O ser humano vive uma relação ambígua com o tempo. Em algumas horas, torce para que passe rápido. Outras, para que passe devagar. No segundo caso, nem sempre para aproveitar melhor os momentos de regozijo ou lazer, mas para cumprir dentro do prazo todas as tarefas exigidas no trabalho.
Barbara Lana, de 33 anos, é diretora de criação de uma agência de comunicação do Rio de Janeiro. É ela quem coordena o trabalho do redator, responsável pelos textos de um anúncio; e do diretor de arte, que cuida da parte gráfica das peças publicitárias. As agências ficam suscetíveis aos prazos dos pedidos de cada cliente.
As solicitações podem ser frutos de um planejamento maior, quando há tempo de se programar, ou de demandas urgentes, que surgem fora de qualquer cronograma. É justamente por causa da urgência que a criatividade como fruto da contemplação da vida e da inspiração que vem nos momentos de ociosidade acaba sendo deixada de lado, muitas vezes.
Para que a lâmpada mágica acenda, o publicitário precisa se informar constantemente, principalmente sobre assuntos relacionados ao universo das empresas que contratam as agências onde trabalham. A internet é uma aliada. Além de notícias, a rede dispõe de blogs e sites com referências de ideias do mundo inteiro, que podem gerar pensamentos originais para novas campanhas, folders, sites, anúncios, eventos, promoções de venda.
Conversar com pessoas e grupos diferentes, com interesses e experiências diversas, também ajuda. “Não existe a justificativa de que nosso trabalho não ficou bom porque não houve tempo. É necessário realizar um trabalho excelente, mesmo que o prazo seja curto”, diz Barbara, lembrando pedidos que chegaram às 8 da noite e careciam de uma solução até a manhã seguinte.
Os pedidos são recebidos pela área de atendimento, que os encaminha ao setor de tráfego. O profissional desse núcleo sabe exatamente que área da agência acionar, para que a demanda do cliente seja atendida. É ele quem coordena o cronograma das ações dentro do escritório, relativo às áreas de criação, mídia e produção, por exemplo.
Se um trabalho mais urgente chega, o funcionário do tráfego pode recomendar a paralisação de uma tarefa, dando prioridade ao trabalho novo, cujo prazo é menor. “Temos um reloginho para cada demanda”, explica Ramon de Oliveira, que é do setor de tráfego e trabalha na mesma agência.
Casado há 25 anos, ele encontra algumas vantagens no cotidiano com agenda cheia. “A esposa já acostumou. Por passar menos horas em casa, a gente briga menos. Mas deu tempo de fazer filho e tudo”, brinca.
De geração a geração
A mãe de Bárbara também trabalha com publicidade. “Na infância, vi minha mãe virar a noite no trabalho, voltar para casa pela manhã, levar eu e meus irmãos à escola e, depois, retornar à agência”, recorda. A frase entre aspas, que surgiu no meio da entrevista à Página 22, tornou a mãe personagem imprescindível da reportagem. E a filha não pensou durante muito tempo, antes de passar o telefone da progenitora, como solicitado pelo repórter. “Claro, liga, pois ela deve estar em casa agora”.
Márcia estava. Afinal, depois de trabalhar 18 anos em agência de publicidade, fez da própria casa o seu escritório. Ela não apenas confirmou o que Barbara relatou, como falou de um dos chefes que teve, o qual não compreendia as questões maternas. “Ele não aceitava que eu chegasse mais tarde à agência, se fosse algo relacionado a meus filhos. Quando havia festinha na escola, era melhor dizer que o pneu do carro furou”, lembra.
Ela conta que, apesar da escassez de tempo livre, procurava estar sempre presente na vida da prole. No mesmo telefone da agência, que atendia para falar de gráficos, prazos e campanhas publicitárias, Márcia pedia carne no açougue, tirava dúvidas do dever de casa e ajudava às filhas a decidir se iam para o colégio de rabo-de-cavalo no penteado ou não. “Tive uma empregada muito boa, que ficou 28 anos conosco. Foi uma segunda mãe”.
Além de Barbara, Márcia teve Natália, que é cenógrafa, e Cadu, que optou pela Educação Física. Com o marido, que também é do ramo da publicidade, revezava-se para pegar as crianças na escola, entre outras tarefas. “O segredo é se organizar”, revela.
Dono do próprio tempo
Seja por escassez de vagas no mercado, salários baixos ou pura opção, há um tipo de profissional que deixou a empresa para seguir carreira solo. O freelancer, ou autônomo, não tem chefe. Ou melhor, em geral, seu número de chefes varia de acordo com a quantidade de trabalho.
Isso é muito comum nas carreiras de jornalismo, fotografia e publicidade. Um jornalista que escreva para duas revistas diferentes terá, pelo menos, dois. Um fotógrafo que fotografe para três sites, três. Cada chefe com suas preferências, gostos e, como não poderia deixar de ser, prazos.
