Ao cruzar três estudos conceituados, PÁGINA22 destaca cinco focos de atenção para este e os próximos anos
Prever o futuro da humanidade não é tarefa simples, tampouco exata, mas identificar tendências é absolutamente possível. PÁGINA22 selecionou três estudos de instituições conceituadas, cruzou seus dados e destacou cinco assuntos quentes que constam nos três documentos.
Um dos relatórios escolhidos é o Outlook on the Global Agenda 2014, elaborado pelo Conselho da Agenda Global do Fórum Econômico Mundial em parceria com a Saïd Business School da Universidade de Oxford, no Reino Unido, e o think tank americano Pew Research Center. Foram ouvidos para o levantamento mais de 1.500 especialistas em negócios, de governos, universidades e sociedade civil de 112 países para saber quais eram os temas mais urgentes deste ano e seus impactos nos próximos.
A Universidade de Oxford também está ligada a outro relatório consultado. Sua Comissão Oxford Martin para Futuras Gerações produziu o Now for the Long Term, que destaca o atual momento pós-crise financeira de 2008 como hora de abandonar de vez o olhar de curto prazo. Por último, o Trend Compendium 2030, da consultoria Roland Berger Strategy, descreve sete megatendências que moldarão o mundo nos próximos 20 anos e como viveremos até lá.
As 303 páginas analisadas mostram claramente como todas essas questões são interdependentes e que a prosperidade no futuro depende da preocupação com o longo prazo – ideia que parece óbvia, mas que ações de setores públicos e privados nem sempre levam em consideração.
DEMOGRAFIA
UM MUNDO MAIS VELHO E URBANO
No início do século XX, havia na Terra 1,6 bilhão de pessoas. Pouco mais de 100 anos depois, em 2011, chegamos a 7 bilhões e, seguindo a projeção, em 2050 viveremos ao lado de outros 9 bilhões. Até lá, a população da terceira idade aumentará consideravelmente: uma em cada cinco pessoas terá 60 anos ou mais. E as cidades crescerão 7,8% mais do que nos últimos 20 anos.
Com taxas de fertilidade em queda e a expectativa de vida em alta, a média de idade da população tende a subir dos 29 anos atuais para 34 anos até 2030. Nos países desenvolvidos, a maioria da população estará acima dos 60 anos. E a cidade de São Paulo também deverá seguir essa tendência. Em janeiro, uma projeção da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade) indicou que, em 20 anos, haverá mais idosos (20,1% da população) do que jovens (13,18%) na capital.
Esse cenário ocasionará uma pressão ainda mais alarmante que a existente hoje no sistema previdenciário, com o número de trabalhadores menor que o de aposentados. Os sistemas de saúde também sentirão um impacto com a maior incidência de doenças ligadas ao envelhecimento, como as degenerativas.
A população dos países em desenvolvimento crescerá 7 vezes mais rapidamente que a dos desenvolvidos
A terceira idade será bem diferente no decorrer do século, aposta o Trend Compendium 2030. As pessoas terão melhor saúde e disposição física e os padrões de consumo serão outros. “Alguém aos 70 anos estará planejando a compra do próximo carro e outra de 60 estará pensando na compra da casa própria”, exemplifica o documento.
Se a cidade de Tóquio fosse considerada um país, em 2015 estaria na 31ª posição em número de habitantes
Já o relatório Now for the Long Term destaca a importância de lidar com essas mudanças que requerem “escolhas difíceis e põem à prova a capacidade governamental para fornecer cuidados básicos de assistência médica e outros serviços”. Esse desafio de governos e do setor privado aumenta quando é levado em conta o inchaço no número de moradores.
O movimento de urbanização, que hoje já é intenso, chegará a níveis ainda maiores: em 2030, 59% das pessoas estarão morando existirão megacidades[1]. Atualmente registram-se 22. Muitos desses grandes centros urbanos estarão nos países emergentes, fenômeno explicado a seguir no tópico “Geopolítica”.
