A presença de aditivos, antibióticos e pesticidas nos alimentos está entre as preocupações do consumidor. Com razão. Sobram substâncias químicas e faltam monitoramento e pesquisas
Um novo consumidor está ditando, cada vez mais, as regras e tendências do mercado de alimentos processados no Brasil e no mundo. A constatação é relatada na publicação Brasil Ingredients Trends 2020, lançada em 2014 pelo Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital). O apelo sensorial ao prazer, que durante séculos foi a principal baliza da oferta de produtos pela indústria alimentícia, já não dá conta de satisfazer o consumidor atual, que leva em consideração questões como saúde, bem-estar, sustentabilidade e ética (mais nas edições 81 sobre Alimentos e 85 sobre Bem-Estar Animal).
“Nunca a indústria de alimentos e bebidas se pautou tanto em conhecimento científico. Entretanto, as pessoas têm medo dos alimentos processados. Hoje, existe uma tendência dos consumidores de procurar alimentos mais ‘naturais’” reconhece Raul Amaral, coordenador da plataforma tecnológica de inovação do Ital.
Os americanos estão lidando com uma contaminação de arsênico no arroz. Segundo o Environmental Working Group, o mais difícil é identificar os produtos industrializados que contêm derivados do grão, entre eles biscoitos diversos e papinhas de bebê. O arsênico é cancerígeno.
Em sua opinião, há muito desconhecimento acerca do tema, a ponto de se confundir processos com ingredientes. “O processamento é uma transformação do alimento. Isso não tem relação nenhuma com o alimento ser mais ou menos saudável. O que faz um alimento saudável é sua composição”, defende Amaral.
Acontece que na composição, além dos ingredientes que todos nós conhecemos (grãos, frutas, carne, leite, farinhas e açúcares), entram os aditivos químicos que, grosso modo, podem ser divididos em naturais e artificiais. Corantes, aromatizantes, antioxidantes, conservantes, espessantes, acidulantes, flavorizantes, estabilizantes e umectantes são largamente utilizados pela indústria. “Se algum aditivo é usado em uma formulação, é porque é necessário, e foi aprovado pelos órgãos competentes, que são sérios e responsáveis”, garante o diretor-geral do Ital, Luis Madi.
[1] Conjunto de Substâncias adicionadas aos alimentos sem o propósito de nutrir, mas para modificar ou manter as características físicas, químicas e biológicas ou sensoriais desses produtos, na definição da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)
Mas, há anos, pesquisas têm indicado que alguns aditivos podem estar associados à ocorrência de problemas de saúde. Os corantes, sobretudo. Alergias, rinite broncoconstrição, hiperatividade e tumores, entre outros, são apontados entre os possíveis males da exposição aos corantes. Pouco se sabe sobre os efeitos no comportamento, ou sobre como os diversos aditivos agem em conjunto no organismo (mais sobre corantes).
De acordo com artigo “Corantes Artificiais em Alimentos”, publicado na revista científica Alimentos e Nutrição = Brazilian Journal of Food and Nutrition, as primeiras suspeitas da ação cancerígena dos corantes surgiram em 1906, em experimento feito com a injeção do corante conhecido como vermelho escarlate sob a pele da orelha de um coelho. A partir daí, várias pesquisas têm sido empreendidas. Acesse o artigo.
“Diversos estudos indicam que, embora a útilização dos aditivos em doses adequadas seja permitida pelo Ministério da Saúde, torna-se necessário que sejam feitos mais ensaios para se determinar os efeitos nocivos desses ingredientes adicionados intencionalmente aos alimentos”. Esta é a conclusão do artigo científico “Aditivos alimentares: aplicações e toxicologia”, publicado recentemente na Revista Verde de Agroecologia e Desenvolvimento Sustentável . Acesse o artigo.
Apesar de os países, por meio de suas agências reguladoras, fixarem índices de ingestão diária aceitável dessas substâncias (com base no que rezam a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura e a Organização Mundial da Saúde), o consumidor, em geral, desconfia da saudabilidade dos aditivos artificiais.
Uma pesquisa realizada nos EUA pelo International Food Information Council (Conselho Internacional para Informação Nutricional) relata que, entre os entrevistados, existe preocupação com a presença de aditivos químicos nos alimentos, de bactérias causadoras de doenças, de antibióticos, de substâncias alergênicas e de pesticidas.
Quanto a estes últimos, o consumidor brasileiro de alimentos industrializados está no escuro. “Hoje no Brasil só produzimos dados de presença de agrotóxicos [2] para os alimentos in natura. Para alimentos de origem animal e processados não há verificação”, afirma Luiz Claudio Meirelles, da Escola Nacional de Saúde Pública, e ex-gerente de toxicologia da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). (Mais sobre agrotóxicos).
[2] Mesmo nos alimentos in natura, dos 450 tipos de substância autorizados para uso no Brasil, a normatização vigente só prevê o monitoramento de 27