Em matéria de acesso à informação pública, o Brasil está na lanterna até mesmo na América Latina. Enquanto isso, pipocam na web iniciativas em prol da transparência
Quando a primeira lei de acesso a informações públicas foi promulgada na Suécia em 1766, o Brasil era um vice-reinado de Portugal, com 1,5 milhão de habitantes, governado por Vasco de Mascarenhas, o Conde de Óbidos. Passados 245 anos, o Brasil democrático da presidente Dilma Rousseff vive a era da revolução digital de Wikileaks, Facebook e Twitter ainda sem uma lei que garanta aos 200 milhões de brasileiros esse direito fundamental.
Trata-se de direito previsto pelo Artigo 19 da Declaração Universal de Direitos Humanos e também pelo Artigo 5º da Constituição Brasileira, mas não regulamentado. Mas, enquanto a Lei de Acesso à Informação [Projeto de Lei Complementar 41/2010] tramita pela Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática do Senado, sem qualquer previsão de votação, setores mais plugados da sociedade criam alternativas que, aos poucos, abrem caminhos para que mais brasileiros compreendam o que está acontecendo nas variadas esferas de governo.
Embalados pela revolução digital, a mesma que está contribuindo para a mobilização pela democracia no Oriente Médio e Norte da África, movimentos como Cidade Democrática, Vote na Web, Urbanias, Rede Nossa São Paulo, entre outros, entram em cena criando mecanismos que permitem traduzir e acompanhar os atos do poder público. Multidisciplinares e, em geral, pilotados por jovens cheios de energia e disposição, articulam-se na velocidade da internet sem esperar a tramitação de uma lei que segue em ritmo analógico.
O votenaweb.com.br, por exemplo, traduz para uma linguagem de fácil compreensão e coloca em votação virtual os projetos de lei mais importantes em pauta no Congresso Nacional. De seus mais de 15 mil usuários cadastrados, 55% têm entre 16 e 30 anos. Para Fernando Barreto, da WebCitizen, empresa criadora do site, mais importante do que a aprovação da Lei de Acesso à Informação é a mobilização das pessoas. “Nosso desafio é fazer com que o cidadão se interesse também por questões menos midiáticas, mas importantes para o País.”
Sensação de fazer parte
Rodrigo Bandeira, fundador do cidadedemocratica.org.br, segue na mesma linha de pensamento. O fundamental, segundo diz, é mostrar aos jovens como se articular e usar a inteligência coletiva para construir uma sociedade de colaboração. Em Jundiaí, por exemplo, o grupo descobriu um obscuro instrumento de participação popular na Câmara Municipal – a Comissão de Participação Legislativa –, e conseguiu da prefeitura a aprovação de um plano cicloviário desenvolvido por ciclistas. “Isso gera um sentimento de ser dono da cidade”, resume Henrique Parra Parra Filho, um dos coordenadores locais.
O urbanias.com.br escolheu outro caminho e se propõe a trazer para os cidadãos as informações que ele não consegue diretamente do poder público. Funciona como um Serviço de Atendimento ao Consumidor, em que o morador da cidade de São Paulo entra com seu pedido ou reclamação e pode acompanhar todo o processo até a resolução, coisa impossível de ser feita por meio do site da prefeitura. São mais de 1.000 usuários cadastrados e 900 demandas, 60% delas resolvidas, segundo Rafael Balago, jornalista moderador do site. “Serviços via internet como o Urbanias e o SacSP estão fazendo com que o poder público se mexa. Algumas subprefeituras têm até conta no Twitter e interagem diretamente com as pessoas. Isso é positivo”, acredita.
Um dos exemplos mais bem-sucedidos de iniciativas pela transparência da administração pública, a Rede Nossa São Paulo mobiliza 640 entidades em torno de ideias e ações para a capital paulista. O coordenador do Grupo de Trabalho de Orçamento da Rede, economista e ex-vereador Odilon Guedes, afirma que a aprovação da lei de acesso à informação pública é fundamental para que os brasileiros compreendam o que está acontecendo com o dinheiro pago em impostos. Criador da Lei da Transparência, que exige a prestação de contas por parte dos ocupantes de cargos públicos da cidade de São Paulo, Odilon considera a questão explosiva. “Hoje, 34% do PIB referem-se a impostos. E as pessoas não sabem como esse dinheiro vem sendo gasto.”
