Ao redó da minha casa tinha uns vagalume que foro sumindo, sumindo, sumindo. Isso foi indicação de que os carro tavo chegando, chegando, chegando. E os carro viraro os vagalume movido a gasolina
Só esse sutaque e esse jeito de falá faz parecê que eu num sô de onde você é. Esse jeito de querê sê, que não dá pra sê aqui, só procurando ôtro lugá. Mas onde? Esse negócio de terra virá concreto, árve virá prédio, águia cristalina virá lama, geleira virá mar, amô virá dinheiro, progresso surgir a qualqué custo, chuvê mais que a rua aguenta, desperdício de ricurso. A gente nova que chega, que a gente velha bota no mundo, acha que as coisa é natural. E cada sinal que a gente tem na cidade nos distancia da natureza.
Daqui a poco o chão do planeta vai tá tomado por completo de cimento, e eu vo tê que desenhá minhas pegada com photoshop, pra indicá que eu passei por ali. Imagina que um homem famoso na mídia conhecia o pi-pi-pi-pi que o microonda faz quando a comida tá pronta. Também a diferença entre o som do telefone celulá do chefe, ou do aparelho da esposa. Contudo, desconhecia o barulho da coruja e do largato. Não conseguia bem distingui entre o que pia o bem-te-vi e o joão-de-barro. O vento que traz chuva e o que espanta.
Ele sabia que as cor da Coca-Cola são vermelho e branco; as da Pepsi, vermelho, branco e azul. O logotipo da Apple uma maçã, o da Microsoft uma janela. Sabia tudo isso, mas não identificô na face dum amigo a marca da expressão de quem precisava de ajuda.
Não compreendeu, na sutileza desenhada nos gestos dos filhos, que as criança queriam mais tempo pra brincar com o pai.
O supermercado é ôtro grande desensinadô. Os alimento já tão colhido, ninguém precisa cuidá do solo, da planta, pescá, tirá a maçã do pé. Tem gente que não sabe colhê laranja, nem a importância de mantê o equilíbrio da natureza pra continuá a servi salada na mesa. Deixa de colocá abóbra no prato porque não sabe descascá. Usa tesoura pra abri mexerica. Quebra a cabeça com coco. Daqui a poco vão comê casca de banana achando que o que tem dentro é caroço. Abri latinha de cerveja é fácil. Quero vê tirá a casca da jaca.
Sem contar as comida que não são as comida que diz ser. A batata de churrasco, o pó que é tempero de frango, o molho que tem gosto de tumate – proporcionado pelas substância química. Deve ter gente achando que leite vem da caixa de papel. E o que falá da cabra e da vaca?
Engraçado esse povo que chega ao shopping e sabe, pelo sinal que for, reconhecê o caminho que leva até a loja da Calvin Klein, da Carolina Herrera, da Ralph Lauren. No entanto, fica sem saber em que direção está a Mata Atlântica ou a Caatinga. Não sabe onde é melhor plantá feijão ou melancia. Em que lugar o ticotico gosta de fazer seu ninho, o morcego prefere voá. Fica em dúvida pra dizê qual folha é da amendoeira, jatobá ou pau-brasil. Se as pétalas são de begônias, calêndulas ou gérberas. Tem que comprá livro ou ir ao museu pra conhecê, porque perdeu o contato no dia a dia.
Antônio Conselheiro disse em Canudos que o sertão vai virá mar e o mar vai virá sertão. Às vezes penso se o terreno baldio na frente de casa vai virá estacionamento ou vai virá um espigão de concreto, que vai dar com a cobertura lá no céu. Apareceram uns operário na semana passada, o que é sinal de que alguma coisa vai crescê ali.
Ao redó da minha casa tinha uns vagalume que foro sumindo, sumindo, sumindo. Isso foi indicação de que os carro tavo chegando, chegando, chegando, na rua de terra depois pavimentada. E os carro viraro os vagalume movido a gasolina. No começo eu achei que era a lua cheia, mas os dias passou, a lua minguou e os automóves continuaro. Então vi que para andarem não era situação de lua cheia, mas de tanque.
Só esse sutaque e esse jeito de falá faz parecê que eu num sô de onde você é. Faz só parecê, porque na verdade eu sô, sim. Quem entendeu que sô diferente, entendeu errado. Num é imitação de sutaque do homi do campo, não. Sô tanto urbano. É que essa distância da origem e da natureza às vezes faz a gente querê descontruir até mesmo a ordem gramatical, como se na tentativa de retorná a um estágio primário, sem os vício indicados pelo progresso.
A cidade cansa, é bruta. As mais desenvolvida dificultam o relacionamento humano. Estabelecem uma rotina que desgasta a espécie. E se você de vez em quando não se der a chance de subvertê nem mesmo a linguagem com a qual define o mundo, isso é capaz de ser um indício de que o mundo pode subvertê você.