[1] Aglomeração urbana com mais de 10 milhões de habitantes e que, no geral, passou por rápido processo de urbanização
GEOPOLÍTICA
NOVA ORDEM MUNDIAL
Nas próximas décadas, haverá uma mudança significativa na geopolítica do mundo, em razão da ascensão econômica de países emergentes, principalmente dos Brics – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul –, que terão grande crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), da participação em exportações e uma classe média preponderante.
Essas nações ganharão relevância no cenário mundial, com destaque para a China, que ultrapassará os Estados Unidos na posição de maior potencia econômica.
Há outros países que chamam atenção em decorrência da economia promissora, os denominados “Próximos Onze”: Bangladesh, Egito, Indonésia, Irã, México, Nigéria, Paquistão, Filipinas, Coreia do Sul, Turquia e Vietnã. Segundo o banco de investimento Goldman Sachs, são nações com potencial para figurar entre as maiores economias do mundo, ao lado dos Brics.
Para o Now for the Long Term, essa nova ordem mundial trará desafios inéditos, principalmente em relação às instituições de governança global que “operam em regime da geopolítica do século XX”, quando Europa e Estados Unidos eram as principais potências econômicas. O futuro demanda uma participação proporcional dos emergentes, por exemplo, no Conselho de Segurança da ONU.
Em 1990, Brasil, Rússia, China e Índia movimentavam juntos 5,8% das exportações mundiais e devem alcançar 23% em 2030. China e Índia se tornarão os fornecedores de bens e serviços dominantes. Essa nova configuração e distribuição das exportações levará a uma economia mundial mais integrada, com mais trocas de produtos e serviços, além de empresas com bases em diversas nações. Seremos um planeta ainda mais globalizado, apostam os pesquisadores
Classe média em expansão
Nos emergentes, a base da pirâmide socioeconômica se transformará em uma grande e potente classe média[2]. Projeções indicam que os Brics e os Próximos Onze dobrarão sua participação no consumo de bens e serviços.
[2] Segundo a definição do Goldman Sachs, é composta pelos cidadãos com rendimento anual entre US$ 6 mil e US$ 30 mil
De 2010 a 2030, os Brics verão sua classe média crescer em 150% e os Próximos Onze, em 120%. Na Índia, 850 milhões de cidadãos estarão nessa faixa socioeconômica (57% da população do país). E o maior percentual dentro de uma nação estará no Egito: em 20 anos, 83% dos egípcios pertencerão a essa classe. Já o aumento no Brasil deve ser mais sutil, de 47% de seus habitantes, como é hoje, para 58% (127 milhões de pessoas).
Nesse cenário, caberá às empresas suprir as necessidades desses novos consumidores e, também das classes mais baixas, que no cenário de prosperidade nacional, poderão emergir à classe média, destaca o Outlook on the Global Agenda 2014.
Um dos exemplos é a Unilever, que se tornou líder no mercado de xampu na zona rural indiana com um produto que funciona melhor com água fria e é vendido por preços mais acessíveis em pacotes pequenos.
O Now for the Long Term ressalta que essa nova classe socioeconômica pode ser o impulso que faltava para um crescimento global mais equilibrado. O consumo aumentará, mas também poderá haver mais investimentos em saúde, educação e energia renovável, com maior produtividade e as condições para um desenvolvimento sustentável.
RECURSOS NATURAIS
CONSUMO AUMENTARÁ, GERANDO ESCASSEZ
O consumo de água, minerais e energia está aumentando de forma rápida e constante e não há otimismo quanto aos estoques de recursos do planeta. O relatório Trend Compendium 2030 é enfático: recursos naturais serão escassos e caros no fim da década de 2020, o que requer soluções inteligentes e imediatas por parte dos governos e da iniciativa privada.
Até 2030, a demanda mundial por energia primária crescerá 26% e por água, 53%. Essa escassez impactará também a produção de alimentos, que consome um terço da energia primária [3] e 70% da água disponível globalmente. O aumento da produtividade e o fim do desperdício, portanto, devem ser priorizados.