Jornalismo investigativo
O presidente da Associação Brasileira de Jornalistas Investigativos (Abraji), Fernando Rodrigues, lamenta que a lei de acesso a informações esteja há quase dez anos tramitando no Congresso, enquanto empresas que querem se instalar no Brasil precisam contratar serviços de lobby em Brasília para obter informações às quais teriam direito.
Nos Estados Unidos, 40% das consultas feitas ao Freedom of Information Act [1] são originárias de empresas. Para Rodrigues, o Brasil precisa acabar com o conceito de opacidade que domina a administração pública se quiser ser verdadeiramente desenvolvido. “Tudo que é produzido no governo é público.”
[1] Lei de 1966 que regulamenta o acesso a informações públicas nos EUA.
A Abraji trabalha junto com outras organizações, entre elas a Artigo 19, a Transparência Brasil e a Transparência Hacker, pressionando pela aprovação da lei no Senado. Mas o líder do PT, Humberto Costa (PE), admite que até agora não há qualquer articulação para dar mais velocidade ao projeto.
Na visão de Arthur Serra Massuda, da Artigo 19, o projeto não avança por pressão dos ministérios da Defesa e das Relações Exteriores. A questão mais espinhosa é o fim do sigilo de documentos secretos. O projeto de lei em tramitação mantém por 25 anos o sigilo de documentos ultrassecretos, renováveis por mais 25 anos, o que Massuda considera um tempo longo demais.
Especialista em políticas comparadas e um dos fundadores do Movimento Brasil Aberto, Greg Michener diz que a lei já nasce atrasada em relação ao que existe de mais atual no mundo, mas é melhor que seja aprovada como está, pois, caso o Senado decida fazer alterações no texto, ele terá que voltar à Câmara dos Deputados, atrasando ainda mais a entrada em vigor. Michener aponta como pontos positivos da lei o fato de exigir que a informação seja fornecida aberta (em um formato reprocessável ou legível por máquina) e seja abrangente a todos os níveis de governo e corporações ligadas ao poder público. A parte negativa fica por conta dos três diferentes níveis de sigilo e o prazo de reserva para documentos classificados.
Em vez de publicar os relatórios apenas em PDF, que só podem ser lidos pelas pessoas, a ideia é possibilitar o uso das informações públicas em softwares e aplicativos que estejam aptos a recombiná-las e ressignificá-las, explica o cientista político e membro da comunidade Transparência Hacker, Ricardo Poppi. Usando dados abertos, o programador Maurício Maia criou um site que mostra de forma simples os alagamentos na cidade de São Paulo, o site alagamentos.topical.com.br.
“Na América Latina, entre os países democráticos, apenas o Brasil e a Costa Rica não têm uma legislação que garanta o acesso à informação pública. E, mesmo assim, na Costa Rica não há lei, mas existe de fato esse acesso”, lembra Michener. Cuba, obviamente, fica fora das estatísticas. “O Brasil está muito atrasado em relação ao assunto”. Para Michener, é importante que o País aprove a lei rapidamente, para permitir uma maior transparência e agilidade. “Os projetos envolvendo as Olimpíadas, a Copa do Mundo e o pré-sal são exemplos nos quais há necessidade de maior transparência e acompanhamento.”
O melhor modelo de transparência nas informações públicas é o do México, onde existe um órgão independente responsável pela fiscalização e acompanhamento das requisições feitas pelos cidadãos. O Instituto Federal de Acesso a Informações Públicas (Ifai) tem poder de pressionar os órgãos do governo e, assim, garantir a divulgação de informações essenciais. No Brasil, o recurso previsto pelo projeto de lei é a Controladoria-Geral da União, que, na visão de Michener, por ser parte do Executivo, não teria a independência necessária para pressionar os órgãos da administração pública.
Na ausência de uma lei geral que regulamente a questão, no entanto, algumas iniciativas vêm sendo tomadas por setores mais antenados da administração pública. É o caso da Lei 10.650, que permite o acesso público aos documentos que tratem de matéria ambiental armazenados no Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama). Com base nesta lei, o site O Eco conseguiu informações exclusivas a respeito das hidrelétricas do Rio Madeira e de Belo Monte, conta o editor-chefe Gustavo Faleiros. O Portal da Transparência e o E-gov, do governo federal, também seguem em direção a uma maior transparência.
Poder das pessoas
O fato é que, se o Brasil quiser mesmo ser exemplo de democracia para os países do Oriente Médio e do Norte da África, como disse o presidente americano Barack Obama, precisa apressar-se e aprovar a lei de acesso a informações públicas, como já fizeram cerca de 90 países. O próprio Obama é testemunha do que o movimento de pessoas digitalmente coordenadas pode fazer. Vivemos a era do poder das pessoas, segundo ensina Gerd Leonhard, futurista e palestrante alemão, CEO da The Future Agency, autor de diversos livros, entre eles, The End of Control.
