O que pensa um jovem carioca de classe média que nasceu junto com os primeiros debates em torno do desenvolvimento sustentável
O carioca William Doyle terá 20 anos quando os chefes de Estado declararem aberta, no dia 4 de junho de 2012, a Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20. PÁGINA22 antecipa um bate-papo com esse estudante de Direito e violinista do Theatro Municipal do Rio, na tentativa de fisgar alguns indícios do que pensa um integrante da geração classe média que nasceu com a Rio 92, as diferenças em relação à geração dos pais, além de perspectivas e comportamentos daqueles que estarão no comando do mundo daqui a outros 20 anos. Confira os trechos da conversa:
Rio + o quê?
No ano retrasado, participei de um evento da ONU em que tomei conhecimento da Rio+20. Pouca gente sabe da Conferência. O carioca tem memória curta – o Brasil, aliás. Acho que, quando todos ficarem a par, no geral, vão querer saber se terá famosos, como Angelina Jolie etc. Para mim, sustentabilidade é desenvolvimento econômico que não resulte prejuízo para a natureza, que não produza catástrofes ambientais e traga mais qualidade de vida para as pessoas.
Como nossos pais
(William é filho de Philip Doyle, musicista inglês que chegou ao Rio, com os pais, aos 10 anos, e de lá nunca mais saiu. William não vê diferença de comportamento entre as gerações, quando o tema é sustentabilidade.)
Vejo gente poluindo pra caramba. Estive na Alemanha para estudar a língua e tive oportunidade de ver as pessoas separando o lixo, devolvendo a garrafa de vidro e os produtos com etiquetas sobre a forma como foram produzidos. Vejo mais atraso do Brasil em relação aos outros países do que diferenças entre as gerações.
Os vários Rios
Acho o pessoal desleixado em relação a temas ambientais. A Barra da Tijuca gira em torno do consumo, é o excesso. Na Zona Sul, as pessoas têm mais acesso a educação e cultura, andam mais de bike, mas não temos boas ciclovias, o trânsito é caótico e os governos não incentivam hábitos alternativos de transporte, reciclagem, de nada. Na minha universidade, por exemplo, não tem bicicletário. Não vejo iniciativas de plantio de árvores, hortas. O carioca é caloroso, todo mundo se conhece nos bairros, mas acho que há dificuldade para se engajar em causas importantes. As prioridades são outras e os interesses, imediatos, como aumento de salário. A segurança também ainda é uma preocupação muito grande.
A minha turma
Penso que minha geração pode mudar a cultura da acomodação. Nós temos mais informações, redes sociais, fazemos viagens e temos acesso à educação. Está mudando aos poucos. Estamos gostando de programas mais simples e autênticos, como rodas de samba, feijoada na Lapa. Vamos aproveitando mais os espaços que a cidade oferece. Há também preocupação de recolher o lixo na praia – flyer de festa, por exemplo. A gente é até paranoico com isso.
Vejo ainda um entrosamento maior entre a favela e o asfalto, uma mudança de cultura recente. Minha mãe tem uma escola de música e há algum tempo fez um projeto de ensino no Morro Dona Marta. Dei aulas de violino lá, ia comer macarronada com o pessoal, tivemos um convívio bom. Meus amigos acharam estranho, na época, mas hoje não achariam.
A Copa está por fora
Não estamos otimistas com o legado dos eventos esportivos. Para que perdurem e beneficiem a cidade, deve ter manutenção do que vai ser construído e nós, sinceramente, não acreditamos nisso. Além disso, a Copa e as Olimpíadas estão gerando um aumento absurdo no custo de vida do Rio. Tudo está caro, aluguéis, comida, transporte. E as obras beneficiam lugares já privilegiados, não apostaram em bairros como São Cristóvão, Meyer, mas, sim, a Zona Sul, que já é abastada.
Nós e eles
O que é bom lá fora
Eu acho a energia eólica incrível. O Brasil tem um tremendo potencial que não é aproveitado. Na Alemanha, vi muito uso da energia eólica. Aqui, o Brasil investe no petróleo, que é uma fonte de energia superada. Por que não temos transporte fluvial, como nos outros países? As rodovias não suportam mais o tráfego.
O que é bom aqui dentro
Somos calorosos, acho que isso pode ser aproveitado para um mundo mais sustentável, mais amigável. Gosto também dos projetos das escolas do Rio com comunidades carentes. Não sei como funciona no resto do País, mas esse intercâmbio aqui é muito legal.