Gerar empregos em um ambiente sustentável. Eis o grande tema a ser aprofundado na Conferência de 2012
De maneira inusitada, o Fundo Monetário Internacional associou-se, pela primeira vez em 66 anos, à Organização Internacional do Trabalho (OIT) e ao primeiro-ministro da Noruega, na recente Conferência de Oslo sobre os Desafios de Crescimento, Emprego e Coesão Social.
A luta contra o desemprego voltou a ser uma prioridade imediata ante os resultados catastróficos da última crise. O número de desempregados aumentou em 30 milhões desde 2007. Os números citados por Juan Somavia, diretor-geral da OIT, dispensam qualquer comentário: 210 milhões de pessoas estão à busca de emprego pelo mundo afora. Nos próximos dez anos, deverão ser criados 440 milhões de vagas.
As principais vítimas são os jovens, cujo desemprego, só nos 23 paísesmembros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), aumentou em 18,8% entre 2007 e 2009, ou seja, teve um acréscimo de 4 milhões de pessoas. Os países mais atingidos são a Irlanda e a Espanha.
Para fazer frente a essa urgência, é necessário um “crescimento-gerador-de- empregos”. Do ponto de vista social, o “crescimento-sem-emprego” não resolve. Corremos o risco de perder toda uma geração com consequências sociais e quiçá políticas extremamente graves, sem excluir o perigo de guerras.
Trata-se de uma urgência, por assim dizer, urgentíssima, que vem acompanhada de uma outra: a ameaça de mudanças climáticas deletérias e provavelmente irreversíveis a curto prazo, ao continuarmos a despejar na atmosfera quantidades excessivas de gases de efeito estufa (a começar pelo gás carbônico), como ocorre hoje. Os cientistas do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática são categóricos: alterações drásticas e imediatas de comportamento são indispensáveis para lograr resultados palpáveis nas próximas décadas.
Estamos condenados a enfrentar esses dois problemas simultaneamente. Não adianta priorizar um com relação ao outro, sob pena de sofrer o mesmo destino que o peru, herói de um conhecido poema para crianças: o peru fazia planos para o domingo, mas a cozinheira lhe cortou o pescoço no sábado.
Daí a importância da Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, que voltará a se reunir no Brasil, em 2012 – 20 anos após a memorável Cúpula da Terra, realizada no Rio de Janeiro, e 40 anos após a pioneira Conferência de Estocolmo.
Para propor soluções simultâneas no campo ambiental e social, a Conferência deverá aprofundar o conceito de “crescimento gerador de empregos ambientalmente sustentável”, ou seja, caracterizado por uma baixa emissão de carbono. As estratégias a definir, a ser consignadas em planos de longo prazo, deverão buscar a redução da pegada ecológica, o aprimoramento da biocapacidade, a geração de empregos e autoempregos, a redução das abissais desigualdades sociais na repartição da renda, integrando ainda o planejamento socioeconômico-ambiental com o planejamento territorial.
Devemos aprender com as frustrações sofridas na recente Conferência de Copenhague. Há razões para pensar que a compatibilização de planos nacionais com vistas à geração de sinergias positivas entre eles seria a forma mais expedita de conduzir a bom termo uma negociação reunindo quase 200 nações e de partir para a elaboração de planos de cooperação internacional entre países de ecossistemas semelhantes.
Se essa abordagem for aceita, a Conferência de 2012 deveria dar aos países membros das Nações Unidas dois anos para preparar os planos nacionais, indicando um número limitado de conceitos e parâmetros a ser incluídos nos documentos nacionais.
Um dos temas fundamentais a que deveremos fazer frente é a questão de como alimentar os 9 bilhões de navegantes da nave espacial Terra previstos para os meados do século. Tal objetivo não poderá ser atingido sem um forte aumento da produção de alimentos de origem vegetal e animal, o que nos remete às revoluções verde e azul, lembrando que não se trata apenas de incrementar o volume de alimentos produzidos e, sim, de fazê-lo de maneira a gerar um número respeitável de empregos e autoempregos convenientemente remunerados.
Se não, corremos o risco de ver montanhas de alimentos que não encontram compradores protegidas por uma cerca de arame farpado para conter as multidões de famintos que não têm os recursos necessários para adquiri-los.
Por isso, causa surpresa o artigo da revista The Economist, de 28 de agosto, sobre o milagre agrícola do Cerrado brasileiro, ilustrado por uma foto na qual dezenas de grandes tratores avançam em uma megaoperação de agricultura praticamente desprovida de homens. Se ficarmos só com esse modelo, este terá sido um falso milagre brasileiro à espera de um Padre Cícero para lhe conferir a necessária dimensão humana.
Leia no blog De Lá Pra Cá a crítica de Flavia Pardini ao artigo da The Economist
*Ecossocioeconomista da École des Hautes Études en Sciences Sociales