Para Leonhard, o mundo vive a transformação de um “egossistema” baseado no poder de grandes companhias e grandes governos em um ecossistema onde o poder de muitos pequenos desafia o grande. “O poder não é mais aquilo que você controla, mas aquilo que você compartilha.”
Talvez a chamada Revolução do Jasmim [2] também possa servir de exemplo para o Estado brasileiro, que caminha lento, enquanto cada vez mais brasileiros se conectam às redes e se articulam. “É melhor que o Estado brasileiro tome a dianteira, antes que alguém decida usar o Wikileaks para divulgar informações confidenciais”, pensa Arthur Serra Massuda. “A divulgação das informações não é entendida pelos políticos como um direito do cidadão”, lamenta a vice-diretora geral do Movimento Voto Consciente, Rosangela Giembinsky, opinião compartilhada pelo coordenador de projetos da Transparência Brasil, Rogério Schmitt.
[2] Sucessão de manifestações ocorridas na Tunísia entre dezembro de 2010 e janeiro de 2011 que levou à saída do presidente da República Zine El-Abidine Ben Ali, e espalhou-se pelo mundo árabe, do Norte da África ao Oriente Médio.
Não se trata apenas de regulamentar a divulgação de informações, mas, sim, de entender qual é a energia que movimenta o mundo hoje, analisa Mauricio Curi, curador do TEDx Vila Madá. Usando de forma criativa a Teoria da Relatividade de Albert Einstein (E=MC2), Curi acredita que Energia atualmente é gerada pela Mobilização multiplicada pelo Conhecimento de muitos. “A energia no mundo de hoje não é apenas digital, é humana. É um modelo propulsor da sociedade.”
As pessoas começam a sentir que não estão sozinhas. Daniela Silva, cofundadora da empresa Esfera e integrante do Movimento Transparência Hacker resume a necessidade por mais transparência em uma frase: “A internet muda e transforma pra sempre a prática de fazer política”.
Mais iformações sobre fontes, entidades e links citados nesta reportagem aqui.[:en]Em matéria de acesso à informação pública, o Brasil está na lanterna até mesmo na América Latina. Enquanto isso, pipocam na web iniciativas em prol da transparência
Quando a primeira lei de acesso a informações públicas foi promulgada na Suécia em 1766, o Brasil era um vice-reinado de Portugal, com 1,5 milhão de habitantes, governado por Vasco de Mascarenhas, o Conde de Óbidos. Passados 245 anos, o Brasil democrático da presidente Dilma Rousseff vive a era da revolução digital de Wikileaks, Facebook e Twitter ainda sem uma lei que garanta aos 200 milhões de brasileiros esse direito fundamental.
Trata-se de direito previsto pelo Artigo 19 da Declaração Universal de Direitos Humanos e também pelo Artigo 5º da Constituição Brasileira, mas não regulamentado. Mas, enquanto a Lei de Acesso à Informação [Projeto de Lei Complementar 41/2010] tramita pela Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática do Senado, sem qualquer previsão de votação, setores mais plugados da sociedade criam alternativas que, aos poucos, abrem caminhos para que mais brasileiros compreendam o que está acontecendo nas variadas esferas de governo.
Embalados pela revolução digital, a mesma que está contribuindo para a mobilização pela democracia no Oriente Médio e Norte da África, movimentos como Cidade Democrática, Vote na Web, Urbanias, Rede Nossa São Paulo, entre outros, entram em cena criando mecanismos que permitem traduzir e acompanhar os atos do poder público. Multidisciplinares e, em geral, pilotados por jovens cheios de energia e disposição, articulam-se na velocidade da internet sem esperar a tramitação de uma lei que segue em ritmo analógico.
O votenaweb.com.br, por exemplo, traduz para uma linguagem de fácil compreensão e coloca em votação virtual os projetos de lei mais importantes em pauta no Congresso Nacional. De seus mais de 15 mil usuários cadastrados, 55% têm entre 16 e 30 anos. Para Fernando Barreto, da WebCitizen, empresa criadora do site, mais importante do que a aprovação da Lei de Acesso à Informação é a mobilização das pessoas. “Nosso desafio é fazer com que o cidadão se interesse também por questões menos midiáticas, mas importantes para o País.”
