As águas subterrâneas são fontes para o abastecimento integral ou complementar dos municípios brasileiros, sendo fonte alternativa para períodos de estiagem, e poderiam ser melhor aproveitadas para uso público e privado. Na avaliação do geólogo Cláudio Oliveira, presidente da Associação Brasileira de Águas Subterrâneas (Abas), elas vêm sendo mal administradas no Brasil ao longo dos anos.
“Estamos gerindo água subterrânea como se fosse água superficial”, diz. Ele explica que o “comportamento” da primeira é mais complexo que o da segunda, exigindo conhecimento técnico específico para uma eficiente gestão. A ausência desse perfil profissional nos órgãos reguladores estaduais torna a concessão de outorgas para uso de poços tubulares mais lenta que a demanda. Esse fator, aliado à falta de fiscalização, estimula o funcionamento de poços clandestinos, afirma Oliveira. Estima-se que em 2014 havia entre 8 mil e 12 mil poços tubulares na região metropolitana de São Paulo, sendo que apenas 2.087 haviam sido outorgados até setembro pelo Departamento de Águas e Energia Elétrica (Daee). “Um poço mal feito é, por si, um dos focos potenciais de contaminação”, afirma o geólogo Carlos Eduardo Giampá, conselheiro da Abas.
Segundo ele, os poços são fontes viáveis em curto prazo para condomínios e indústrias, especialmente para usos não potáveis, mas há no País uma tendência a criticar e fechar poços, quando o que deveria ocorrer seria uma melhor gestão, fazendo-se cumprir os mecanismos atuais de controle para garantir a qualidade. Para Cláudio Oliveira, uma aproximação entre os órgãos gestores e os perfuradores seria positiva na busca de soluções para a clandestinidade.
Para reverter a cultura de gestão dos recursos hídricos focada em águas superficiais, o Ministério do Meio Ambiente, bem como a Agência Nacional de Águas têm programas específicos. Fernando Roberto de Oliveira, gerente Águas Subterrâneas da ANA, acredita que essa mudança fundamental é lenta, mas já está em curso. Em entrevista concedida por e-mail, ele comenta as ações nesse sentido.

Quais foram os avanços da Agenda Nacional de Águas Subterrâneas até aqui para a gestão integrada de águas subterrâneas e superficiais?
Foram realizadas diversas ações no âmbito da Agenda Nacional de Águas Subterrâneas, bem como no Programa Nacional de Águas Subterrâneas do Ministério do Meio Ambiente. Independentemente das várias avaliações realizadas e em andamento em aquíferos de expressão nacional, e das capacitações específicas desenvolvidas, trazer o tema gestão integrada de águas subterrâneas e superficiais à sociedade, mostrando a sua importância, seus impactos e riscos, certamente representou uma grande contribuição à área de recursos hídricos.
Estão sendo finalizados os Estudos Hidrogeológicos e de Vulnerabilidade no Sistema Aquífero Urucuia [que abrangem seis estados e é o maior do País, considerando-se os que se limitam ao território nacional] e Proposição de Modelo de Gestão Integrada e Compartilhada, provavelmente a maior avaliação hidrogeológica em andamento no País, com foco na gestão integrada. O Conselho Nacional de Recursos Hídricos trabalha junto com as Câmaras Técnicas de Águas Subterrâneas, de Outorga e Planos de Recursos Hídricos para elaborar uma Resolução que defina as diretrizes nacionais para essa gestão integrada. Os Planos começam a apresentar diagnósticos integrados. Enfim, os avanços nessa abordagem são claros e constantes. É um longo processo de mudança cultural na gestão de recursos hídricos.
O senhor acredita que a crise hídrica, que expôs a urgência de melhor gestão dos recursos hídricos, pode contribuir para a valorização das águas subterrâneas e, por consequência, impulsionar a gestão integrada de águas subterrâneas e superficiais?