[3]É aquela obtida de forma direta de sua fonte natural, como o petróleo, carvão, o sol e os ventos
O Now for the Long Term sugere que os setores público e privado compartilhem os conhecimentos que detêm sobre tecnologias, redução de desperdício, produção agrícola e eficiência energética.
No cenário previsto pelo Trend Compendium 2030, o petróleo deve permanecer como o principal recurso, mas haverá uma redistribuição entre as fontes na matriz energética. Hoje, 35% da energia mundial (primária) vêm do petróleo e 10%, das renováveis. Para 2030, o petróleo deverá ter participação um pouco menor, de 30%, enquanto as renováveis ampliarão sua fatia para 13%.
Biocombustíveis e gás de folhelho (shale gas, em inglês, erroneamente conhecido como gás de xisto) são vistos como possíveis saídas para atender ao aumento da demanda, mas ambos ainda enfrentam incertezas quanto à sua viabilidade.
O Global Outlook Agenda 2014 aponta o gás de folhelho como um tema quente para este ano, com desdobramentos ao longo da década. Nobuo Tanaka, membro do Conselho da Agenda Global (que elaborou o estudo) na área de Segurança Energética, afirma que esse gás “tem o potencial de desencadear uma revolução no cenário global de energia”, por estar disponível em várias regiões e acabar com a concentração da produção em poucos países, como acontece com o petróleo. Mas, antes disso, as tecnologias precisam ser aperfeiçoadas para uma exploração realmente segura.
Dois em cada três países estarão sob estresse hídrico em 2025
O Now for the Long Term calcula que o caminho para a energia de matrizes renováveis, como o vento e o sol, demandará investimentos entre US$ 48 bilhões e US$ 80 bilhões por ano nas próximas duas décadas. Enquanto isso, hoje, os subsídios ao petróleo somam US$ 1,9 trilhão ao ano em todo o mundo, segundo dados do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Demanda por energia e uso de combustíveis fósseis crescerão até 50% em 2030
Os autores do relatório ainda criticam a falta de uma visão sistêmica dos formuladores de políticas públicas e de acadêmicos que “têm tratado água, energia e alimentos separadamente, com governança e pesquisas isoladas de forma inútil”. E completam dizendo que a ausência de uma coordenação entre políticas que impactem na energia, água, uso da terra, oceanos, serviços ecossistêmicos e biodiversidade é uma barreira à oferta segura desses recursos no futuro.
CLIMA
AQUECIMENTO GLOBAL, O TIRO NO PÉ
A falta de ações em relação à mudança climática está em quinto lugar na lista de dez tendências que devem ser olhadas de perto, segundo o Outlook on the Global Agenda 2014. E foi a mais apontada pela sua pesquisa de opinião como tema tratado com menos eficácia (27% dos respondentes a apontaram).
Segundo Christiana Figueres, secretária da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês), que escreve no relatório, as medidas são urgentes. “Se não agirmos em tempo hábil e na escala que precisamos, o aquecimento global tem potencial para acabar com o progresso dos últimos 20 anos no desenvolvimento econômico e social e na proteção do meio ambiente”, alerta.
Com 2 graus a mais, até 30% das espécies de animais e plantas estariam em risco de extinção
Em janeiro, o Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC) divulgou mais informações sobre seu próximo e quinto relatório. Os 15 anos daqui em diante serão cruciais para evitar um desastre causado pelo aumento de temperaturas. Nesse período, são necessários grandes investimentos em reduções de emissões, em energias limpas (estimam-se US$ 147 bilhões por ano) e em soluções tecnológicas para tirar o excesso de gás carbônico do planeta.
As concentrações de CO2 na atmosfera hoje são 40% maiores do que na era pré-industrial. Adiar a mitigação até 2030 aumentará os desafios e reduzirá as opções, alerta o sumário do documento.