Sensação de fazer parte
Rodrigo Bandeira, fundador do cidadedemocratica.org.br, segue na mesma linha de pensamento. O fundamental, segundo diz, é mostrar aos jovens como se articular e usar a inteligência coletiva para construir uma sociedade de colaboração. Em Jundiaí, por exemplo, o grupo descobriu um obscuro instrumento de participação popular na Câmara Municipal – a Comissão de Participação Legislativa –, e conseguiu da prefeitura a aprovação de um plano cicloviário desenvolvido por ciclistas. “Isso gera um sentimento de ser dono da cidade”, resume Henrique Parra Parra Filho, um dos coordenadores locais.
O urbanias.com.br escolheu outro caminho e se propõe a trazer para os cidadãos as informações que ele não consegue diretamente do poder público. Funciona como um Serviço de Atendimento ao Consumidor, em que o morador da cidade de São Paulo entra com seu pedido ou reclamação e pode acompanhar todo o processo até a resolução, coisa impossível de ser feita por meio do site da prefeitura. São mais de 1.000 usuários cadastrados e 900 demandas, 60% delas resolvidas, segundo Rafael Balago, jornalista moderador do site. “Serviços via internet como o Urbanias e o SacSP estão fazendo com que o poder público se mexa. Algumas subprefeituras têm até conta no Twitter e interagem diretamente com as pessoas. Isso é positivo”, acredita.
Um dos exemplos mais bem-sucedidos de iniciativas pela transparência da administração pública, a Rede Nossa São Paulo mobiliza 640 entidades em torno de ideias e ações para a capital paulista. O coordenador do Grupo de Trabalho de Orçamento da Rede, economista e ex-vereador Odilon Guedes, afirma que a aprovação da lei de acesso à informação pública é fundamental para que os brasileiros compreendam o que está acontecendo com o dinheiro pago em impostos. Criador da Lei da Transparência, que exige a prestação de contas por parte dos ocupantes de cargos públicos da cidade de São Paulo, Odilon considera a questão explosiva. “Hoje, 34% do PIB referem-se a impostos. E as pessoas não sabem como esse dinheiro vem sendo gasto.”
Jornalismo investigativo
O presidente da Associação Brasileira de Jornalistas Investigativos (Abraji), Fernando Rodrigues, lamenta que a lei de acesso a informações esteja há quase dez anos tramitando no Congresso, enquanto empresas que querem se instalar no Brasil precisam contratar serviços de lobby em Brasília para obter informações às quais teriam direito.
Nos Estados Unidos, 40% das consultas feitas ao Freedom of Information Act [1] são originárias de empresas. Para Rodrigues, o Brasil precisa acabar com o conceito de opacidade que domina a administração pública se quiser ser verdadeiramente desenvolvido. “Tudo que é produzido no governo é público.”
[1] Lei de 1966 que regulamenta o acesso a informações públicas nos EUA.
A Abraji trabalha junto com outras organizações, entre elas a Artigo 19, a Transparência Brasil e a Transparência Hacker, pressionando pela aprovação da lei no Senado. Mas o líder do PT, Humberto Costa (PE), admite que até agora não há qualquer articulação para dar mais velocidade ao projeto.
Na visão de Arthur Serra Massuda, da Artigo 19, o projeto não avança por pressão dos ministérios da Defesa e das Relações Exteriores. A questão mais espinhosa é o fim do sigilo de documentos secretos. O projeto de lei em tramitação mantém por 25 anos o sigilo de documentos ultrassecretos, renováveis por mais 25 anos, o que Massuda considera um tempo longo demais.
Especialista em políticas comparadas e um dos fundadores do Movimento Brasil Aberto, Greg Michener diz que a lei já nasce atrasada em relação ao que existe de mais atual no mundo, mas é melhor que seja aprovada como está, pois, caso o Senado decida fazer alterações no texto, ele terá que voltar à Câmara dos Deputados, atrasando ainda mais a entrada em vigor. Michener aponta como pontos positivos da lei o fato de exigir que a informação seja fornecida aberta (em um formato reprocessável ou legível por máquina) e seja abrangente a todos os níveis de governo e corporações ligadas ao poder público. A parte negativa fica por conta dos três diferentes níveis de sigilo e o prazo de reserva para documentos classificados.
Em vez de publicar os relatórios apenas em PDF, que só podem ser lidos pelas pessoas, a ideia é possibilitar o uso das informações públicas em softwares e aplicativos que estejam aptos a recombiná-las e ressignificá-las, explica o cientista político e membro da comunidade Transparência Hacker, Ricardo Poppi. Usando dados abertos, o programador Maurício Maia criou um site que mostra de forma simples os alagamentos na cidade de São Paulo, o site alagamentos.topical.com.br.
