Dá um prazer imenso ver as bicicletas do projeto de compartilhamento Bike Sampa em uso pelas ruas de São Paulo. Mas ele vem logo seguido de uma sensação de insegurança ao ver as magrelas negociando espaço nas ruas congestionadas da cidade com uma imensidão de carros e motos. E, com isso, segue a constatação de que a grande maioria dos usuários não usa capacete.
Na Austrália, onde moro, o uso do capacete é compulsório, mas em países que utilizam muito mais a bike como meio de transporte, como Holanda e Dinamarca, o mesmo não é verdade. E entre os grupos e cidadãos preocupados com o papel da bicicleta para a mobilidade urbana impera a polêmica sobre a necessidade ou não de exigir o uso de capacete. Melhor com ele ou sem ele?
A Austrália foi o primeiro país a requerer, em 1989, o uso obrigatório de capacete, seguido pela Nova Zelândia, em 1993. Outros países flertaram com legislação semelhante, mas optaram por não adotar a obrigação – nos EUA, alguns estados exigem o uso do equipamento e em vários países o capacete é obrigatório para crianças e jovens até 18 anos.
Os defensores do uso dizem que ele é a melhor chance de um ciclista sair vivo de acidentes envolvendo carros ou outros veículos mais pesados que a bike. Abundam na internet comentários de ciclistas contando a experiência de terem sido salvos pelo capacete.
Do outro lado, adversários da ideia defendem que a obrigatoriedade do capacete é uma das responsáveis pela noção de que andar de bicicleta na cidade é arriscado e lembram que a maior causa de mortes nas ruas são os acidentes automobilísticos. Eles citam dados mostrando que locais que adotaram a exigência de capacete – e mesmo aqueles que apenas recomendam seu uso – registraram queda significativa no uso da bike como meio de transporte.
Na Dinamarca, por exemplo, enquanto o mundo vivenciou um boom no uso das magrelas após a crise financeira iniciada em 2007, o número de pessoas pedalando em 2008 caiu. A explicação, segundo alguns, foi a campanha de grupos de pressão pelo uso do capacete como medida de segurança.
“Junto com a Holanda, a Dinamarca é o país mais seguro no mundo para andar de bicicleta”, escreveu o especialista em mobilidade urbana Mikael Colville-Andersen. “Por que não se divulga esse fato aos cidadãos? Se queremos reduzir os ferimentos nos ciclistas, deveríamos perseguir a causa do problema. Carros”.
Ele afirma que a comunidade científica está dividida ao meio quanto à performance do capacete na proteção dos ciclistas. “Se o capacete fosse uma vacina, não há chance de que seria aprovado pelas autoridades da Saúde”, compara, acrescentando que não há prova suficiente de que seja eficaz. Segundo Mikael, o capacete é desenhado para proteger somente a parte de cima da cabeça em acidentes que ocorrem a menos de 20 km por hora.
Outros adversários do capacete lembram que, mais importante do que seu uso, é a qualidade da infraestrutura disponível nas cidades, especialmente a existência de faixas exclusivas para bicicletas. Na Austrália, por exemplo, um relatório feito pelo último governo Trabalhista recomendou que todas as novas ruas e estradas incluam faixas protegidas paras os ciclistas, apontado que, além de mais segurança, há benefícios econômicos substantivos toda vez que um cidadão opta por usar a magrela para uma viagem de 20 minutos ou menos.
No meu dia-a-dia em Western Australia, onde a infraestrutura para as bicicletas é razoável – mas as ciclofaixas exclusivas, por exemplo, não são contínuas e não cobrem muitos bairros – fico contente em usar o capacete. Conheço várias pessoas, porém, que dizem a exigência os desencoraja de optar pela bike. A cidade de Fremantle, por exemplo, tenta obter uma exceção à lei para permitir que ciclistas não usem o capacete.
Em São Paulo, onde a infraestrutura para os que usam a bicicleta diariamente como meio de transporte deixa muito a desejar, a falta do capacete me dá arrepios. E você que conta com a magrela para ir e vir na cidade o que acha?