O deputado Aldo Rebelo (PC do B – SP) apresentou ontem o seu relatório sobre projeto de lei que modifica a legislação ambiental brasileira e o resultado é uma sensação de déjà vu. Mais uma vez, a proposta é modificar as regras para anistiar desmatamentos ilegais em todo o Brasil e flexibilizar normas para permitir ainda mais derrubadas daqui pra frente.
Trata-se de um padrão. Foi assim também quando o Congresso Nacional aprovou a peça que ficou conhecida como “MP da Grilagem”. Em lugar de retomar terras públicas invadidas, ou a menos vendê-las por meio de licitação a preço de mercado, decidiu-se ampliar o tamanho das áreas que podem ser doadas ou vendidas a preço simbólico, a título de regularização fundiária. O resultado foi o perdão do crime de grilagem.
O pesquisador do Imazon, Paulo Barreto, já deu exemplos aqui de como essa política da impunidade estimula ainda mais os novos desmatamentos.
Dessa vez, o alvo foram as duas principais pedras no sapato do ruralismo arcaico: as áreas de preservação permanente e a reserva legal. São duas regras que não permitem que proprietários rurais desmatem tudo que vêm pela frente, mesmo sendo donos da terra (saiba o que significa e qual a função de cada uma no quadro abaixo).
Reserva Legal: é o percentual de mata nativa que todo proprietário rural deve manter em suas terras. As quantidades variam de 80% na Amazônia a 20% na Mata Atlântica. Sua função é garantir conectividade aos remanescentes florestais, algo fundamental para manutenção da biodiversidade. Sem essa ajudinha das propriedades privadas, a mata nativa ficaria isolada em unidades de conservação e, como resultado, muitas espécies feneceriam. Os sistemas ecológicos só funcioam bem e saudáveis se houver ligação na escala maior da paisagem.
Àreas de Preservação Permanente (APP): são aquelas que por suas características ecológias se mostram especialmente sensíveis e importantes porque prestam serviços ambientais. As áreas de várzea, por exemplo, são necessárias apra preservar os recursos hídricos e evitar enchentes. Topos de morro e encostas, por sua vez, protegem o solo da erosão que tantos desastres tem causado no Brasil em época de chuvas.
Entre os pontos mais tenebrosos está o perdão para todo mundo que desmatou áreas de preservação permanente até julho de 2008. A partir da aprovação da nova lei, por mais 5 anos de “regularização ambiental”, nenhum desmatamento fora da ordem poderia ser multado. O deputado propõe reduzir a área protegida de várzeas para até 15 metros (hoje a fatia varia de 30 a 500 metros) e ainda que propriedades de até quatro módulos fiscais (podem chegar a 400 hectares, em algumas regiões) fiquem isentas de manter reserva legal.
Outras colocações de cunho argumentativo no relatório de Rebelo beiram o delírio, segundo o editor Claudio Ângelo, que assina análise na Folha de S. Paulo de hoje. Como diz Miriam Leitão, em seu blog, é curioso que os ruralistas precisem ainda de cinco anos para se adaptar a uma lei que tem já 50 anos.
Uma reclamação constante do agronegócio é que as leis ambientais não teriam base na ciência. Pois o ecólogo Jean Paul Metzger fez uma ampla revisão da literatura científica no Brasil e explica, no vídeo ao lado, por que as regras são como são.