*Jornalista[:en]Ao redó da minha casa tinha uns vagalume que foro sumindo, sumindo, sumindo. Isso foi indicação de que os carro tavo chegando, chegando, chegando. E os carro viraro os vagalume movido a gasolina
Só esse sutaque e esse jeito de falá faz parecê que eu num sô de onde você é. Esse jeito de querê sê, que não dá pra sê aqui, só procurando ôtro lugá. Mas onde? Esse negócio de terra virá concreto, árve virá prédio, águia cristalina virá lama, geleira virá mar, amô virá dinheiro, progresso surgir a qualqué custo, chuvê mais que a rua aguenta, desperdício de ricurso. A gente nova que chega, que a gente velha bota no mundo, acha que as coisa é natural. E cada sinal que a gente tem na cidade nos distancia da natureza.
Daqui a poco o chão do planeta vai tá tomado por completo de cimento, e eu vo tê que desenhá minhas pegada com photoshop, pra indicá que eu passei por ali. Imagina que um homem famoso na mídia conhecia o pi-pi-pi-pi que o microonda faz quando a comida tá pronta. Também a diferença entre o som do telefone celulá do chefe, ou do aparelho da esposa. Contudo, desconhecia o barulho da coruja e do largato. Não conseguia bem distingui entre o que pia o bem-te-vi e o joão-de-barro. O vento que traz chuva e o que espanta.
Ele sabia que as cor da Coca-Cola são vermelho e branco; as da Pepsi, vermelho, branco e azul. O logotipo da Apple uma maçã, o da Microsoft uma janela. Sabia tudo isso, mas não identificô na face dum amigo a marca da expressão de quem precisava de ajuda.
Não compreendeu, na sutileza desenhada nos gestos dos filhos, que as criança queriam mais tempo pra brincar com o pai.
O supermercado é ôtro grande desensinadô. Os alimento já tão colhido, ninguém precisa cuidá do solo, da planta, pescá, tirá a maçã do pé. Tem gente que não sabe colhê laranja, nem a importância de mantê o equilíbrio da natureza pra continuá a servi salada na mesa. Deixa de colocá abóbra no prato porque não sabe descascá. Usa tesoura pra abri mexerica. Quebra a cabeça com coco. Daqui a poco vão comê casca de banana achando que o que tem dentro é caroço. Abri latinha de cerveja é fácil. Quero vê tirá a casca da jaca.
Sem contar as comida que não são as comida que diz ser. A batata de churrasco, o pó que é tempero de frango, o molho que tem gosto de tumate – proporcionado pelas substância química. Deve ter gente achando que leite vem da caixa de papel. E o que falá da cabra e da vaca?
Engraçado esse povo que chega ao shopping e sabe, pelo sinal que for, reconhecê o caminho que leva até a loja da Calvin Klein, da Carolina Herrera, da Ralph Lauren. No entanto, fica sem saber em que direção está a Mata Atlântica ou a Caatinga. Não sabe onde é melhor plantá feijão ou melancia. Em que lugar o ticotico gosta de fazer seu ninho, o morcego prefere voá. Fica em dúvida pra dizê qual folha é da amendoeira, jatobá ou pau-brasil. Se as pétalas são de begônias, calêndulas ou gérberas. Tem que comprá livro ou ir ao museu pra conhecê, porque perdeu o contato no dia a dia.
Antônio Conselheiro disse em Canudos que o sertão vai virá mar e o mar vai virá sertão. Às vezes penso se o terreno baldio na frente de casa vai virá estacionamento ou vai virá um espigão de concreto, que vai dar com a cobertura lá no céu. Apareceram uns operário na semana passada, o que é sinal de que alguma coisa vai crescê ali.
Ao redó da minha casa tinha uns vagalume que foro sumindo, sumindo, sumindo. Isso foi indicação de que os carro tavo chegando, chegando, chegando, na rua de terra depois pavimentada. E os carro viraro os vagalume movido a gasolina. No começo eu achei que era a lua cheia, mas os dias passou, a lua minguou e os automóves continuaro. Então vi que para andarem não era situação de lua cheia, mas de tanque.
Só esse sutaque e esse jeito de falá faz parecê que eu num sô de onde você é. Faz só parecê, porque na verdade eu sô, sim. Quem entendeu que sô diferente, entendeu errado. Num é imitação de sutaque do homi do campo, não. Sô tanto urbano. É que essa distância da origem e da natureza às vezes faz a gente querê descontruir até mesmo a ordem gramatical, como se na tentativa de retorná a um estágio primário, sem os vício indicados pelo progresso.
A cidade cansa, é bruta. As mais desenvolvida dificultam o relacionamento humano. Estabelecem uma rotina que desgasta a espécie. E se você de vez em quando não se der a chance de subvertê nem mesmo a linguagem com a qual define o mundo, isso é capaz de ser um indício de que o mundo pode subvertê você.
*Jornalista