O crescimento da demanda pelo chocolate comum e gourmet no mercado mundial está despertando os pequenos produtores rurais para práticas mais viáveis econômica e ambientalmente. Em São Félix do Xingu (PA), um grupo de 50 produtores ligados a uma cooperativa de agricultura familiar, a Camppax, conseguiu elevar a produtividade entre 20% e 50% apenas com medidas de baixo custo, como poda.
Nos quatro anos em que estão recebendo assessoria do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), os agricultores aprenderam práticas de análise de solo, de rastreabilidade da produção e de adequação ambiental da propriedade. “Queríamos que eles aproveitassem não só a liquidez que o cacau simples proporciona, mas que conquistassem um novo mercado, de maior valor agregado”, conta Eduardo Trevisan, responsável pelo projeto.
No Sul da Bahia, região com baixo Índice de Desenvolvimento Humano, um grupo de 17 agricultores familiares, capacitado pela Organização de Conservação da Terra com assessoria do Imaflora, recebeu a certificação socioambiental Rainforest Alliance Certified™ em março deste ano. Para isso, eles investiram em técnicas avançadas, como o uso de novas variedades da espécie e clones de maior rentabilidade. Também apostaram no reflorestamento de suas terras.
Como as indústrias que trabalham com chocolates premium são exigentes quanto às práticas ambientais, os produtores ficam mais atentos a esses cuidados. A julgar por várias iniciativas locais no Norte e Nordeste, Trevisan acredita que este é o início de uma nova era para pequenos agricultores do setor cacaueiro, na qual questões de produção e ambientais caminham juntas.
Para maximizar os ganhos
O desafio é expandir iniciativas do gênero para todo o setor e fazer com que a cadeia trabalhe organizada, caso contrário esse movimento pode não passar de iniciativas isoladas e, então, sucumbir à forte concorrência internacional e a interesses meramente econômicos. A opinião é de Durval Libânio, presidente do Instituto Cabruca, que desenvolve programas para o plantio do cacau à sombra de árvores.“Temos potencial para ser referência em qualidade do cacau (referindo-se às variações genéticas desenvolvidas), mas falta organização da base produtiva”, diz.
De modo geral, a capacidade do pequeno produtor de acessar o nicho gourmet ainda é baixa. “A maioria ainda está endividada pelos anos de combate à (praga) Vassoura-de-bruxa e quem não está também não consegue crédito fácil para um cultivo que leva alguns anos para se desenvolver”, analisa. Sem recursos, não há como eles investirem em tecnologias que elevem a qualidade e a produtividade da lavoura e não poderão se expandir mesmo nem mesmo no mercado interno. Segundo ele, é comum as empresas comprarem cacau estrangeiro para abastecer brasileiros interessados em chocolates de melhor qualidade.
Também é necessário um esforço de marketing para exaltar o diferencial brasileiro no mercado global. “O fato de o nosso cacau não utilizar mão de obra infantil (diferentemente do que ocorre na África, maior fornecedora mundial) e de ser uma cultura que estimula a biodiversidade não está sendo valorizado”, lamenta. Libânio defende a criação de selos de confiabilidade para o cacau, tal como ocorre com o café nacional, e de um número maior de cooperativas para disseminar boas técnicas e ter volume suficiente para aumentar o poder de negociação no mercado.
É o que faz a Cooperativa Agroindustrial de Cacau Fino (CooperBahia). Criada pelo Grupo Odebrecht para fortalecer a cadeia, ela fomenta alianças que envolvem tanto a atividade agrícola e industrial como a comercialização. “Produtores de menor porte recebem treinamento e apoio na produção do cacau fino”, diz Edgard Teles, dirigente da cooperativa que recentemente inaugurou no Sul da Bahia uma fábrica de líquor – massa da amêndoa processada, que vai no chocolate gourmet de padrão internacional.
Para Libânio, o aumento da demanda mundial por chocolate exige que o País “acerte os ponteiros” para incluir os agricultores familiares e estimular a sustentabilidade no setor. Se isso não ocorrer, vão aproveitar as oportunidades do mercado somente os grandes investidores, com fôlego para adquirir as tecnologias disponíveis, inclusive aquelas de produção em larga escala que podem ser usadas em terras fora da Amazônia e da Mata Atlântica, nas quais o cacau não se desenvolve tão facilmente, exigindo um volume bem maior de produtos químicos e de água para irrigação.