Até telecurso é usado para enfrentar déficit de profissionais qualificados para o manejo florestal na Amazônia
Muito se fala sobre a economia florestal sustentável da Amazônia. O assunto é obrigatório nas rodas globais que discutem o desenvolvimento sustentável. Sua aplicação, contudo, enfrenta obstáculos, tais como a confusão fundiária reinante na região, a falta de licença ambiental nos assentamentos rurais, o ritmo lento na licitação de concessões nas Florestas Nacionais (Flonas) e a frágil estrutura dos órgãos ambientais para fiscalizar a qualidade do manejo florestal. Ainda que essas questões fossem resolvidas, as operações de exploração madeireira nos planos de manejo florestal esbarrariam em uma mais primordial: a falta de mão de obra qualificada para tocar essa atividade, baseada no corte seletivo e cuidadoso das árvores, feita de modo a proteger a segurança dos trabalhadores e impactar fauna e flora o mínimo possível.
O problema só não é mais sério em virtude da reduzida área em concessão. Dos 10 milhões de hectares de Flonas disponíveis, apenas 355 mil ha foram concedidos ou estão em licitação. De acordo com o Serviço Florestal Brasileiro (SFB), até o fim deste ano perto de 1 milhão de ha serão concedidos ou estarão em licitação, número muito inferior aos 4 milhões de ha prometidos para 2009 pelo então ministro do Meio Ambiente Carlos Minc. Segundo estimativa do Instituto Floresta Tropical (IFT), de Belém, a necessidade de mão de obra qualificada para fiscalizar, gerenciar e operar a extração madeireira nos planos de manejo chega a quase 35 mil profissionais, entre engenheiros e técnicos florestais e operadores. A conta toma como parâmetro uma área de 35 milhões de ha em concessões florestais na Amazônia, necessária para atender à demanda total por madeira na região, que atinge ao redor de 21 milhões de metros cúbicos em toras ao ano (no valor em torno de R$ 3,5 bilhões).
Mesmo no cenário de curto prazo do SFB, para 2020 – em que as concessões alcançam 10 milhões de ha –, a demanda continua substancial: perto de 10 mil profissionais, mais que o dobro dos quase 5 mil atuais. “Não é só uma questão de não haver trabalhadores em número suficiente. Não há engenheiros para implantar os projetos nem profissionais no governo para fiscalizar a qualidade do manejo”, revela Marco Lentini, secretário-executivo do IFT, que responde praticamente sozinho na Amazônia pela capacitação em manejo florestal.
Parcerias começam a pipocar para enfrentar o quadro educacional adverso na Amazônia, caracterizado pela falta de conteúdos curriculares que despertem vocações para o manejo e escassez de técnicos e engenheiros florestais na maior floresta tropical do mundo (menos de 60 técnicos formados em 2006). A iniciativa mais ambiciosa está sendo gestada pela Fundação Roberto Marinho, com apoio do SFB e do Fundo Vale. Até o fim do ano, a fundação deverá lançar uma série de 15 videoaulas sobre manejo florestal no formato do telecurso que terão como público, em uma primeira etapa, 2 mil professores, 180 mil alunos do Ensino Fundamental e do Ensino Médio e 100 extensionistas rurais em 28 cidades do Pará. “O principal objetivo será despertar nos alunos vocações profissionais associadas ao manejo de produtos madeireiros e não madeireiros”, explica Andrea Margit, gerente de meio ambiente da fundação.
Há quem não veja tanta gravidade no problema da mão de obra. Desde que a Amata começou a operar em agosto passado sua concessão na Flona do Jamari, em Rondônia, Roberto Waack, presidente da empresa, percebeu que é possível lançar mão de trabalhadores de empresas que atuavam na ilegalidade. “Temos a oportunidade de requalificar um monte de gente experiente que está sendo criminalizada”, diz. Segundo o diretor do SFB, Antônio Carlos Hummel, a demanda por profissionais qualificados será atendida à medida que as empresas ganhem as licitações. “Se elas têm a concessão garantida, possuem maior segurança em investir na qualificação da mão de obra.”