os estudos ainda estão em fase de elaboração, mas um projeto piloto já está em andamento na área de transportes.
O programa rodoviário do Estado (Proacesso) tem a missão de levar asfalto a 224 municípios e o projeto de engenharia foiconcebido em conjunto com os estudos ambientais. “As obras já estão acontecendo com mais velocidade e maior integração”, garante Leomar Azevedo, coordenador do Núcleo de Gestão Ambiental da Secretaria de Transportes e Obras Públicas (Setop). “Antigamente era muito comum acabar o recurso de uma obra e a recuperação ambiental ficava inacabada. Agora, não. A gente pode até licitar de novo, mas aí é para completar o conjunto”. É esperar para ver.