A derrota da Austrália por 4 a 0 da Alemanha no primeiro dia da Copa tirou, apenas momentaneamente, a atenção da mídia australiana do chamado imposto sobre os super-lucros das mineradoras. Anunciada no início de maio, a proposta detonou uma verdadeira batalha entre governo e mineradoras, com direito a campanhas de ambos os lados nos jornais, TVs e outdoors. Para um lado, o imposto vai matar a indústria mineradora e enfraquecer a economia australiana. Para outro, é a melhor forma de taxar a extração de recursos não-renováveis, beneficia as gerações presentes e futuras e vai reforçar o crescimento da economia como um todo.
A maioria dos analistas compra o discurso das empresas de que o imposto transforma a Austrália de paraíso minerador em desastre de competitividade, com fuga de investimentos. Mas há quem aponte que, ao contrário, o novo imposto deve liderar a revisão da estrutura tributária em outros países mineradores. No Brasil, o tema dos royalties da mineração está quente e, segundo relatos, todos os candidatos à presidência concordam que os percentuais devem subir. Ao que parece, a China vê na movimentação australiana uma oportunidade para aumentar a tributação sobre o setor.
Hoje, as mineradoras que operam na Austrália pagam royalties aos estados com base no valor bruto de venda do minério, independente da lucratividade do projeto. As alíquotas variam de acordo com o mineral e chegam a 7,5% (no Brasil, os royalties da mineração variam de 0,2% a 3%). Com o chamado Resource Super Profit Tax (RSPT), a mineradora receberia os royalties pagos de volta e não precisaria pagar a alíquota do novo imposto até que o projeto cubra os custos e se torne lucrativo. Uma vez que os lucros comecem a fluir, o RSPT teria alíquota de 40% sobre os lucros que superarem a taxa de retorno do título básico do tesouro australiano (hoje em torno de 6%).
“Os efeitos sobre empresas individuais vai depender do mix de projetos de alta e baixa lucratividade”, disse o governo em informativo. “As empresas vão pagar mais imposto quando os preços das commodities (e por conseqüência os lucros) estiverem altos, e menos imposto quando os preços das commodities e os lucros estiverem baixos”.
As grandes mineradoras internacionais – BHP Billiton, Rio Tinto, Xtrata, entre outras – se apressaram em garantir que o imposto vai causar catástrofe econômica para o povo australiano. Embora alguns projetos tenham sido cancelados desde o anúncio da proposta, as três mineradoras citadas acima juntaram-se a um consórcio que, no final de maio, ofereceu US$ 4 bilhões pela maior ferrovia para transporte de carvão do país. E o CEO da Rio Tinto, em reunião com os acionistas da empresa, deixou claro que não falta demanda por minerais. Segundo relatou a imprensa, a Rio Tinto projeta que a demanda por minério de ferro, alumínio e cobre duplique nos próximos 15 anos.
A Austrália possui recursos minerais acessíveis de mais de 15% das reservas conhecidas globalmente para 13 minerais, incluindo minério de ferro, bauxita, níquel e urânio. A indústria mineradora australiana teve margem de lucro de 37% no ano fiscal de 2008-9, contra 11,2% da média de todas as indústrias do país – o que ilustra a economia de “duas-velocidades” que o governo diz querer combater com o novo imposto. Por fim, segundo analistas, o setor de mineração australiano é mais lucrativo do que seus competidores internacionais.
Para o governo, o novo imposto é uma bela plataforma eleitoral, que mostra a atual administração em oposição às grandes corporações. Para aprovar a nova taxa no Parlamento, entretanto, o primeiro-ministro Kevin Rudd deverá ceder e aceitar algumas mudanças na proposta. O governo diz agir em nome das presentes e futuras gerações de australianos, proprietários dos recursos, e preparar-se para um futuro em que tais recursos não serão tão abundantes. Pena que não mostre tanta vontade política em relação a outros valiosos ativos, como a atmosfera. Depois de engavetar a proposta de um esquema de cap-and-trade para as emissões de carbono, Rudd enfrenta as urnas nos próximos meses sem nenhuma proposta na área do clima.