Esperamos que sim. Pouco se fala, mas as águas subterrâneas têm grande relevância no abastecimento público em nossas cidades, e estão presentes na maioria dos municípios brasileiros como a principal fonte ou de forma complementar ao manancial superficial. O País ainda precisa avançar na gestão de recursos hídricos, especialmente no foco integrado, entendendo que a água que flui em um rio nos períodos de estiagem, na ausência de reservatórios superficiais/barramentos, é água mantida pelos aquíferos, portanto subterrânea.
Se já houvesse uma gestão integrada das águas subterrânea e superficial seria possível que São Paulo tivesse evitado a crise hídrica?
Estima-se que na Grande São Paulo atualmente sejam extraídos entre 10 e 11 m3/s de águas subterrâneas, com potencial para mais alguns metros cúbicos por segundo, talvez quatro ou cinco. Isso não evitaria a crise, uma vez que a mesma é originária, em boa parte, de redução anômala nos volumes da precipitação pluviométrica. Todavia, o acréscimo desse volume, aliado a melhores planejamento e gestão, contribuiriam para um impacto negativo menor da crise hídrica.
Qual é o maior empecilho para a gestão integrada de águas subterrâneas e superficiais?
Há diversos obstáculos a serem superados, mas certamente a melhoria nas metodologias de quantificação nos balanços hídricos integrados e a ausência de diretrizes nacionais para a implementação da gestão integrada nos instrumentos de gestão estão entre os principais pontos.
A que o senhor atribui o alto número de poços clandestinos? Uma melhor capacitação técnico-gerencial dos órgãos estaduais poderia reduzir a clandestinidade?
A gestão de recursos hídricos é relativamente nova no país, a Lei das Águas é de 1997. A implementação dessa lei, de forma geral, envolveu primeiramente as águas superficiais, conforme a nossa tradição, para em seguida alcançar as águas subterrâneas. A capacitação técnico-gerencial sem dúvida é muito importante, mas, antes dessa etapa, é preciso ampliar os quadros técnicos nos órgãos gestores, em quantitativos suficientes, estáveis e adequadamente remunerados, de forma que possam atuar na regulação do uso desse manancial.[:en]
As águas subterrâneas são fontes para o abastecimento integral ou complementar dos municípios brasileiros, sendo fonte alternativa para períodos de estiagem, e poderiam ser melhor aproveitadas para uso público e privado. Na avaliação do geólogo Cláudio Oliveira, presidente da Associação Brasileira de Águas Subterrâneas (Abas), elas vêm sendo mal administradas no Brasil ao longo dos anos.
“Estamos gerindo água subterrânea como se fosse água superficial”, diz. Ele explica que o “comportamento” da primeira é mais complexo que o da segunda, exigindo conhecimento técnico específico para uma eficiente gestão. A ausência desse perfil profissional nos órgãos reguladores estaduais torna a concessão de outorgas para uso de poços tubulares mais lenta que a demanda. Esse fator, aliado à falta de fiscalização, estimula o funcionamento de poços clandestinos, afirma Oliveira. Estima-se que em 2014 havia entre 8 mil e 12 mil poços tubulares na região metropolitana de São Paulo, sendo que apenas 2.087 haviam sido outorgados até setembro pelo Departamento de Águas e Energia Elétrica (Daee). “Um poço mal feito é, por si, um dos focos potenciais de contaminação”, afirma o geólogo Carlos Eduardo Giampá, conselheiro da Abas.
Segundo ele, os poços são fontes viáveis em curto prazo para condomínios e indústrias, especialmente para usos não potáveis, mas há no País uma tendência a criticar e fechar poços, quando o que deveria ocorrer seria uma melhor gestão, fazendo-se cumprir os mecanismos atuais de controle para garantir a qualidade. Para Cláudio Oliveira, uma aproximação entre os órgãos gestores e os perfuradores seria positiva na busca de soluções para a clandestinidade.
Para reverter a cultura de gestão dos recursos hídricos focada em águas superficiais, o Ministério do Meio Ambiente, bem como a Agência Nacional de Águas têm programas específicos. Fernando Roberto de Oliveira, gerente Águas Subterrâneas da ANA, acredita que essa mudança fundamental é lenta, mas já está em curso. Em entrevista concedida por e-mail, ele comenta as ações nesse sentido.