“Na América Latina, entre os países democráticos, apenas o Brasil e a Costa Rica não têm uma legislação que garanta o acesso à informação pública. E, mesmo assim, na Costa Rica não há lei, mas existe de fato esse acesso”, lembra Michener. Cuba, obviamente, fica fora das estatísticas. “O Brasil está muito atrasado em relação ao assunto”. Para Michener, é importante que o País aprove a lei rapidamente, para permitir uma maior transparência e agilidade. “Os projetos envolvendo as Olimpíadas, a Copa do Mundo e o pré-sal são exemplos nos quais há necessidade de maior transparência e acompanhamento.”
O melhor modelo de transparência nas informações públicas é o do México, onde existe um órgão independente responsável pela fiscalização e acompanhamento das requisições feitas pelos cidadãos. O Instituto Federal de Acesso a Informações Públicas (Ifai) tem poder de pressionar os órgãos do governo e, assim, garantir a divulgação de informações essenciais. No Brasil, o recurso previsto pelo projeto de lei é a Controladoria-Geral da União, que, na visão de Michener, por ser parte do Executivo, não teria a independência necessária para pressionar os órgãos da administração pública.
Na ausência de uma lei geral que regulamente a questão, no entanto, algumas iniciativas vêm sendo tomadas por setores mais antenados da administração pública. É o caso da Lei 10.650, que permite o acesso público aos documentos que tratem de matéria ambiental armazenados no Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama). Com base nesta lei, o site O Eco conseguiu informações exclusivas a respeito das hidrelétricas do Rio Madeira e de Belo Monte, conta o editor-chefe Gustavo Faleiros. O Portal da Transparência e o E-gov, do governo federal, também seguem em direção a uma maior transparência.
Poder das pessoas
O fato é que, se o Brasil quiser mesmo ser exemplo de democracia para os países do Oriente Médio e do Norte da África, como disse o presidente americano Barack Obama, precisa apressar-se e aprovar a lei de acesso a informações públicas, como já fizeram cerca de 90 países. O próprio Obama é testemunha do que o movimento de pessoas digitalmente coordenadas pode fazer. Vivemos a era do poder das pessoas, segundo ensina Gerd Leonhard, futurista e palestrante alemão, CEO da The Future Agency, autor de diversos livros, entre eles, The End of Control.
Para Leonhard, o mundo vive a transformação de um “egossistema” baseado no poder de grandes companhias e grandes governos em um ecossistema onde o poder de muitos pequenos desafia o grande. “O poder não é mais aquilo que você controla, mas aquilo que você compartilha.”
Talvez a chamada Revolução do Jasmim [2] também possa servir de exemplo para o Estado brasileiro, que caminha lento, enquanto cada vez mais brasileiros se conectam às redes e se articulam. “É melhor que o Estado brasileiro tome a dianteira, antes que alguém decida usar o Wikileaks para divulgar informações confidenciais”, pensa Arthur Serra Massuda. “A divulgação das informações não é entendida pelos políticos como um direito do cidadão”, lamenta a vice-diretora geral do Movimento Voto Consciente, Rosangela Giembinsky, opinião compartilhada pelo coordenador de projetos da Transparência Brasil, Rogério Schmitt.
[2] Sucessão de manifestações ocorridas na Tunísia entre dezembro de 2010 e janeiro de 2011 que levou à saída do presidente da República Zine El-Abidine Ben Ali, e espalhou-se pelo mundo árabe, do Norte da África ao Oriente Médio.
Não se trata apenas de regulamentar a divulgação de informações, mas, sim, de entender qual é a energia que movimenta o mundo hoje, analisa Mauricio Curi, curador do TEDx Vila Madá. Usando de forma criativa a Teoria da Relatividade de Albert Einstein (E=MC2), Curi acredita que Energia atualmente é gerada pela Mobilização multiplicada pelo Conhecimento de muitos. “A energia no mundo de hoje não é apenas digital, é humana. É um modelo propulsor da sociedade.”
As pessoas começam a sentir que não estão sozinhas. Daniela Silva, cofundadora da empresa Esfera e integrante do Movimento Transparência Hacker resume a necessidade por mais transparência em uma frase: “A internet muda e transforma pra sempre a prática de fazer política”.
Mais iformações sobre fontes, entidades e links citados nesta reportagem aqui.