O IPCC adverte ainda que as emissões anuais de carbono devem ser reduzidas entre 40% e 70% até 2050 para que a temperatura na Terra suba no máximo 2 graus – o que para a ONU seria o teto que poderíamos suportar com menos prejuízos à vida no planeta.
Dados do Trend Compendium 2030 apontam, no entanto, que só as emissões vindas da queima de combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás natural) aumentarão em até
16% anualmente.
No cenário mais otimista traçado pelo IPCC, a Terra ficará 1,7 grau mais quente até 2100. Mas, mesmo que reduzamos as emissões, os gases-estufa já estão em excesso na atmosfera e devem causar danos, como o aumento dos eventos extremos e no nível do mar.
Diante desse quadro, o Now for the Long Term propõe ações para a mitigação imediata. Uma delas seria o “intercâmbio e colaboração internacional”: incentivos de crédito e investimentos em infraestrutura de energia limpa para os países pobres e em desenvolvimento. A UNFCCC estima que, nos próximos 15 anos, esses países precisarão de até US$ 67 bilhões para medidas de adaptação.
TECNOLOGIAS
DISSEMINAÇÃO DOS APARELHOS E DA INTERNET
Ao andar em uma grande cidade, é só olhar ao redor para ver como celulares estão presentes. É bem provável que você veja muitas pessoas – se não a maioria – conversando, enviando mensagens ou navegando na web pelos aparelhos. A disseminação das tecnologias e da internet em todo o mundo é uma das tendências com números que impressionam. E elas revolucionam cada vez mais a forma como conduzimos nossas vidas e como as sociedades são regidas.
Em 2020, estima-se em 4 bilhões o número de usuários da web, conectados em 31 bilhões de dispositivos. O desempenho de tecnologias também crescerá. A velocidade média da banda larga partirá do 1 megabyte por segundo que temos hoje para mais de 100 megabytes por segundo em 2030.
Em 2030, serão trocados pela web 50 trilhões de gigabytes de dados
Para os países pobres e em desenvolvimento, os ganhos com o acesso a aparelhos e à internet são essenciais para melhorar a situação econômica. Tanto que, segundo declaração do vice-secretário-geral da ONU, Jan Eliasson, em março de 2013, novas tecnologias da informação estão atingindo os países pobres mais rapidamente do que comida e banheiros. Um relatório da ONU indicou que hoje 6 bilhões de pessoas possuem celulares, enquanto apenas 4,5 bilhões têm acesso a instalações sanitárias adequadas.
O documento Trend Compendium 2030 destaca que a propagação das tecnologias relaciona-se intimamente com a renda financeira. “À medida que a economia mundial cresce e os países ficam mais ricos, a difusão de tecnologias se acelera. Essa difusão, por sua vez, provoca aumento de produtividade de um país, resultando em crescimento econômico mais forte”, diz um dos trechos. Segundo o relatório, os celulares influenciam até mesmo o crescimento do PIB nacional, pois é por meio dele que um cidadão acessa mais pessoas, informações e ganha facilidade nas atividades financeiras.
Hoje, 1% da população mundial acessa a internet apenas pelo celular. Em 20 anos, o índice saltará para 60%
O Now for the Long Term também sublinha que novas tecnologias oferecem potencial para aumentar as oportunidades de educação, melhorar drasticamente os resultados de saúde, promover a liberdade de expressão e da democracia.
Dos dez tópicos[4] do Outlook on the Global Agenda 2014, dois estão ligados às tecnologias, mas de modo mais cético: a intensificação das ameaças cibernéticas, como roubo de dados, e a forma como informações erradas ou boatos se espalham rapidamente pela web.”
