Como fazer com que o Facebook, Twitter ou outra rede social que funcione como distribuidora de conteúdo assumam sua responsabilidade editorial?
Por Moreno Cruz Osório
Na estreia do Farol Jornalismo em Página22, gostaria de abordar um dos tópicos mais recorrentes na nossa newsletter [1] neste ano: a relação do jornalismo com Facebook e Twitter. No cenário em que 83% dos brasileiros conectados têm o Facebook como rede social preferida e 67% usam a internet para se informar [2], é crucial problematizarmos a ascensão dessas novas plataformas de distribuição de notícias. Especialmente depois de dois fatos recentes. Primeiro, o lançamento do Instant Articles, canal que levou para dentro do Facebook conteúdos de veículos como o New York Times. Segundo, a saída do CEO do Twitter, Dick Costolo, último sintoma de que a empresa não anda lá muito bem.
[1] O Farol Jornalismo mantém uma newsletter semanal sobre tendências na profissão. Para assinar, acesse.
[2] Segundo dados da Pesquisa Brasileira de Mídia, da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República.
Talvez vocês se perguntem sobre a relevância do Twitter, ainda mais no Brasil, onde ele não é popular. Mas posso garantir: a rede social dos 140 caracteres tem grande importância para o jornalismo e, por consequência, para o público leitor.
Enquanto cresce a relevância do Facebook na recepção de conteúdo, o Twitter é sinônimo de breaking news. É grande a chance de aparecer primeiro em um tuíte qualquer fato que irrompa no planeta. Isso ficou claro em 2009, quando um avião da US Airways fez um pouso de emergência no Rio Hudson, em Nova York, e o mundo soube do fato pela timeline de um americano que cruzava aquelas águas em um ferryboat.
Naquele momento, o Twitter demonstrou o potencial de sua função pública. Parcerias com governos e serviços de emergência reforçaram essa característica. Ele transformou as coberturas jornalísticas em tempo real. Não à toa, seu maior grupo verificado é de jornalistas. Esse diferencial foi construído a partir da sua principal característica: posts curtos e ordenados em ordem cronológica inversa, sem a atuação de algoritmos. Como disse a diretora do Tow Center for Digital Journalism, Emily Bell, o Twitter talvez seja a ferramenta mais útil para jornalistas desde a invenção do telefone. Por isso, o mau desempenho da empresa nos últimos meses representa um alerta para a profissão.
Por outro lado, o Facebook não deveria nos deixar menos atentos. Mas por outro motivo. Ao avançar na batalha pela conquista da atenção com seu NewsFeed baseado em um controverso algoritmo, Mark Zuckerberg e sua equipe adentram em uma área tradicionalmente jornalística. Ao se transformar em fonte de informação, o Facebook vem gerando discussões, principalmente nos Estados Unidos.
Uma dessas polêmicas aconteceu durante as manifestações em Ferguson, Missouri. A pesquisadora Zeynep Tufecki chamou atenção para a sua linha do tempo não ter mostrado o que acontecia na noite em que os protestos se tornaram violentos, enquanto o seu Twitter estava pegando fogo. Por algum motivo, o algoritmo não achou relevante mostrar um dos assuntos mais importantes nos EUA naquele momento. Se pensarmos que quase 50% dos americanos se informam pelo Facebook, este não pode ignorar seu papel na esfera pública.
A grande questão é fazer com que Facebook, Twitter ou qualquer outra rede social que funcione como distribuidora de conteúdo assumam a responsabilidade editorial que lhes cabe. Ou pelo menos problematizem a questão. Mas não acontece nem uma coisa nem outra. É comum porta-vozes do Facebook argumentarem que a empresa quer apenas oferecer uma “experiência melhor”. Ou afirmarem que o algoritmo é resultado do desejo dos usuários.
É exatamente o que um artigo publicado na revista Science por pesquisadores ligados à empresa tentou provar. O trabalho, que ficou conhecido como “estudo não é culpa nossa”, concluiu que os próprios usuários são os “culpados” por viverem em uma “bolha ideológica”.
