Bebeto e Romário, a dupla campeã do tetra, agora joga em campos opostos na arena esportiva política
Em 9 de julho de 1994, o Brasil derrotava a Holanda por 3 a 2, no que foi considerado um dos melhores jogos da Seleção Brasileira naquele ano, ficando a duas partidas do tetracampeonato. Ao comemorar o segundo gol, Bebeto homenageou o filho recém-nascido com o embala-neném, feito lado a lado com o parceiro de ataque Romário e o volante Mazinho. O gesto ficou famoso e até entrou para o repertório de comemorações do jogo de computador FIFA Soccer 10.
Duas décadas depois, às vésperas da segunda Copa a ser realizada no Brasil, os atacantes passaram a jogar em lados opostos. José Roberto Gama de Oliveira, o Bebeto, está no primeiro mandato de deputado estadual do Rio de Janeiro pelo PDT e participa como membro voluntário do Conselho Administrativo do Comitê Organizador Local (COL) da Copa. Romário de Souza Faria, filiado ao PSB do Rio, está na Câmara dos Deputados, de onde tem vociferado contra a CBF e apelado à Fifa para intervir no COL. Ambos responderam a perguntas da PÁGIN22 por e-mail.
A realização da Copa e das Olimpíadas tem gerado tanto críticas quanto expectativas apaixonadas. Na sua opinião, qual será o legado desses dois eventos para o País?
Bebeto– Fora o orgulho e a alegria de sediar esses grandes eventos do esporte, o Brasil está tendo a chance de crescer em sua economia, de atrair mais turismo e comércio varejista, de abrir as portas para novos negócios. São oportunidades que precisam ser muito bem aproveitadas. Imagine só! Na Copa das Confederações, vamos receber executivos, formadores de opinião, empresários e compradores de redes de varejos de mais de 70 países.
A hora é agora para promovermos estratégias de relacionamentos e de grandes promoções comerciais. Vamos unir o útil ao agradável. Tem coisa melhor? Misturar o futebol, que é a nossa grande paixão, com o crescimento do País. E estamos trabalhando para isso. Temos investido em obras de melhoramento nos estádios e nas cidades em geral, para poder atender a demanda de estrangeiros durante essa festança. Aliás, obras que ficarão para os brasileiros após o torneio. Esses eventos são possibilidades de novos negócios em setores como madeira e móveis, comércio varejista, agronegócio, construção civil, turismo, economia, artesanato e tecnologia da informação. Gerando, assim, novos empregos, com reflexo direto no desenvolvimento do País.
Romário – Difícil falar em legado a um ano da competição, quando ainda não temos quase nada. Além dos estádios, o que ficará de infraestrutura para a população? Esta é uma pergunta que me faço diariamente. Entre uma reflexão e outra, as conclusões não são nada animadoras. O tão falado legado social para a população parece ter ficado só no papel. Quase todas as obras de transporte estão atrasadas, a inauguração de algumas, inclusive, já foi remarcada para ocorrer somente após o Mundial, e outras foram canceladas. Diante desse cenário, sem obras de mobilidade e com superfaturamento nos estádios, só nos resta o capital humano. O legado seria a qualificação dos nossos trabalhadores. Acho que os empresários têm esse importante papel no momento. Eles devem isso ao Brasil, já que serão os principais beneficiados com geração de receita, especialmente o setor de serviços.
Uma das críticas mais frequentes é a participação da CBF na organização. Há diferença entre o COL ser liderado pela confederação nacional de futebol e por uma comissão independente de ex-jogadores, como na Copa de 1998 na França?
Bebeto – Sou um ex-jogador de futebol e, por ter vivenciado essa experiência na pele, acredito que seja mais fácil a organização de uma Copa pela confederação do que por uma comissão que, às vezes, pode não ter muita ideia sobre fatores essenciais. Sou membro do COL, mas é importante frisar que sou voluntário. Abri mão de qualquer remuneração. Faço de coração, por amor. Mas, independentemente de serem jogadores ou não à frente do negócio, é preciso que as pessoas designadas sejam preparadas.
Romário – Infelizmente, no Brasil, o presidente da CBF [José Maria Marin] acabou acumulando essa função. Uma entidade em completo descrédito. Se houvesse uma pessoa séria à frente do COL, talvez não estivéssemos assistindo a tantos absurdos. Isso também daria mais crédito e abriria portas para negociações importantes. A presidente Dilma, por exemplo, não recebe o Marin.