[4] Os outros são: aumento das tensões sociais no Oriente Médio e Norte da África; aumento da desigualdade de renda; persistência do desemprego estrutural; inação em relação ao aquecimento global; diminuição de confiança em políticas econômicas; falta de valores na liderança; expansão da classe média na Ásia; e aumento da importância das megacidades
[:en]Ao cruzar três estudos conceituados, PÁGINA22 destaca cinco focos de atenção para este e os próximos anos
Prever o futuro da humanidade não é tarefa simples, tampouco exata, mas identificar tendências é absolutamente possível. PÁGINA22 selecionou três estudos de instituições conceituadas, cruzou seus dados e destacou cinco assuntos quentes que constam nos três documentos.
Um dos relatórios escolhidos é o Outlook on the Global Agenda 2014, elaborado pelo Conselho da Agenda Global do Fórum Econômico Mundial em parceria com a Saïd Business School da Universidade de Oxford, no Reino Unido, e o think tank americano Pew Research Center. Foram ouvidos para o levantamento mais de 1.500 especialistas em negócios, de governos, universidades e sociedade civil de 112 países para saber quais eram os temas mais urgentes deste ano e seus impactos nos próximos.
A Universidade de Oxford também está ligada a outro relatório consultado. Sua Comissão Oxford Martin para Futuras Gerações produziu o Now for the Long Term, que destaca o atual momento pós-crise financeira de 2008 como hora de abandonar de vez o olhar de curto prazo. Por último, o Trend Compendium 2030, da consultoria Roland Berger Strategy, descreve sete megatendências que moldarão o mundo nos próximos 20 anos e como viveremos até lá.
As 303 páginas analisadas mostram claramente como todas essas questões são interdependentes e que a prosperidade no futuro depende da preocupação com o longo prazo – ideia que parece óbvia, mas que ações de setores públicos e privados nem sempre levam em consideração.
DEMOGRAFIA
UM MUNDO MAIS VELHO E URBANO
No início do século XX, havia na Terra 1,6 bilhão de pessoas. Pouco mais de 100 anos depois, em 2011, chegamos a 7 bilhões e, seguindo a projeção, em 2050 viveremos ao lado de outros 9 bilhões. Até lá, a população da terceira idade aumentará consideravelmente: uma em cada cinco pessoas terá 60 anos ou mais. E as cidades crescerão 7,8% mais do que nos últimos 20 anos.
Com taxas de fertilidade em queda e a expectativa de vida em alta, a média de idade da população tende a subir dos 29 anos atuais para 34 anos até 2030. Nos países desenvolvidos, a maioria da população estará acima dos 60 anos. E a cidade de São Paulo também deverá seguir essa tendência. Em janeiro, uma projeção da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade) indicou que, em 20 anos, haverá mais idosos (20,1% da população) do que jovens (13,18%) na capital.
Esse cenário ocasionará uma pressão ainda mais alarmante que a existente hoje no sistema previdenciário, com o número de trabalhadores menor que o de aposentados. Os sistemas de saúde também sentirão um impacto com a maior incidência de doenças ligadas ao envelhecimento, como as degenerativas.
A população dos países em desenvolvimento crescerá 7 vezes mais rapidamente que a dos desenvolvidos
A terceira idade será bem diferente no decorrer do século, aposta o Trend Compendium 2030. As pessoas terão melhor saúde e disposição física e os padrões de consumo serão outros. “Alguém aos 70 anos estará planejando a compra do próximo carro e outra de 60 estará pensando na compra da casa própria”, exemplifica o documento.
Se a cidade de Tóquio fosse considerada um país, em 2015 estaria na 31ª posição em número de habitantes
Já o relatório Now for the Long Term destaca a importância de lidar com essas mudanças que requerem “escolhas difíceis e põem à prova a capacidade governamental para fornecer cuidados básicos de assistência médica e outros serviços”. Esse desafio de governos e do setor privado aumenta quando é levado em conta o inchaço no número de moradores.
O movimento de urbanização, que hoje já é intenso, chegará a níveis ainda maiores: em 2030, 59% das pessoas estarão morando existirão megacidades[1]. Atualmente registram-se 22. Muitos desses grandes centros urbanos estarão nos países emergentes, fenômeno explicado a seguir no tópico “Geopolítica”.
