Em passagem pelo Brasil, a nigeriana Tokunboh Ishmael aponta que Brasil ainda tem muito a avançar na área de inclusão social
De Lagos, Nigéria, Para São Paulo, Brasil, foi um passeio geográfico de uma cidade próspera e crescente para outra. A viagem teve como destino principal o 8º congresso GIFE – um encontro multidisciplinar de investidores sociais do Brasil, além de dirigentes de organizações da sociedade civil, acadêmicos, consultores e representantes de governo. Sou uma Yale World Fellow, uma rede de mais de 250 líderes globais que pretendem trazer soluções inovadoras e mudanças positivas em todas as partes do mundo. Como Fellow e Co-fundadora e diretora de Alitheia Capital, participei do painel sobre filantropia e Investimento de Impacto no primeiro dia do Congresso GIFE.
Quando cheguei em São Paulo antes do começo do congresso, esperava ver e vivenciar uma metrópole parecida com Lagos. Ambas as cidades tem histórias tanto de um alto crescimento econômico, quanto da desigualdade na distribuição da renda e dos serviços. A infraestrutura e o desenvolvimento das cidades não são muito diferentes – pelo menos esteticamente. De fato, São Paulo é uma cidade cosmopolita desenvolvida.
Os enfoques comuns dos debates de GIFE foram histórias da mistura e diluição das fronteiras entre as empresas sociais, organizações sem fins lucrativos e empresas privadas. Fui muito inspirada pelas conversas e quero compartilhar meus pensamentos.
A percepção geral do investimento social é de que é simplesmente “uma obra de caridade.” As empresas colocam seus objetivos econômicos e sociais em silos separados, tendo como prioridade o primeiro sobre o segundo. Os objetivos sociais raramente são executados em qualquer escala significativa e, de fato, geralmente relegado ao porão escuro do departamento de “Responsabilidade Social Corporativa (RSC)” onde eles acabam não tendo qualquer impacto na rentabilidade da empresa.
Eu simplesmente não concordo com esta forma de fazer negócios. O objetivo “social” tem de ser integrado no tecido da estratégia de empresa para ganhar dinheiro – ele não precisa impedir a empresa de atingir seus objetivos financeiros e econômicos. Ao contrário, aplicado corretamente, o “social” aumentará a longevidade e capacidade da empresa, ao mesmo tempo fazendo o bem. Em outras palavras, uma empresa deve considerar como seus esforços poderiam servir à população mais ampla, além de alguns privilegiados, em dimensões diferentes de gestão de produção como concepção de produtos, canais de distribuição, cadeias de valor, modelos de negócios e muito mais.
A ideia de integrar o “social” com a existência da empresa foi surgida no discurso do painel de Yale World Fellows sobre estratégias para promover inclusão nas economias emergentes, onde a distância entre ricos e pobres está cada vez maior. Eu vejo tão claramente que uma das forças propulsoras da desigualdade é a maneira inautêntica da qual as empresas tratam de questões sociais. “Vamos nos centrar no dinheiro em primeiro lugar, e voltar mais tarde para lidar com RSC,” dizem eles. Não apenas é uma visão míope sobre como fazer negócios, mas eles também estão perdendo inúmeras possibilidades e áreas de crescimento.
Meus colegas “puristas” diriam que isso é uma bola de neve. Quanto mais borrar as linhas, menos provável é que as empresas continuem a ser responsáveis. E portanto, é menos provável que eles verdadeiramente considerem seu objetivo social. Meus colegas empresários protestariam que eles não estão executando obras de caridade. Sejamos claros: minha recomendação não é que as empresas tornam-se instituições de caridade. Em vez disso, sugiro que eles cheguem à conclusão de que as empresas que têm uma consciência social são mais inclusivas e sustentáveis. A história mostra que as empresas com consciência social tendem a permanecer muito mais tempo do que seus pares. Como disse o Dr. Richard Foster, professor da Yale School of Management , durante o congresso GIFE, “vale a pena a longo prazo gerir uma empresa que faz a coisa certa”.
Meu colega e, também,Yale World Fellow, Marcelo Furtado, ilustra muito bem isso com um estudo de caso: uma de suas campanhas durante seu mandato como chefe do Greenpeace Brasil. Furtado e sua equipe mapearam o desmatamento na Amazônia e identificaram que as plantações de soja tinham causado o desmatamento.
Na tentativa de acabar com o desmatamento, a equipe do Greenpeace se aproximou do comprador no topo da cadeia de valor em vez dos vendedores de soja na Amazônia. A soja era cultivada e usada para alimentar os frangos para produzir Chicken Nuggets. Em vez de recusar-se a ajustar (como outras empresas), McDonald’s reavaliou sua cadeia de valor da soja e incentivou seus fornecedores a mudarem o comportamento e buscar outras fontes ecologicamente corretas. Isso não somente mudou a cadeia de valor de McDonald’s. Uma grande faixa da indústria de varejo seguiu o exemplo com os exportadores de soja, descobrindo que é necessário para responder aos novos padrões de mercado estabelecidos por uma empresa de tendências.
Esta maneira de fazer negócios não precisa ser reacionária, ou acontecer apenas após um grande risco reputacional. Quando enraizada no desenvolvimento de modelo de uma empresa de negócios, cadeia de valor, práticas, normas e outros, esta maneira realmente beneficiará tanto a longevidade quanto a reputação de uma empresa.
As empresas que consideram Responsabilidade Social Corporativa simplesmente como uma caixa de seleção, ou talvez uma necessidade de relações públicas, deveriam ajustar suas mentalidades – à frente da curva.
*Tokunboh Ishmael é co-fundadora e Diretora Gerente da Alitheia Capital, uma empresa de gestão de fundos e investimentos com sede na Nigéria. Uma das pioneiras em impacto de investimento, com mais de 20 anos de experiência, abrangendo banca de investimento, investimento de capital privado, tecnologia e desenvolvimento de novos negócios, Tokunboh trabalha para canalizar investimentos que melhorem o acesso ao financiamento, energia e habitação para as pequenas empresas e as famílias de baixa renda.