A terceira maior rede de supermercados da França, Intermarché, lançou recentemente uma campanha de tremendo sucesso para promover o consumo de frutas e legumes que fogem do padrão comercial. Seu objetivo era reduzir o preconceito contra alimentos disformes, mas perfeitamente aceitáveis. A empresa, que tem cerca de 2.300 lojas na Europa, passou a oferecer vegetais considerados “feios” com destaque e desconto de 30%. A iniciativa veio acompanhada de uma forte campanha publicitária e a oferta de amostras de sucos e sopas feitos com esses produtos. Segundo o Intermarché, cada uma de suas lojas vendeu em média 1,2 tonelada de vegetais não convencionais nos primeiros dois dias da campanha. Ela também aumentou em 24% a circulação de clientes e deu um impulso na imagem da empresa. O vídeo ao lado, em inglês, conta um pouco dessa história.
Essa não é uma experiência comercial isolada. A cooperativa portuguesa Fruta Feia segue modelo semelhante. Ela prospera com a compra e venda de alimento fora dos padrões pela metade do preço. Eles são distribuídos a seus 420 associados, que pagam uma mensalidade para receber uma cesta semanal de alimentos. O New York Times indicou recentemente que a iniciativa é tão popular que já é praticamente um “movimento de contracultura”. Para Isabel Soares, uma das fundadoras do Fruta Feia:
É claro que é mais fácil avaliar o aspecto exterior do que as características internas [do alimento], como o nível de açúcar, mas este é um jeito errado de determinar a sua qualidade. [Queremos] romper com a ditadura da estética, porque ela contribuiu para o aumento do desperdício de alimentos.
A ideia é brilhante porque o visual dos alimentos desperta tremendo preconceito. Basta lembrar que um boato que circulou recentemente na internet associava a imagem de alimentos monstruosos à radiação emitida após o acidente nuclear de Fukushima – eram, na verdade, meras variações da norma. O consumidor médio, que jamais vai ao campo e só adquire alimentos padronizados, quadradinhos, ignora tal diversidade. Por isso, alimentos fora dos padrões são, no melhor dos casos, destinados à ração animal. Entretanto, os criadores dedicados à pecuária de escala, o modelo dominante, geralmente dão preferência à ração industrializada.
As iniciativas do Intermarché e da Fruta Feia estão alinhadas com uma resolução recente do Parlamento Europeu, que propôs uma redução do desperdício de alimentos à metade até 2025. Segundo estudo divulgado em maio pelos governos da Holanda e da Suécia, a Comunidade Europeia desperdiça 89 milhões de toneladas anuais de comida. Isabel Soares, do Fruta Feia, calcula que um terço dos alimentos produzidos em Portugal não estão dentro dos padrões aceitos por supermercados e seus consumidores. E, por isso, acabam no lixo. É uma realidade que não se limita à Europa e aos países mais ricos.