A tradição da teoria econômica neoclássica recomenda o crescimento econômico como o único meio de melhorar o bem-estar das pessoas, além de propagar ser uma via possível para se combater a pobreza e a miséria. Em síntese, pela economia tradicional basta fazer a atividade econômica produtiva se expandir – de preferência a taxas elevadas – que as oportunidades de melhoria logo estarão ao alcance de todos.
Para tanto, na busca desse crescimento “milagroso”, como é típico do modelo econômico expansionista, ignora-se que nas pontas inicial (extração) e final (entrega de dejetos) ocorrerá danos ambientais advindos da agressão patrocinada pela atividade humana sobre os principais serviços ecossistêmicos, desrespeitando as regras de regeneração e de conservação próprias da natureza.
Por sinal, o grande equívoco das economias modernas é justamente não saber respeitar os limites da capacidade de sustentação da Terra, menosprezando ao menos dois fatos: que os recursos ecológicos necessários para sustentar tal política de crescimento são de ordem finita; e que o sistema econômico não passa de um subsistema de algo maior, a biosfera.
Reside nisso a importância de se reverter esse modelo econômico em direção a uma estrutura econômica mais humana (longe da mecânica, próxima da termodinâmica), que seja ecologicamente equilibrada, que não sobrecarregue a base física da qual se retira o sustento da humanidade.
Assim, cria-se a possibilidade de atender as demandas dos menos privilegiados; dos milhões de seres humanos que se encontram excluídos da economia mundial, à margem do consumo, fora da vida econômico-produtiva.
Nesse sentido, o eixo dessa “nova economia” com característica mais humana e ambientalmente sustentável consiste em colocar, prioritariamente, as pessoas em primeiro lugar. Afinal, o que realmente importa em matéria de economia social e ecológica, pautada na busca do desenvolvimento sustentável (cuja essência é a inclusão dos excluídos) são as pessoas, convivendo num meio ambiente (biosfera) equilibrado e saudável.
Cabe ressaltar que o foco principal desse modelo diferenciado de se fazer economia reside em duas frentes:
1) Embasá-lo na cooperação (que soma e inclui), daí a importância de realçar as pessoas em primeiro lugar, e não na competição (que divide e exclui), por isso o mercado não deve ser privilegiado;
2) Reafirmar, de antemão, que somos dependentes da natureza, por isso é imprescindível preservar o clima, a biota, os recursos e os ecossistemas visando alcançar as condições de vida sustentável.
Nunca é demasiado aduzir, nesse pormenor, que a atividade produtiva é feita pelos homens e para os homens, contando inexoravelmente para isso com os serviços prestados pela natureza. Assim sendo, não é mais possível conceber uma economia dissociada da natureza; visto que não há atividade econômica e humana sem uso de água, energia, matéria, fotossíntese ou uso de solos e pradarias.
Para tanto se faz necessário desenvolver aspectos que permitam enxergar que o crescimento econômico – espécie de dogma central da economia convencional – deve ser visto tecnicamente apenas em termos quantitativos (entendendo que há limites para sua efetivação), enquanto que o desenvolvimento econômico responde pela possibilidade de se atingir o verdadeiro bem-estar; longe, portanto, do espectro materialista que faz a economia tradicional rezar a cartilha do crescimento.
Aceitar a premissa de que o fundamental é o desenvolvimento (e não o crescimento) é colocar a atividade econômica ao lado dos excluídos da economia, cujas cifras em escala mundial são escandalosamente acintosas: 1 bilhão de estômagos vazios; 1,5 bilhão de pessoas sem acesso à água potável; 19 crianças com menos de 5 anos de idade morrendo a cada cinco minutos vítima de pneumonia; 500 mil mães que morrem a cada ano na hora do parto devido a assistência médica insuficiente; 5 milhões de crianças que todos os anos não conseguem completar cinco anos de vida.
Nesse sentido, é imperioso reforçar a ideia que a economia tem todas as condições de executar um programa de recuperação social, desde que se rompa abruptamente com a prática dominante que insiste em medir a realidade social por números e valores monetários, como se a nossa vida se resumisse a mera questão quantitativa, expressa no corolário do crescimento econômico.
Urge mudar o eixo da economia tradicional reafirmando políticas públicas que coloquem as pessoas em primeiro lugar; afinal, o objetivo precípuo da atividade econômica é um só: dar resposta positiva à vida de todos nós. Isso só será possível quando houver a conciliação da economia com os princípios da ecologia (não ultrapassando as fronteiras ambientais), colocando as pessoas – e não o mercado – para pensar a organização socioeconômica em termos de seus fundamentos biofísicos, regendo as regras da vida social pautadas na sustentabilidade do desenvolvimento, e não do crescimento.
* Marcus Eduardo de Oliveira é economista e professor universitário. É especialista em Política Internacional e mestre em Estudos da América Latina pela Universidade de São Paulo (USP). É coloborador da Agência Zwela de Notícias (Angola) e do portal Notícias Lusófonas (Portugal). Autor dos livros “Conversando sobre Economia” e “Pensando como um economista”. prof.marcuseduardo@bol.com.br
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