A senadora ruralista e presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) não desiste de arrancar uma anistia para produtores rurais que desmataram ilegalmente. As lideranças do Senado discutem hoje, em regime de urgência, a votação de sua proposta de reforma do Código Florestal.
O projeto inclui anistia para desmatamento entre 2001 e 2006, a possibilidade de recuperação de áreas de preservação permanente com espécies exóticas e uma lambuja: “desmatamento zero”, a partir de agora, para a Amazônia e a Mata Atlântica.
Os argumentos da senadora se concentram em dois pontos principais: 1-não é justo que os produtores arquem sozinhos com o custo (R$ 425 bilhões, segundo cálculos da CNA) da recuperação de áreas degradadas, já que isso beneficiaria a sociedade como um todo;
2- Produtores desmataram legalmente no passado, e hoje são penalizados pelo recrudescimento da legislação. Refere-se à elevação do percentual de Reserva Legal na Amazônia, em 1995, de 50% para 80%.
Como contraponto, apresentamos aqui duas “entrevistas de gaveta”.
1- O agrônomo Mario Menezes, da ONG Amigos da Terra, conversou conosco no ano passado enquanto preparávamos a primeira reportagem sobre o Código Florestal. Na ocasião, ele ressaltou um ponto de vista poucas vezes lembrado: e quanto a tudo que o agronegócio lucrou durante as décadas de descumprimento da reserva legal? Se agora o setor é chamado a arcar sozinho com uma despesa que beneficia toda a sociedade, também é verdade que, no passado, não hesitou em lucrar sozinho com a destruição que prejudica toda a sociedade.
Numa folha de guardanapo, Menezes estruturou o que ele chama de “conta de padeiro”. Estimou em R$ 82 bilhões o lucro sobre a produção em áreas que deveriam ser de reserva legal, só para o setor de cana no Estado de São Paulo.
São 4 milhões de hectares de cana no Estado de São Paulo. Reserva legal corresponde a 20% = 800 mil hectares. Cada hectare rende em média 6.000 litros anuais a R$0,40 centavos o litro = R$ 2.400,00. Resultado: 800 mil hectares X R$ 2.400,00 X 43 anos de existência do Código Florestal = R$ 82 bi 560 milhões.
Vale ressaltar, de novo, que essa conta foi feita por alto e alguns fatores podem estar defasados. Mas serve para dar uma idéia da grandeza de valores que hoje a CNA contabiliza apenas como prejuízo.
2-Em entrevista recente, o pesquisador Paulo Barreto, do Imazon, explicou que o Código Florestal já abre a possibilidade de manter a Reserva Legal na Amazônia em 50%. Basta que o Zoneamento Econômico Ecológico de cada Estado aponte as áreas de maior intensidade produtiva. É o que já ocorreu em Rondônia e no Acre, embora não se tenha notícias de que essa flexibilização tenha incentivado produtores a regularizar suas terras.
Sobre anistia, Barreto é cabal, assim como muito outros estudiosos da questão amazônica. O que se propõe hoje não é novidade. Governo após governo, os perdões foram sendo concedidos sistematicamente e hoje esse é um dos principais motores do desrespeito enraizado e generalizado da legislação ambiental brasileira.