[1] Aglomeração urbana com mais de 10 milhões de habitantes e que, no geral, passou por rápido processo de urbanização
GEOPOLÍTICA
NOVA ORDEM MUNDIAL
Nas próximas décadas, haverá uma mudança significativa na geopolítica do mundo, em razão da ascensão econômica de países emergentes, principalmente dos Brics – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul –, que terão grande crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), da participação em exportações e uma classe média preponderante.
Essas nações ganharão relevância no cenário mundial, com destaque para a China, que ultrapassará os Estados Unidos na posição de maior potencia econômica.
Há outros países que chamam atenção em decorrência da economia promissora, os denominados “Próximos Onze”: Bangladesh, Egito, Indonésia, Irã, México, Nigéria, Paquistão, Filipinas, Coreia do Sul, Turquia e Vietnã. Segundo o banco de investimento Goldman Sachs, são nações com potencial para figurar entre as maiores economias do mundo, ao lado dos Brics.
Para o Now for the Long Term, essa nova ordem mundial trará desafios inéditos, principalmente em relação às instituições de governança global que “operam em regime da geopolítica do século XX”, quando Europa e Estados Unidos eram as principais potências econômicas. O futuro demanda uma participação proporcional dos emergentes, por exemplo, no Conselho de Segurança da ONU.
Em 1990, Brasil, Rússia, China e Índia movimentavam juntos 5,8% das exportações mundiais e devem alcançar 23% em 2030. China e Índia se tornarão os fornecedores de bens e serviços dominantes. Essa nova configuração e distribuição das exportações levará a uma economia mundial mais integrada, com mais trocas de produtos e serviços, além de empresas com bases em diversas nações. Seremos um planeta ainda mais globalizado, apostam os pesquisadores
Classe média em expansão
Nos emergentes, a base da pirâmide socioeconômica se transformará em uma grande e potente classe média[2]. Projeções indicam que os Brics e os Próximos Onze dobrarão sua participação no consumo de bens e serviços.
[2] Segundo a definição do Goldman Sachs, é composta pelos cidadãos com rendimento anual entre US$ 6 mil e US$ 30 mil
De 2010 a 2030, os Brics verão sua classe média crescer em 150% e os Próximos Onze, em 120%. Na Índia, 850 milhões de cidadãos estarão nessa faixa socioeconômica (57% da população do país). E o maior percentual dentro de uma nação estará no Egito: em 20 anos, 83% dos egípcios pertencerão a essa classe. Já o aumento no Brasil deve ser mais sutil, de 47% de seus habitantes, como é hoje, para 58% (127 milhões de pessoas).
Nesse cenário, caberá às empresas suprir as necessidades desses novos consumidores e, também das classes mais baixas, que no cenário de prosperidade nacional, poderão emergir à classe média, destaca o Outlook on the Global Agenda 2014.
Um dos exemplos é a Unilever, que se tornou líder no mercado de xampu na zona rural indiana com um produto que funciona melhor com água fria e é vendido por preços mais acessíveis em pacotes pequenos.
O Now for the Long Term ressalta que essa nova classe socioeconômica pode ser o impulso que faltava para um crescimento global mais equilibrado. O consumo aumentará, mas também poderá haver mais investimentos em saúde, educação e energia renovável, com maior produtividade e as condições para um desenvolvimento sustentável.
RECURSOS NATURAIS
CONSUMO AUMENTARÁ, GERANDO ESCASSEZ
O consumo de água, minerais e energia está aumentando de forma rápida e constante e não há otimismo quanto aos estoques de recursos do planeta. O relatório Trend Compendium 2030 é enfático: recursos naturais serão escassos e caros no fim da década de 2020, o que requer soluções inteligentes e imediatas por parte dos governos e da iniciativa privada.
Até 2030, a demanda mundial por energia primária crescerá 26% e por água, 53%. Essa escassez impactará também a produção de alimentos, que consome um terço da energia primária [3] e 70% da água disponível globalmente. O aumento da produtividade e o fim do desperdício, portanto, devem ser priorizados.
