O País já conquistou avanços importantes no combate à mudança climática, mas o tema ainda não se tornou central e estratégico para o desenvolvimento de longo prazo
A economia de baixo carbono pode representar uma boa oportunidade para o Brasil. O País tem se destacado internacionalmente no combate à mudança climática e é reconhecido por sua matriz energética com grande participação de energias renováveis e também pela alta disponibilidade de recursos naturais em seu território. Mas muitos avanços ainda precisam ser feitos.
A matriz energética do Brasil é uma das mais limpas do mundo, com 42,4% da energia proveniente de fontes renováveis. A média de representação das renováveis no mundo é de 13,2%. Analisando somente a matriz de energia elétrica, as hidrelétricas são a principal fonte de geração que, se somadas a outras fontes renováveis como a eólica, representam 84,5% da matriz. Mas esse percentual vem caindo, diante do aumento de geração pelas termoelétricas.
Em 2009, assumiu uma meta voluntária para redução das emissões de gases de efeito estufa, entre 36,1% e 38,9%, até 2020, consolidando um marco importante no posicionamento brasileiro em relação ao tema. De acordo com as estimativas do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, as emissões totais já foram reduzidas em 38,7% entre 2005 e 2010 [1].
[1] O inventário de emissões mais recente foi publicado em 2013 pelo MCTI e refere-se aos dados de 1990 a 2010.
O principal motivo dessa redução é a queda do desmatamento na Amazônia Legal em 79%, desde 2004. Um relatório produzido pela Union of Concerned Scientists, intitulado Histórias de sucesso no âmbito do desmatamento: Nações tropicais onde as políticas de proteção e reflorestamento deram resultado, destacou o Brasil como exemplo de sucesso na redução do desmatamento e das emissões .
Segundo o documento, “até somente uma década atrás, a floresta [amazônica] estava desaparecendo a passos rápidos, tornando o Brasil o líder em desmatamento em todo o mundo naquela época”. Mas as ações adotadas nos últimos dez anos tiveram um resultado expressivo.
O inventário brasileiro é dividido em setores que, de acordo com sua representatividade em termos de emissões, são: agropecuária (35%), energia (32%), mudança de uso da terra e floresta (22%), processos industriais (7%) e tratamento de resíduos (4%).
Esse sucesso se deve a ações como o lançamento do Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (2004), as moratórias da soja (2006) e do gado (2009), a expansão das reservas indígenas e outras áreas protegidas, as ações governamentais estaduais e federais, além de um forte apoio internacional para o tema. “A redução do desmatamento da Amazônia já trouxe grande contribuição no combate à mudança climática, mais do que qualquer outro país na Terra”, aponta o relatório.
Porém, algumas mudanças recentes podem pôr em risco o avanço conquistado até o momento, como o Novo Código Florestal – que fornece anistia para os desmatamentos anteriores – e a volta do aumento do desmatamento, à taxa de 29% entre 2012 e 2013.
Com a queda do desmatamento até 2012 e o aumento da demanda por energia na economia, o setor de energia dobrou sua representatividade no inventário nacional de gases-estufa, passando de 16% em 2005 para 32% em 2010. Mas o Brasil tem condições de encarar esse aumento de demanda de forma sustentável. De acordo com o estudo Renewable Energy Country Attractiveness Index , da consultoria EY, atualmente o Brasil ocupa o nono lugar no ranking internacional que analisa o mercado de fontes limpas em 40 países, à frente até da Alemanha.
Os transportes são o segundo maior consumidor de energia no País (31,3%), mas diferentemente do primeiro –indústria (35,1%) –, tem como base o uso de fontes não renováveis, como o óleo diesel e a gasolina. A predominância do transporte rodoviário, em vez de ferroviário, por exemplo, explica esse consumo.
Entre os destaques do relatório estão o crescimento do mercado de energia eólica no País e o leilão de reserva dedicado somente à energia solar, além dos incentivos financeiros com taxas de juro favoráveis oferecidos pelo BNDES. No entanto, o horizonte de expansão das renováveis parece tímido, considerando-se que cerca de 70% dos investimentos em energia previstos até 2023 serão feitos em combustíveis fósseis.
Além dos setores de energia e florestas, o Brasil ainda precisa enfrentar outro grande desafio: sua principal atividade emissora de gases-estufa atualmente é a agropecuária, contribuindo com 35% das emissões.
O programa de Agricultura de Baixo Carbono (ABC) prevê a principal linha de crédito para o financiamento da agricultura sustentável. Mas o total de operações planejado para essa atividade não tem sido executado. Por exemplo, para a safra 2013/2014 (que inclui os meses junho a julho), eram previstos R$ 4,5 bilhões, mas foram repassados somente 67% desse montante. “Entre os motivos de o montante não ter sido executado, destaco a necessidade de haver mais profissionais qualificados para preparar e avaliar as propostas dentro dos parâmetros requeridos pelo Programa ABC, tanto nos bancos como na assistência técnica aos produtores; e também o alto custo de transação [custos técnicos e administrativos desde a elaboração do projeto de acordo com os requisitos do programa até a conclusão da operação] e a sensação de falta de clareza e uniformidade nos critérios aplicados pelo BNDES para enquadramento no programa”, comenta Aron Belinky, coordenador do Programa de Finanças Sustentáveis do GVces, parceiro do projeto do Observatório ABC .
Todos os cenários indicam que o Brasil alcançará sua meta de redução das emissões em 2020, mas o principal desafio começará em 2021. A partir daí, o País deverá apresentar metas e planos de redução mais ousados e, para isso, deve começar a se planejar desde já.
“A política de clima prevê que as demais políticas públicas e programas governamentais sejam compatíveis entre si. Isso significaria trazer a mudança climática de forma estratégica para o desenvolvimento de longo prazo”, comenta Carlos Rittl, secretário- executivo do Observatório do Clima.