A construção de estádios em cidades sem tradição esportiva também tem gerado polêmica. Seria possível fazer a Copa sem construir novos estádios?
Bebeto – Não. Alguns estádios não tinham estrutura para receber a Copa. E sabemos das exigências da Fifa.
Romário – A questão não é deixar de construir, mas construir estádios mais modestos. Pensando em seu uso no pós-Copa. Mas ficou muito claro que o brasileiro está pagando uma festa para a Fifa encher os bolsos e ir embora, sem pagar um imposto.
O futebol parece viver uma tendência de elitização. As classes mais populares estão sendo afastadas dos estádios?
Bebeto – Eu sou da turma que vê o futebol como esporte popular. Para mim, o preço dos ingressos tem de ser acessível.
Romário – Estamos assistindo a essa mudança. E o pior: quem mais gosta de futebol está sendo excluído dele. Acredito que, depois da Copa, os ingressos nessas arenas serão ainda mais caros, afinal, elas precisam de mais dinheiro para se pagar e se manter.
A ligação de José Maria Marin com a ditadura pode atrapalhar o brilho da Copa?
Bebeto– No momento, todos estão focados na Copa. Esse é o nosso maior objetivo.
Romário – Completamente. Olha que contraste: a presidenta Dilma foi vítima da ditadura, enquanto o presidente do COL era ligado à ala mais radical da ditadura. Não só isso, o Brasil vai receber outros chefes de Estado, e isso será um constrangimento para a nação.
Qual o risco de acontecer um novo Maracanazo em 2014?
Bebeto – Eu sempre penso positivo. Quero ver o Brasil chegar à final no nosso país. Já que não tive a felicidade de disputar uma Copa do Mundo em casa, eu torço para sermos campeões.
Romário – A grande diferença é que, naquela Copa, o Brasil era o predileto, havia toda uma expectativa em torno da Seleção, e nesta não é. Não sei nem se chega à final.
Leia mais:
“Não faz sentido O Brasil sediar a Copa”, diz Juca Kfouri em entrevista
O que fica para a pátria em chuteiras?
[:en]Bebeto e Romário, a dupla campeã do tetra, agora joga em campos opostos na arena esportiva política
Em 9 de julho de 1994, o Brasil derrotava a Holanda por 3 a 2, no que foi considerado um dos melhores jogos da Seleção Brasileira naquele ano, ficando a duas partidas do tetracampeonato. Ao comemorar o segundo gol, Bebeto homenageou o filho recém-nascido com o embala-neném, feito lado a lado com o parceiro de ataque Romário e o volante Mazinho. O gesto ficou famoso e até entrou para o repertório de comemorações do jogo de computador FIFA Soccer 10.
Duas décadas depois, às vésperas da segunda Copa a ser realizada no Brasil, os atacantes passaram a jogar em lados opostos. José Roberto Gama de Oliveira, o Bebeto, está no primeiro mandato de deputado estadual do Rio de Janeiro pelo PDT e participa como membro voluntário do Conselho Administrativo do Comitê Organizador Local (COL) da Copa. Romário de Souza Faria, filiado ao PSB do Rio, está na Câmara dos Deputados, de onde tem vociferado contra a CBF e apelado à Fifa para intervir no COL. Ambos responderam a perguntas da PÁGIN22 por e-mail.
A realização da Copa e das Olimpíadas tem gerado tanto críticas quanto expectativas apaixonadas. Na sua opinião, qual será o legado desses dois eventos para o País?
Bebeto– Fora o orgulho e a alegria de sediar esses grandes eventos do esporte, o Brasil está tendo a chance de crescer em sua economia, de atrair mais turismo e comércio varejista, de abrir as portas para novos negócios. São oportunidades que precisam ser muito bem aproveitadas. Imagine só! Na Copa das Confederações, vamos receber executivos, formadores de opinião, empresários e compradores de redes de varejos de mais de 70 países.
