Apesar de iniciativas para reduzir emissões, a indústria cimenteira ainda é uma das que mais contribuem com a mudança do clima. No Brasil do PAC e da Copa, o desafio é monumental
Se a economia cresce, a indústria cimenteira prospera. No Brasil, o ciclo de altas no PIB elevou o consumo de cimento a recordes históricos – cerca de 51 milhões de toneladas/ano. As projeções mostram que a tendência de crescimento é consistente e os investimentos na expansão da produção no setor já estão em curso.
Em termos ambientais, o desafio não poderia ser maior. A fabricação de cimento é um dos principais fatores responsáveis pelas emissões de gás carbônico em todo o mundo.
O próprio Sindicato Nacional da Indústria do Cimento (Snic) [1] reconhece o fato. Em relatório dedicado às mudanças climáticas, a entidade afirma que “o Brasil tem hoje um importante programa de infraestrutura para ser implementado com obras para projetos como o PAC e o Minha Casa, Minha Vida, e para grandes eventos, como a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. (…) O grande desafio é produzir cimento suficiente para todos esses projetos, com baixo nível de emissões de CO2 por tonelada produzida”.
[1] Baixe o documento do Snic, A Indústria do Cimento no Cenário das Mudanças Climáticas, em bit.ly/ePyDMw
Globalmente, o setor cimenteiro responde por 5% das emissões. Sua participação de no segmento industrial é, também, bastante expressiva, 18% (ver gráfico). No Brasil, de acordo com os dados do segundo inventário de gases de efeito estufa, o ramo representa 2% de todo o carbono emitido pelo país. Entre 1990 e 2005, o aumento das emissões do setor foi de 30%.
Não obstante, o desempenho da indústria brasileira de cimento com relação às emissões pode ser considerado positivo. Enquanto as emissões cresceram 30%, a produção no mesmo período aumentou 50%, indicando redução na intensidade de carbono por tonelada produzida.
A razão para isso, explica o presidente do Snic, José Otavio de Carvalho, é que no País já é largamente adotada a prática de misturar outros elementos na fase de processamento. Conhecidas como adições, as misturas funcionam, até certa proporção, como substitutos ao clínquer, a principal matéria-prima na fabricação do cimento. “O Brasil é pioneiro e está sendo visto como referência”, diz Carvalho.
O outro lado dessa história é que os bons resultados na produtividade reduzem cada vez mais as margens de ação. Estudo feito pela Agência Internacional de Energia, em 2009, colocou as cimenteiras brasileiras entre aquelas com menor potencial para cortar emissões com a tecnologia já existente. Em nível global, a China e a Índia, que produzem juntas quase a metade de todo o cimento no mundo, são os países com maior margem para melhorar a eficiência de suas indústrias.
As emissões das cimenteiras estão divididas entre o uso intensivo de energia e o processamento do calcário, cuja transformação em altos-fornos resulta em grandes quantidades de gás carbônico. Para abater emissões no processamento, a indústria tem usado, principalmente, escórias da indústria siderúrgica e cinzas de usinas termoelétricas, para substituir parte do calcário. Já na energia, o caminho é utilizar combustíveis alternativos aos de origem fóssil. Nesse caso, queima de pneus e outros resíduos são os mais comuns, mas biomassa também começa a ser utilizada.
O aumento da produtividade também ocorreu mundialmente. Entre 1990 e 2006, a produção cresceu 53%, enquanto as emissões de CO2 subiram 35%. Um dos objetivos da Iniciativa para a Sustentabilidade do Cimento, programa do Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento Sustentável (WBCSD, na sigla em inglês), é envolver empresas da China e da Índia para que novos avanços sejam alcançados.
“Os mercados em desenvolvimento são neste momento os mais importantes para a indústria”, pontua Howard Klee, o diretor da iniciativa do WBCSD. Segundo ele, empresas chinesas e indianas já estão comprometidas a modernizarem suas fábricas.
No caso do Brasil, argumenta Carvalho, a margem para reduzir ainda mais as emissões está no coprocessamento de resíduos da indústria durante a combustão. Segundo informações do Snic, gera-se por ano no país cerca de 2,7 milhões de toneladas de resíduos de diversos segmentos da indústria (siderúrgica, petroquímica, automobilística, de alumínio, tintas, embalagens, papel e pneumáticos), das quais em torno de 950 mil toneladas são coprocessadas.
Mas é ele, o próprio presidente do sindicato do setor, quem faz um alerta. No momento, o parque industrial das cimenteiras brasileiras é considerado moderno, mas a demanda aquecida faz surgir projetos menos rigorosos com a eficiência no uso de energia e no controle da poluição. “Cabe às autoridades não aceitar que projetos como esses sejam feitos”, diz.
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