Dinheiro da área ambiental derrete, comprometendo a aprovação do projeto de lei sobre pagamento de serviços ambientais
Mais de cinco anos após enviar ao Congresso Nacional sua proposta para uma política de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), o governo federal ainda não sabe de onde sairá o dinheiro para alimentar o Fundo Federal de Pagamento por Serviços Ambientais (FunPSA). O fundo foi concebido pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), com anuência da Casa Civil, e incorporado no substitutivo sobre o PSA aprovado pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados em dezembro de 2010 [1].
[1] Substitutivo ao Projeto de Lei 792/2007, do deputado Anselmo de Jesus (PT-RO)
Propor novas despesas na área ambiental tornou-se assunto indigesto na administração da presidente Dilma
Rousseff, que promove uma sangria descomunal no orçamento do setor. Até setembro, o MMA gastara apenas 19% do orçamento autorizado para despesas discricionárias (que excluem gastos previdenciários e salários). “Esse é o fator que limita politicamente o Projeto de Lei (PL) do PSA. O Tesouro tem receio das implicações do PL para as finanças públicas. Por outro lado, sem mecanismos de financiamento claros, o PL pode ficar apenas no campo das intenções e nada acontecer”, comenta Virgílio Viana, superintendente-geral da Fundação Amazonas Sustentável (FAS). Para ter impacto, calcula o executivo da FAS, um sistema nacional de PSA deveria movimentar anualmente entre R$ 1 bilhão e R$ 2 bilhões.
A crise de credibilidade dos fundos ambientais também alimenta o ceticismo quanto à viabilidade do FunPSA, cuja principal fonte de recursos seria uma parcela de até 40% da fatia do MMA na participação especial do petróleo (PE). No ano passado, o MMA recebeu R$ 1,55 bilhão, equivalente aos 10% a que tem direito na PE, o que em tese lhe permitiria irrigar o FunPSA com até R$ 620 milhões. Mas o repasse da PE ao MMA foi extinto na negociação para a aprovação, em novembro de 2012, da Lei 12.734, que mudou as regras de distribuição dos royalties do petróleo. A modificação erodiu substancialmente a capacidade de investimento do MMA, sendo, ainda, um golpe no Fundo Clima (mais em “Decolagem Lenta“), que perdeu seu maior manancial de recursos – até 60% da PE destinada ao MMA, o equivalente a até R$ 931 milhões no ano passado [2]. O quadro só não azedou de vez ainda, porque a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia suspendeu provisoriamente as novas regras [3]. Contudo, a medida cautelar da ministra pode ser derrubada a qualquer momento por seus colegas.
[2] Os balanços trimestrais da participação especial podem ser consultados aqui
[3] Veja mais detalhes sobre o assunto
“Enquanto não for assunto de ministro, a tramitação do PSA continuará lenta na Câmara. O PSA deveria ser tratado como tema prioritário, mas no bojo de um pacote de instrumentos econômicos para acelerar a transição para uma economia de baixo carbono, sobretudo por meio de incentivos fiscais”, recomenda André Lima, pesquisador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam).
Na versão ora em discussão na Câmara, os provedores ficam isentos do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Lima defende a extensão dos incentivos aos pagadores dos serviços ambientais. “Estímulos fiscais atrairiam recursos do setor privado tanto para alimentar fundos ambientais que financiam o PSA, como para aumentar a escala dos projetos”, justifica. O assunto, porém, também continua indefinido na área econômica e na Casa Civil.
O substitutivo ao PL 792/1997 encontra-se na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara desde 2011. Seu relator na comissão, o deputado Arnaldo Jardim (PPS-SP), tem realizado inúmeras reuniões com entidades empresariais, ambientalistas, pesquisadores e técnicos dos ministérios da Fazenda, do Planejamento e do Meio Ambiente. A falta de recurso para implementar a lei do PSA é o maior enrosco do projeto, mas há outros obstáculos a serem superados para que a proposta alce voo para a Comissão de Constituição e Justiça e de lá ao Senado.
Entre os impasses, um dos que mais dividem opiniões refere-se às áreas elegíveis para o PSA. O deputado Jardim acredita que os fundos públicos não deveriam ser aplicados em PSA de áreas de preservação permanente (APPs). Argumenta que recuperar e manter uma APP é uma obrigação prevista no Código Florestal. Portanto, os fundos deveriam remunerar serviços ambientais prestados em áreas adicionais às APPs. Mas há estados, como o Espírito Santo, onde o PSA se baseia quase que exclusivamente na preservação de áreas de APP vinculadas aos recursos hídricos, lembra Ziraldo dos Santos, assessor do PPS. “Se o deputado coloca na lei, de forma bem clara, que só se paga a conservação que exceder os limites estabelecidos pela lei, já crio um problema seriíssimo no estado. Então, é preciso dialogar também com o estados”, pondera Santos (veja aqui a relação das legislações estaduais e municipais de PSA no Brasil).
A elegibilidade de APPs e RL também se encontra sob discussão entre os três ministérios diretamente vinculados à negociação entre o Executivo e o Congresso Nacional em torno do PL do PSA. “Há uma dúvida jurídica sobre a remuneração de áreas de restrição legal com recursos públicos”, conta Renato Rosenberg, coordenador-geral do Programa Nacional de Meio Ambiente (PNMA). De qualquer forma, é consenso no governo que os fundos públicos devam ser destinados às áreas prioritárias para a conservação. “Se muitas APPs são prioritárias, o governo não deveria apoiar financeiramente os produtores que as mantivessem bem cuidadas?”, indaga Rosenberg.
