Ter filhos significa aumentar a população e seus impactos sobre o meio ambiente. Mas também pode ser a chave para envelhecer melhor
Semanas atrás completei 40 anos. Nunca achei que, ao chegar a esta idade, o que me definiria seria ter ou não ter tido filhos. Talvez esta seja apenas uma das muitas coisas surpreendentes que acontecem quando a gente chega neste ponto da vida, nem criança nem velho. Coluna do meio.
Houve um momento, nos meus 20 anos, em que o tal relógio biológico falou alto e me fez, momentaneamente, entreter a ideia de procriar. A vida interveio, as ambições do trabalho, estudos, viagens e, finalmente, o comprometimento com a sustentabilidade.
Em geral, os ambientalistas e simpatizantes do movimento pela sustentabilidade gostam de prescrever um mundo com fertilidade em baixa, de modo a controlar a população e, com ela, os impactos sobre o meio ambiente. A autora e blogueira Stefanie Iris Weiss, por exemplo, lembra que ter um filho nos Estados Unidos aumenta em quase seis vezes as emissões de carbono de uma pessoa ao longo de sua vida. Não que, para começar, a pegada do americano médio – assim como de outros habitantes do mundo desenvolvido e dos que vivem na porção desenvolvida de países como o Brasil – seja pequena. De qualquer forma, reza a cartilha verde, os rebentos aumentam a pressão por água, alimentos e recursos em geral e objetos de consumo em particular. Se todos os filhos de cidadãos do mundo em desenvolvimento alcançarem o padrão dos americanos, o colapso baterá à nossa porta.
Foi nos meus 30 anos que a minha visão do assunto começou a mudar. Talvez porque, sem a intensidade dos 20, eu começasse a ver que crianças trazem renovação, que podemos preparar as novas gerações para responder aos desafios ambientais e que tais gerações provavelmente viverão em futuro bastante diferente do que conseguimos modelar com base no presente. Mais do que isso, talvez eu tenha percebido que, além do tal relógio biológico, há dentro de nós uma parte que espera continuar vivendo em nossos filhos depois que nos formos da superfície da Terra. Apesar de todos os argumentos racionais sobre a tal bomba populacional, é como se estivéssemos “programados” para reproduzir.
Assim como com o meio ambiente, as visões sobre procriar ou não podem ser classificadas de igualitárias – aqueles que optam por não ter filhos em nome do interesse coletivo – e de fatalistas – os que acreditam que, como o colapso ambiental é inevitável, uma criatura a mais não fará diferença. Há também a grande maioria que, candidamente, atribui aos outros a tarefa de fazer algo para evitar os problemas causados pela superpopulação. Na Austrália, para onde me mudei aos 36, os casais que ganham neném recebem também um cheque de 5 mil dólares do governo. Conheço várias famílias com três ou quatro filhos e sem preocupação alguma com o impacto para sua pegada de carbono.
Pessoalmente o que me fez descer do muro e decidir em favor de uma família maior foi o passar dos anos. Aos 20 temos a consciência de que vamos morrer um dia, mas procedemos como se ela não existisse, assumimos riscos, gostamos de pensar que vivemos perigosamente. Aos 30 estamos ocupados demais com trabalho, reputação, oportunidades. Aos 40 parece que finalmente olhamos para a frente e passa a fazer sentido procriar – será que, com a maturidade, vem um certo otimismo?
Cientistas sociais estudam o chamado paradoxo de envelhecer: o fato de que o envelhecimento, embora traga o declínio de várias habilidades importantes, está associado a um maior bem-estar. Uma das razões, apontam as pesquisas, é que os mais velhos extraem maior satisfação de suas relações sociais, especialmente com seus filhos e parentes jovens, e são capazes de resolver problemas interpessoais mais eficientemente. Podemos assumir que ter filhos e uma boa relação com eles faz parte de envelhecer bem.