[3]É aquela obtida de forma direta de sua fonte natural, como o petróleo, carvão, o sol e os ventos
O Now for the Long Term sugere que os setores público e privado compartilhem os conhecimentos que detêm sobre tecnologias, redução de desperdício, produção agrícola e eficiência energética.
No cenário previsto pelo Trend Compendium 2030, o petróleo deve permanecer como o principal recurso, mas haverá uma redistribuição entre as fontes na matriz energética. Hoje, 35% da energia mundial (primária) vêm do petróleo e 10%, das renováveis. Para 2030, o petróleo deverá ter participação um pouco menor, de 30%, enquanto as renováveis ampliarão sua fatia para 13%.
Biocombustíveis e gás de folhelho (shale gas, em inglês, erroneamente conhecido como gás de xisto) são vistos como possíveis saídas para atender ao aumento da demanda, mas ambos ainda enfrentam incertezas quanto à sua viabilidade.
O Global Outlook Agenda 2014 aponta o gás de folhelho como um tema quente para este ano, com desdobramentos ao longo da década. Nobuo Tanaka, membro do Conselho da Agenda Global (que elaborou o estudo) na área de Segurança Energética, afirma que esse gás “tem o potencial de desencadear uma revolução no cenário global de energia”, por estar disponível em várias regiões e acabar com a concentração da produção em poucos países, como acontece com o petróleo. Mas, antes disso, as tecnologias precisam ser aperfeiçoadas para uma exploração realmente segura.
Dois em cada três países estarão sob estresse hídrico em 2025
O Now for the Long Term calcula que o caminho para a energia de matrizes renováveis, como o vento e o sol, demandará investimentos entre US$ 48 bilhões e US$ 80 bilhões por ano nas próximas duas décadas. Enquanto isso, hoje, os subsídios ao petróleo somam US$ 1,9 trilhão ao ano em todo o mundo, segundo dados do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Demanda por energia e uso de combustíveis fósseis crescerão até 50% em 2030
Os autores do relatório ainda criticam a falta de uma visão sistêmica dos formuladores de políticas públicas e de acadêmicos que “têm tratado água, energia e alimentos separadamente, com governança e pesquisas isoladas de forma inútil”. E completam dizendo que a ausência de uma coordenação entre políticas que impactem na energia, água, uso da terra, oceanos, serviços ecossistêmicos e biodiversidade é uma barreira à oferta segura desses recursos no futuro.
CLIMA
AQUECIMENTO GLOBAL, O TIRO NO PÉ
A falta de ações em relação à mudança climática está em quinto lugar na lista de dez tendências que devem ser olhadas de perto, segundo o Outlook on the Global Agenda 2014. E foi a mais apontada pela sua pesquisa de opinião como tema tratado com menos eficácia (27% dos respondentes a apontaram).
Segundo Christiana Figueres, secretária da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês), que escreve no relatório, as medidas são urgentes. “Se não agirmos em tempo hábil e na escala que precisamos, o aquecimento global tem potencial para acabar com o progresso dos últimos 20 anos no desenvolvimento econômico e social e na proteção do meio ambiente”, alerta.
Com 2 graus a mais, até 30% das espécies de animais e plantas estariam em risco de extinção
Em janeiro, o Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC) divulgou mais informações sobre seu próximo e quinto relatório. Os 15 anos daqui em diante serão cruciais para evitar um desastre causado pelo aumento de temperaturas. Nesse período, são necessários grandes investimentos em reduções de emissões, em energias limpas (estimam-se US$ 147 bilhões por ano) e em soluções tecnológicas para tirar o excesso de gás carbônico do planeta.
As concentrações de CO2 na atmosfera hoje são 40% maiores do que na era pré-industrial. Adiar a mitigação até 2030 aumentará os desafios e reduzirá as opções, alerta o sumário do documento.