A hora é agora para promovermos estratégias de relacionamentos e de grandes promoções comerciais. Vamos unir o útil ao agradável. Tem coisa melhor? Misturar o futebol, que é a nossa grande paixão, com o crescimento do País. E estamos trabalhando para isso. Temos investido em obras de melhoramento nos estádios e nas cidades em geral, para poder atender a demanda de estrangeiros durante essa festança. Aliás, obras que ficarão para os brasileiros após o torneio. Esses eventos são possibilidades de novos negócios em setores como madeira e móveis, comércio varejista, agronegócio, construção civil, turismo, economia, artesanato e tecnologia da informação. Gerando, assim, novos empregos, com reflexo direto no desenvolvimento do País.
Romário – Difícil falar em legado a um ano da competição, quando ainda não temos quase nada. Além dos estádios, o que ficará de infraestrutura para a população? Esta é uma pergunta que me faço diariamente. Entre uma reflexão e outra, as conclusões não são nada animadoras. O tão falado legado social para a população parece ter ficado só no papel. Quase todas as obras de transporte estão atrasadas, a inauguração de algumas, inclusive, já foi remarcada para ocorrer somente após o Mundial, e outras foram canceladas. Diante desse cenário, sem obras de mobilidade e com superfaturamento nos estádios, só nos resta o capital humano. O legado seria a qualificação dos nossos trabalhadores. Acho que os empresários têm esse importante papel no momento. Eles devem isso ao Brasil, já que serão os principais beneficiados com geração de receita, especialmente o setor de serviços.
Uma das críticas mais frequentes é a participação da CBF na organização. Há diferença entre o COL ser liderado pela confederação nacional de futebol e por uma comissão independente de ex-jogadores, como na Copa de 1998 na França?
Bebeto – Sou um ex-jogador de futebol e, por ter vivenciado essa experiência na pele, acredito que seja mais fácil a organização de uma Copa pela confederação do que por uma comissão que, às vezes, pode não ter muita ideia sobre fatores essenciais. Sou membro do COL, mas é importante frisar que sou voluntário. Abri mão de qualquer remuneração. Faço de coração, por amor. Mas, independentemente de serem jogadores ou não à frente do negócio, é preciso que as pessoas designadas sejam preparadas.
Romário – Infelizmente, no Brasil, o presidente da CBF [José Maria Marin] acabou acumulando essa função. Uma entidade em completo descrédito. Se houvesse uma pessoa séria à frente do COL, talvez não estivéssemos assistindo a tantos absurdos. Isso também daria mais crédito e abriria portas para negociações importantes. A presidente Dilma, por exemplo, não recebe o Marin.
A construção de estádios em cidades sem tradição esportiva também tem gerado polêmica. Seria possível fazer a Copa sem construir novos estádios?
Bebeto – Não. Alguns estádios não tinham estrutura para receber a Copa. E sabemos das exigências da Fifa.
Romário – A questão não é deixar de construir, mas construir estádios mais modestos. Pensando em seu uso no pós-Copa. Mas ficou muito claro que o brasileiro está pagando uma festa para a Fifa encher os bolsos e ir embora, sem pagar um imposto.
O futebol parece viver uma tendência de elitização. As classes mais populares estão sendo afastadas dos estádios?
Bebeto – Eu sou da turma que vê o futebol como esporte popular. Para mim, o preço dos ingressos tem de ser acessível.
Romário – Estamos assistindo a essa mudança. E o pior: quem mais gosta de futebol está sendo excluído dele. Acredito que, depois da Copa, os ingressos nessas arenas serão ainda mais caros, afinal, elas precisam de mais dinheiro para se pagar e se manter.
A ligação de José Maria Marin com a ditadura pode atrapalhar o brilho da Copa?
Bebeto– No momento, todos estão focados na Copa. Esse é o nosso maior objetivo.
Romário – Completamente. Olha que contraste: a presidenta Dilma foi vítima da ditadura, enquanto o presidente do COL era ligado à ala mais radical da ditadura. Não só isso, o Brasil vai receber outros chefes de Estado, e isso será um constrangimento para a nação.
Qual o risco de acontecer um novo Maracanazo em 2014?
Bebeto – Eu sempre penso positivo. Quero ver o Brasil chegar à final no nosso país. Já que não tive a felicidade de disputar uma Copa do Mundo em casa, eu torço para sermos campeões.
Romário – A grande diferença é que, naquela Copa, o Brasil era o predileto, havia toda uma expectativa em torno da Seleção, e nesta não é. Não sei nem se chega à final.
Leia mais:
“Não faz sentido O Brasil sediar a Copa”, diz Juca Kfouri em entrevista
O que fica para a pátria em chuteiras?