O freelancer não tem os olhos do chefe o tempo todo a vigiá-lo, pois em boa parte dos casos trabalha em casa, ou home-office, na linguagem pop dos independentes. Em contrapartida, as regras de sucesso para quem é autônomo não mudam. Respeito aos prazos solicitados pelos “chefes” e uma qualidade mínima do que é apresentado continuam sendo fundamentais.
O horário é feito pelo próprio profissional. Pode dormir de dia e labutar à noite, contanto que os trabalhos sejam entregues dentro do tempo prometido. “Como não há cobrança de um chefe que esteja presente na mesma sala que você, é necessária uma autodisciplina muito grande, senão você olha para o sofá ou a cama e dá vontade de dormir”, explica Márcia.
A própria questão de ser o freelancer dono do próprio tempo é controversa. Poder escolher a hora em que se quer trabalhar também é estar sujeito a ficar disponível vinte e quatro horas por dia. Corre-se o risco de não desligar nunca. Um estado frequente de alerta. Por isso, é importante saber a hora de parar o serviço e definir horários.
Um aspecto relacionado ao trabalho como autônomo é que, sendo uma pessoa só, o profissional precisa atuar como a área financeira, jurídica e comercial da empresa, entre outras. Um fotógrafo tira fotos, realiza pagamentos no banco, entrega documentos e corre atrás da captação de nova freguesia.
Profissionais que estão há mais tempo no mercado costumam ter mais facilidade de encontrar clientes, pela quantidade de contatos que já fizeram ao longo da carreira. Quem se formou há um ano, como o jornalista Victor Grinbaum, de 30 anos, encontra maior dificuldade. Ele recorre à rede de amizades, colegas de profissão e está pronto para aceitar um trabalho que lhe chegue não apenas entre as 9h e as 18h. “É preciso estar ligado o tempo todo”, diz.
Doze minutos depois de falar à Página 22, ele ligou para o repórter, celebrando: “Veja que coincidência, acabaram de me pedir um novo trabalho”. A noiva de Victor, Carol Herling, também é jornalista. Contratada como assessora de imprensa em uma empresa multinacional, freelancer nas horas vagas.
Em sua opinião, como a demanda pelo serviço do autônomo é irregular, esse tipo de trabalho serve para engordar o orçamento. Assim, ela acredita que o ideal é conquistar um emprego fixo também. E não depender do incerto para pagar a prestação do carro, do aluguel ou os gastos mensais com alimentação. “Tenho um amigo freelancer que por causa da crise ficou sem uma quantidade boa de clientes. Para sobreviver, foi obrigado a usar o dinheiro que antes seria destinado a comprar um apartamento”, conta.
Gerenciando melhor as tarefas
O professor do curso de Gestão e Administração do Tempo da Escola Superior de Propaganda e Marketing de São Paulo (ESPM-SP), José Eduardo Balian, explica aquela tradicional visão desorganizada, da escrivaninha de casa ou mesa do escritório, transformada em mar de papéis. “São tarefas pendentes. Se tivessem sido concluídas, o material relacionado a elas não estaria mais na mesa, mas arquivado no armário ou descartado no lixo. Quem termina algo, passa aquilo para frente. As coisas não ficam paradas”.
As reuniões da empresa costumam ser um foco de reclamação por parte dos funcionários, que as veem, muitas vezes, com duração além do tempo necessário. Segundo José Eduardo, é importante elaborar previamente uma pauta e estabelecer o tempo de discussão. Para completar, deve-se escolher um dos participantes como coordenador da reunião, evitando que as pessoas fujam do assunto tratado ou dispersem.
Saber delegar funções é aspecto fundamental. Isso não se faz de uma hora para outra. Um gerente que se ausenta da empresa por duas semanas não pode querer que um membro de sua equipe o substitua satisfatoriamente, se não o tiver preparado para isso. “Levam-se meses para delegar um trabalho. É como a criança que aprende a andar de bicicleta. Você mostra como faz, tira as rodinhas aos poucos, acompanha na mão, até que ela se solta”, ensina o professor.
Outra dica para quem deseja organizar melhor as tarefas e dar conta de todo o trabalho é, primeiro, ver os papéis que exerce: pai, mãe, esposa, marido, filho. Em seguida, elaborar uma agenda semanal, definindo as metas que pretende alcançar no período, equilibrando como melhor preferir as tarefas relacionadas a cada papel. Ter metas de curto, médio e longo prazo também é importante. “Vale ter um momento pessoal em que você senta para pensar sobre tudo isso, nem que sejam cinco minutos diários, sexta-feira à noite ou domingo. O tempo é consequência das nossas prioridades”, acredita José Eduardo.