(Colaborou Magali Cabral)
Leia mais:
Climatoscope 2013 divulga países que mais atraem investimentos em renováveis, em “Brasil lidera ranking de renováveis”
[:en]Dinheiro da área ambiental derrete, comprometendo a aprovação do projeto de lei sobre pagamento de serviços ambientaisMais de cinco anos após enviar ao Congresso Nacional sua proposta para uma política de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), o governo federal ainda não sabe de onde sairá o dinheiro para alimentar o Fundo Federal de Pagamento por Serviços Ambientais (FunPSA). O fundo foi concebido pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), com anuência da Casa Civil, e incorporado no substitutivo sobre o PSA aprovado pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados em dezembro de 2010 [1].
[1] Substitutivo ao Projeto de Lei 792/2007, do deputado Anselmo de Jesus (PT-RO)
Propor novas despesas na área ambiental tornou-se assunto indigesto na administração da presidente Dilma
Rousseff, que promove uma sangria descomunal no orçamento do setor. Até setembro, o MMA gastara apenas 19% do orçamento autorizado para despesas discricionárias (que excluem gastos previdenciários e salários). “Esse é o fator que limita politicamente o Projeto de Lei (PL) do PSA. O Tesouro tem receio das implicações do PL para as finanças públicas. Por outro lado, sem mecanismos de financiamento claros, o PL pode ficar apenas no campo das intenções e nada acontecer”, comenta Virgílio Viana, superintendente-geral da Fundação Amazonas Sustentável (FAS). Para ter impacto, calcula o executivo da FAS, um sistema nacional de PSA deveria movimentar anualmente entre R$ 1 bilhão e R$ 2 bilhões.
A crise de credibilidade dos fundos ambientais também alimenta o ceticismo quanto à viabilidade do FunPSA, cuja principal fonte de recursos seria uma parcela de até 40% da fatia do MMA na participação especial do petróleo (PE). No ano passado, o MMA recebeu R$ 1,55 bilhão, equivalente aos 10% a que tem direito na PE, o que em tese lhe permitiria irrigar o FunPSA com até R$ 620 milhões. Mas o repasse da PE ao MMA foi extinto na negociação para a aprovação, em novembro de 2012, da Lei 12.734, que mudou as regras de distribuição dos royalties do petróleo. A modificação erodiu substancialmente a capacidade de investimento do MMA, sendo, ainda, um golpe no Fundo Clima (mais em “Decolagem Lenta“), que perdeu seu maior manancial de recursos – até 60% da PE destinada ao MMA, o equivalente a até R$ 931 milhões no ano passado [2]. O quadro só não azedou de vez ainda, porque a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia suspendeu provisoriamente as novas regras [3]. Contudo, a medida cautelar da ministra pode ser derrubada a qualquer momento por seus colegas.
[2] Os balanços trimestrais da participação especial podem ser consultados aqui
[3] Veja mais detalhes sobre o assunto
“Enquanto não for assunto de ministro, a tramitação do PSA continuará lenta na Câmara. O PSA deveria ser tratado como tema prioritário, mas no bojo de um pacote de instrumentos econômicos para acelerar a transição para uma economia de baixo carbono, sobretudo por meio de incentivos fiscais”, recomenda André Lima, pesquisador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam).
Na versão ora em discussão na Câmara, os provedores ficam isentos do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Lima defende a extensão dos incentivos aos pagadores dos serviços ambientais. “Estímulos fiscais atrairiam recursos do setor privado tanto para alimentar fundos ambientais que financiam o PSA, como para aumentar a escala dos projetos”, justifica. O assunto, porém, também continua indefinido na área econômica e na Casa Civil.
O substitutivo ao PL 792/1997 encontra-se na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara desde 2011. Seu relator na comissão, o deputado Arnaldo Jardim (PPS-SP), tem realizado inúmeras reuniões com entidades empresariais, ambientalistas, pesquisadores e técnicos dos ministérios da Fazenda, do Planejamento e do Meio Ambiente. A falta de recurso para implementar a lei do PSA é o maior enrosco do projeto, mas há outros obstáculos a serem superados para que a proposta alce voo para a Comissão de Constituição e Justiça e de lá ao Senado.
Entre os impasses, um dos que mais dividem opiniões refere-se às áreas elegíveis para o PSA. O deputado Jardim acredita que os fundos públicos não deveriam ser aplicados em PSA de áreas de preservação permanente (APPs). Argumenta que recuperar e manter uma APP é uma obrigação prevista no Código Florestal. Portanto, os fundos deveriam remunerar serviços ambientais prestados em áreas adicionais às APPs. Mas há estados, como o Espírito Santo, onde o PSA se baseia quase que exclusivamente na preservação de áreas de APP vinculadas aos recursos hídricos, lembra Ziraldo dos Santos, assessor do PPS. “Se o deputado coloca na lei, de forma bem clara, que só se paga a conservação que exceder os limites estabelecidos pela lei, já crio um problema seriíssimo no estado. Então, é preciso dialogar também com o estados”, pondera Santos (veja aqui a relação das legislações estaduais e municipais de PSA no Brasil).
A elegibilidade de APPs e RL também se encontra sob discussão entre os três ministérios diretamente vinculados à negociação entre o Executivo e o Congresso Nacional em torno do PL do PSA. “Há uma dúvida jurídica sobre a remuneração de áreas de restrição legal com recursos públicos”, conta Renato Rosenberg, coordenador-geral do Programa Nacional de Meio Ambiente (PNMA). De qualquer forma, é consenso no governo que os fundos públicos devam ser destinados às áreas prioritárias para a conservação. “Se muitas APPs são prioritárias, o governo não deveria apoiar financeiramente os produtores que as mantivessem bem cuidadas?”, indaga Rosenberg.
(Colaborou Magali Cabral)
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