Acho que nunca se ouviu falar tanto do Brasil na Austrália tanto quanto nos últimos dias. Não por causa dos protestos que tomaram as ruas de várias cidades brasileiras, mas porque a seleção australiana se classificou para a Copa de 2014.
Futebol não é o esporte nacional, mas australiano que se preze é fanático por esporte e a cobertura da campanha da seleção – apelidada de “Socceroos”, uma mistura de “soccer” e “kangaroo” – é intensa.
Há também razões financeiras, como explica o jornal The Guardian. A FIFA dá milhões de dólares aos times que se qualificam para a Copa, além de pagar transporte e acomodação. As equipes que passam da primeira rodada levam mais uma bolada, a expectativa é que o time australiano receba pelo menos de 14 milhões de dólares só para aparecer na fita.
Além disso, há negócios lucrativos para os patrocinadores oficiais dos Socceroos, como a companhia aérea australiana Qantas – que em condições normais de temperatura e pressão não oferece vôos para o Brasil.
Os esportes favoritos dos australianos são “Aussie Rules” – jogado com mãos, pés e bola oval, foi inventado no século XIX para manter os jogadores de críquete em forma durante o inverno –, rúgbi e críquete.
O futebol como conhecemos no Brasil é em geral jogado por imigrantes. Mas quando se trata de Copa do Mundo, o país se une em torno dos Socceroos. “Pessoas que normalmente não pensariam duas vezes sobre futebol percebem que há uma festa global gigantesca envolvendo um time australiano, e querem participar”, diz o The Guardian.
É interessante que a Austrália esteja tão ligada no futebol justamente no momento em que o Brasil parece, pela primeira vez, colocar outras prioridades a frente do esporte nacional. “Nossos visitantes serão muito bem vindos a qualquer hora, mas estejam cientes de que nós rejeitamos a aparência de um país de futebol, samba e mulheres”, comentou uma leitora em matéria sobre os protestos no The New York Times.
Na Austrália, onde o engajamento político é baixo, assim como o conhecimento sobre os países da América Latina, a expectativa, pelo menos entre os fãs do futebol, parece ser a de que os protestos terão desaparecido daqui a um ano.
Uma agência de turismo australiana especializada em América Latina diz ter recebido pelo menos 300 consultas na última semana sobre viagens para ver a Copa no Brasil.
Estes protestos não estão fazendo a menor diferença para a decisão das pessoas de ir ou não ao Brasil”, disse à TV pública australiana Warren Livingstone, da agência The Fanatics, especializada em tours para levar fãs a grandes eventos internacionais. “As pessoas são espertas o suficiente para saber que quando chegar a hora da Copa tudo será bem diferente”.
Essa parece ser a aposta da FIFA, agências de turismo, companhias aéreas, patrocinadores e outras empresas envolvidas nos negócios milionários ligados ao futebol internacional.
No site Common Dreams, um leitor comentou em referência a um artigo sobre os protestos contra a Copa no Brasil:
“Os fãs do esporte se identificam com seu time e vão em massa apoiar algo que lhes dá uma sensação de comunidade e solidariedade sem realmente ameaçar o status quo. Se você já esteve em um estádio lotado, sabe a experiência febril, quase religiosa, que isso proporciona. Em última instância, tudo em nome do lucro.
Se pudéssemos ter o mesmo número de pessoas que vão aos estádios engajadas e presente em protestos, então teríamos uma democracia real”.
Nesse quesito, os últimos dias foram um belo 1 x 0 para o Brasil.