O IPCC adverte ainda que as emissões anuais de carbono devem ser reduzidas entre 40% e 70% até 2050 para que a temperatura na Terra suba no máximo 2 graus – o que para a ONU seria o teto que poderíamos suportar com menos prejuízos à vida no planeta.
Dados do Trend Compendium 2030 apontam, no entanto, que só as emissões vindas da queima de combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás natural) aumentarão em até
16% anualmente.
No cenário mais otimista traçado pelo IPCC, a Terra ficará 1,7 grau mais quente até 2100. Mas, mesmo que reduzamos as emissões, os gases-estufa já estão em excesso na atmosfera e devem causar danos, como o aumento dos eventos extremos e no nível do mar.
Diante desse quadro, o Now for the Long Term propõe ações para a mitigação imediata. Uma delas seria o “intercâmbio e colaboração internacional”: incentivos de crédito e investimentos em infraestrutura de energia limpa para os países pobres e em desenvolvimento. A UNFCCC estima que, nos próximos 15 anos, esses países precisarão de até US$ 67 bilhões para medidas de adaptação.
TECNOLOGIAS
DISSEMINAÇÃO DOS APARELHOS E DA INTERNET
Ao andar em uma grande cidade, é só olhar ao redor para ver como celulares estão presentes. É bem provável que você veja muitas pessoas – se não a maioria – conversando, enviando mensagens ou navegando na web pelos aparelhos. A disseminação das tecnologias e da internet em todo o mundo é uma das tendências com números que impressionam. E elas revolucionam cada vez mais a forma como conduzimos nossas vidas e como as sociedades são regidas.
Em 2020, estima-se em 4 bilhões o número de usuários da web, conectados em 31 bilhões de dispositivos. O desempenho de tecnologias também crescerá. A velocidade média da banda larga partirá do 1 megabyte por segundo que temos hoje para mais de 100 megabytes por segundo em 2030.
Em 2030, serão trocados pela web 50 trilhões de gigabytes de dados
Para os países pobres e em desenvolvimento, os ganhos com o acesso a aparelhos e à internet são essenciais para melhorar a situação econômica. Tanto que, segundo declaração do vice-secretário-geral da ONU, Jan Eliasson, em março de 2013, novas tecnologias da informação estão atingindo os países pobres mais rapidamente do que comida e banheiros. Um relatório da ONU indicou que hoje 6 bilhões de pessoas possuem celulares, enquanto apenas 4,5 bilhões têm acesso a instalações sanitárias adequadas.
O documento Trend Compendium 2030 destaca que a propagação das tecnologias relaciona-se intimamente com a renda financeira. “À medida que a economia mundial cresce e os países ficam mais ricos, a difusão de tecnologias se acelera. Essa difusão, por sua vez, provoca aumento de produtividade de um país, resultando em crescimento econômico mais forte”, diz um dos trechos. Segundo o relatório, os celulares influenciam até mesmo o crescimento do PIB nacional, pois é por meio dele que um cidadão acessa mais pessoas, informações e ganha facilidade nas atividades financeiras.
Hoje, 1% da população mundial acessa a internet apenas pelo celular. Em 20 anos, o índice saltará para 60%
O Now for the Long Term também sublinha que novas tecnologias oferecem potencial para aumentar as oportunidades de educação, melhorar drasticamente os resultados de saúde, promover a liberdade de expressão e da democracia.
Dos dez tópicos[4] do Outlook on the Global Agenda 2014, dois estão ligados às tecnologias, mas de modo mais cético: a intensificação das ameaças cibernéticas, como roubo de dados, e a forma como informações erradas ou boatos se espalham rapidamente pela web.”
[4] Os outros são: aumento das tensões sociais no Oriente Médio e Norte da África; aumento da desigualdade de renda; persistência do desemprego estrutural; inação em relação ao aquecimento global; diminuição de confiança em políticas econômicas; falta de valores na liderança; expansão da classe média na Ásia; e aumento da importância das megacidades