Depois da crise do cacau, nos anos 90, o sul da Bahia nunca mais foi o mesmo. Lavouras inteiras foram devastadas pela estiagem prolongada e a propagação de doenças, deixando mais de 200.000 trabalhadores desempregados. A partir de então, vários projetos foram elaborados, inclusive com parcerias internacionais, buscando retomar o desenvolvimento local.
O que não tem agradado boa parte da população, no entanto, é a estratégia que o estado, com o apoio do governo federal, elaborou para reerguer a região. Entre os itens mais polêmicos do projeto estão a construção de um porto na cidade de Ilhéus e uma ferrovia para escoar o minério explorado em Caetité, a 760 km de Salvador.
Integrantes da Rede Sul da Bahia, que reúne mais de 20 organizações contrárias ao projeto (vídeo ao lado), estiveram reunidos, na última terça-feira, para discutir alternativas às propostas apresentadas pelo governo. A Ferrovia Oeste-Leste terá uma extensão de cerca de 1.500 km e exigirá dos cofres públicos investimentos da ordem de 6 bilhões de reais, cobertos pelo PAC.
A obra já está sendo licitada e a construção deve começar até setembro deste ano. Segundo a rede, o transporte de minério ocupará de 75% a 85% da carga movimentada pela ferrovia. A Bahia Mineração (Bamin), empresa do Cazaquistão que detém a concessão sobre Caetité, não entrará, porém, com nenhuma porcentagem no custo total previsto.
Outra parte do projeto compreende a construção do complexo Porto Sul, em Ilhéus. As obras, que ainda aguardam a licença do Ibama, envolvem a construção de terminais a cerca de 2 km da praia, com um quebra-mar de 1,5 km, a 3 km da costa. A Rede Sul da Bahia afirma que a obra terá forte impacto sobre a biodiversidade marinha local, rica em recifes de corais únicos no Atlântico Sul. Estima-se ainda que o transporte do minério será feito por embarcações de mais de 150.000 toneladas, com o carregamento de um navio a cada 28 horas.
Segundo a rede, a zona portuária ainda poderá compreender a construção de um grande pátio para o estacionamento de vagões e locomotivas, além de uma estrutura para estocagem do minério de ferro trazido pela ferrovia. Outra região, que hoje é ocupada por Mata Atlântica, ainda seria reservada à instalação de um aeroporto e uma siderúrgica, além de outras indústrias atraídas pela atividade local.
Em 2008, todo o polígono de implantação do Porto Sul, com exceção do aeroporto, foi desapropriado e decretado como “utilidade pública”. A partir de então, a possibilidade de realização do projeto ficou ainda mais evidente. “Trata-se de um plano de desenvolvimento que está sendo colocado como a redenção do sul da Bahia. Não seria exagero falar em uma verdadeira Cubatão baiana”, criticou o ambientalista e advogado Fábio Feldman, que integra a Rede Sul.
A principal alternativa apontada pelo movimento é a adesão ao projeto original da Ferrovia Oeste-Leste, que interligava ao mar o oeste baiano, o centro-oeste brasileiro e o norte de Minas Gerais a partir da Ferrovia Centro-Atlântica, utilizada pela mineradora Vale para chegar até o porto de Aratu, na região metropolitana de Salvador.
“Nessa alternativa, o trecho de ferrovia a ser construído seria menor que a metade do projeto atual, além de poupar Ilhéus de todos os impactos do projeto, com danos irreparáveis sobre a natureza e o turismo local”, destacou Cláudio Barbieri da Cunha, professor da Escola Politécnica da USP e um dos coordenadores do estudo sobre a viabilidade do Porto Sul.