Há uma coisa, porém, que ninguém nos conta e é difícil perceber antes de chegarmos nesse meio do caminho, à beira de envelhecer: nem sempre – ou melhor, quase nunca – estamos no controle. Eis que cá estou, aos 40 e sem filhos. Mas ainda esperando que a natureza – com uma mãozinha da tecnologia – me dê a chance de adicionar mais um às gerações futuras.[:en]Ter filhos significa aumentar a população e seus impactos sobre o meio ambiente. Mas também pode ser a chave para envelhecer melhor
Semanas atrás completei 40 anos. Nunca achei que, ao chegar a esta idade, o que me definiria seria ter ou não ter tido filhos. Talvez esta seja apenas uma das muitas coisas surpreendentes que acontecem quando a gente chega neste ponto da vida, nem criança nem velho. Coluna do meio.
Houve um momento, nos meus 20 anos, em que o tal relógio biológico falou alto e me fez, momentaneamente, entreter a ideia de procriar. A vida interveio, as ambições do trabalho, estudos, viagens e, finalmente, o comprometimento com a sustentabilidade.
Em geral, os ambientalistas e simpatizantes do movimento pela sustentabilidade gostam de prescrever um mundo com fertilidade em baixa, de modo a controlar a população e, com ela, os impactos sobre o meio ambiente. A autora e blogueira Stefanie Iris Weiss, por exemplo, lembra que ter um filho nos Estados Unidos aumenta em quase seis vezes as emissões de carbono de uma pessoa ao longo de sua vida. Não que, para começar, a pegada do americano médio – assim como de outros habitantes do mundo desenvolvido e dos que vivem na porção desenvolvida de países como o Brasil – seja pequena. De qualquer forma, reza a cartilha verde, os rebentos aumentam a pressão por água, alimentos e recursos em geral e objetos de consumo em particular. Se todos os filhos de cidadãos do mundo em desenvolvimento alcançarem o padrão dos americanos, o colapso baterá à nossa porta.
Foi nos meus 30 anos que a minha visão do assunto começou a mudar. Talvez porque, sem a intensidade dos 20, eu começasse a ver que crianças trazem renovação, que podemos preparar as novas gerações para responder aos desafios ambientais e que tais gerações provavelmente viverão em futuro bastante diferente do que conseguimos modelar com base no presente. Mais do que isso, talvez eu tenha percebido que, além do tal relógio biológico, há dentro de nós uma parte que espera continuar vivendo em nossos filhos depois que nos formos da superfície da Terra. Apesar de todos os argumentos racionais sobre a tal bomba populacional, é como se estivéssemos “programados” para reproduzir.
Assim como com o meio ambiente, as visões sobre procriar ou não podem ser classificadas de igualitárias – aqueles que optam por não ter filhos em nome do interesse coletivo – e de fatalistas – os que acreditam que, como o colapso ambiental é inevitável, uma criatura a mais não fará diferença. Há também a grande maioria que, candidamente, atribui aos outros a tarefa de fazer algo para evitar os problemas causados pela superpopulação. Na Austrália, para onde me mudei aos 36, os casais que ganham neném recebem também um cheque de 5 mil dólares do governo. Conheço várias famílias com três ou quatro filhos e sem preocupação alguma com o impacto para sua pegada de carbono.
Pessoalmente o que me fez descer do muro e decidir em favor de uma família maior foi o passar dos anos. Aos 20 temos a consciência de que vamos morrer um dia, mas procedemos como se ela não existisse, assumimos riscos, gostamos de pensar que vivemos perigosamente. Aos 30 estamos ocupados demais com trabalho, reputação, oportunidades. Aos 40 parece que finalmente olhamos para a frente e passa a fazer sentido procriar – será que, com a maturidade, vem um certo otimismo?
Cientistas sociais estudam o chamado paradoxo de envelhecer: o fato de que o envelhecimento, embora traga o declínio de várias habilidades importantes, está associado a um maior bem-estar. Uma das razões, apontam as pesquisas, é que os mais velhos extraem maior satisfação de suas relações sociais, especialmente com seus filhos e parentes jovens, e são capazes de resolver problemas interpessoais mais eficientemente. Podemos assumir que ter filhos e uma boa relação com eles faz parte de envelhecer bem.
Há uma coisa, porém, que ninguém nos conta e é difícil perceber antes de chegarmos nesse meio do caminho, à beira de envelhecer: nem sempre – ou melhor, quase nunca – estamos no controle. Eis que cá estou, aos 40 e sem filhos. Mas ainda esperando que a natureza – com uma mãozinha da tecnologia – me dê a chance de adicionar mais um às gerações futuras.