Quais foram os avanços da Agenda Nacional de Águas Subterrâneas até aqui para a gestão integrada de águas subterrâneas e superficiais?
Foram realizadas diversas ações no âmbito da Agenda Nacional de Águas Subterrâneas, bem como no Programa Nacional de Águas Subterrâneas do Ministério do Meio Ambiente. Independentemente das várias avaliações realizadas e em andamento em aquíferos de expressão nacional, e das capacitações específicas desenvolvidas, trazer o tema gestão integrada de águas subterrâneas e superficiais à sociedade, mostrando a sua importância, seus impactos e riscos, certamente representou uma grande contribuição à área de recursos hídricos.
Estão sendo finalizados os Estudos Hidrogeológicos e de Vulnerabilidade no Sistema Aquífero Urucuia [que abrangem seis estados e é o maior do País, considerando-se os que se limitam ao território nacional] e Proposição de Modelo de Gestão Integrada e Compartilhada, provavelmente a maior avaliação hidrogeológica em andamento no País, com foco na gestão integrada. O Conselho Nacional de Recursos Hídricos trabalha junto com as Câmaras Técnicas de Águas Subterrâneas, de Outorga e Planos de Recursos Hídricos para elaborar uma Resolução que defina as diretrizes nacionais para essa gestão integrada. Os Planos começam a apresentar diagnósticos integrados. Enfim, os avanços nessa abordagem são claros e constantes. É um longo processo de mudança cultural na gestão de recursos hídricos.
O senhor acredita que a crise hídrica, que expôs a urgência de melhor gestão dos recursos hídricos, pode contribuir para a valorização das águas subterrâneas e, por consequência, impulsionar a gestão integrada de águas subterrâneas e superficiais?
Esperamos que sim. Pouco se fala, mas as águas subterrâneas têm grande relevância no abastecimento público em nossas cidades, e estão presentes na maioria dos municípios brasileiros como a principal fonte ou de forma complementar ao manancial superficial. O País ainda precisa avançar na gestão de recursos hídricos, especialmente no foco integrado, entendendo que a água que flui em um rio nos períodos de estiagem, na ausência de reservatórios superficiais/barramentos, é água mantida pelos aquíferos, portanto subterrânea.
Se já houvesse uma gestão integrada das águas subterrânea e superficial seria possível que São Paulo tivesse evitado a crise hídrica?
Estima-se que na Grande São Paulo atualmente sejam extraídos entre 10 e 11 m3/s de águas subterrâneas, com potencial para mais alguns metros cúbicos por segundo, talvez quatro ou cinco. Isso não evitaria a crise, uma vez que a mesma é originária, em boa parte, de redução anômala nos volumes da precipitação pluviométrica. Todavia, o acréscimo desse volume, aliado a melhores planejamento e gestão, contribuiriam para um impacto negativo menor da crise hídrica.
Qual é o maior empecilho para a gestão integrada de águas subterrâneas e superficiais?
Há diversos obstáculos a serem superados, mas certamente a melhoria nas metodologias de quantificação nos balanços hídricos integrados e a ausência de diretrizes nacionais para a implementação da gestão integrada nos instrumentos de gestão estão entre os principais pontos.
A que o senhor atribui o alto número de poços clandestinos? Uma melhor capacitação técnico-gerencial dos órgãos estaduais poderia reduzir a clandestinidade?
A gestão de recursos hídricos é relativamente nova no país, a Lei das Águas é de 1997. A implementação dessa lei, de forma geral, envolveu primeiramente as águas superficiais, conforme a nossa tradição, para em seguida alcançar as águas subterrâneas. A capacitação técnico-gerencial sem dúvida é muito importante, mas, antes dessa etapa, é preciso ampliar os quadros técnicos nos órgãos gestores, em quantitativos suficientes, estáveis e adequadamente remunerados, de forma que possam atuar na regulação do uso desse manancial.