Não se trata de um cenário de terra arrasada. Mas é preciso atenção às interrogações suscitadas pelas transformações pela quais passa o jornalismo. O que podem significar as dificuldades do Twitter, reconhecidamente uma ferramenta útil para a ação pública e jornalística? Quais serão as consequências do crescente domínio do Facebook, tido por muitos como sinônimo da própria internet, e sua negação em assumir a responsabilidade que o poder de distribuir de notícias acarreta, condição que se consolida após o Instant Articles?
Acompanhar essa discussão não é apenas tarefa do jornalismo, mas de todos os interessados no processo de desenvolvimento da sociedade civil.
Este texto, que inaugura uma seção a ser publicada ao longo deste ano, é resultado de uma parceria entre Página22 e Farol Jornalismo, com a finalidade de debater cenários e tendências da comunicação na era digital
*Jornalista e sócio fundador do Farol Jornalismo[:en]Como fazer com que o Facebook, Twitter ou outra rede social que funcione como distribuidora de conteúdo assumam sua responsabilidade editorial?
Na estreia do Farol Jornalismo em Página22, gostaria de abordar um dos tópicos mais recorrentes na nossa newsletter [1] neste ano: a relação do jornalismo com Facebook e Twitter. No cenário em que 83% dos brasileiros conectados têm o Facebook como rede social preferida e 67% usam a internet para se informar [2], é crucial problematizarmos a ascensão dessas novas plataformas de distribuição de notícias. Especialmente depois de dois fatos recentes. Primeiro, o lançamento do Instant Articles, canal que levou para dentro do Facebook conteúdos de veículos como o New York Times. Segundo, a saída do CEO do Twitter, Dick Costolo, último sintoma de que a empresa não anda lá muito bem.
[1] O Farol Jornalismo mantém uma newsletter semanal sobre tendências na profissão. Para assinar, acesse.
[2] Segundo dados da Pesquisa Brasileira de Mídia, da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República.
Talvez vocês se perguntem sobre a relevância do Twitter, ainda mais no Brasil, onde ele não é popular. Mas posso garantir: a rede social dos 140 caracteres tem grande importância para o jornalismo e, por consequência, para o público leitor.
Enquanto cresce a relevância do Facebook na recepção de conteúdo, o Twitter é sinônimo de breaking news. É grande a chance de aparecer primeiro em um tuíte qualquer fato que irrompa no planeta. Isso ficou claro em 2009, quando um avião da US Airways fez um pouso de emergência no Rio Hudson, em Nova York, e o mundo soube do fato pela timeline de um americano que cruzava aquelas águas em um ferryboat.
Naquele momento, o Twitter demonstrou o potencial de sua função pública. Parcerias com governos e serviços de emergência reforçaram essa característica. Ele transformou as coberturas jornalísticas em tempo real. Não à toa, seu maior grupo verificado é de jornalistas. Esse diferencial foi construído a partir da sua principal característica: posts curtos e ordenados em ordem cronológica inversa, sem a atuação de algoritmos. Como disse a diretora do Tow Center for Digital Journalism, Emily Bell, o Twitter talvez seja a ferramenta mais útil para jornalistas desde a invenção do telefone. Por isso, o mau desempenho da empresa nos últimos meses representa um alerta para a profissão.
Por outro lado, o Facebook não deveria nos deixar menos atentos. Mas por outro motivo. Ao avançar na batalha pela conquista da atenção com seu NewsFeed baseado em um controverso algoritmo, Mark Zuckerberg e sua equipe adentram em uma área tradicionalmente jornalística. Ao se transformar em fonte de informação, o Facebook vem gerando discussões, principalmente nos Estados Unidos.
Uma dessas polêmicas aconteceu durante as manifestações em Ferguson, Missouri. A pesquisadora Zeynep Tufecki chamou atenção para a sua linha do tempo não ter mostrado o que acontecia na noite em que os protestos se tornaram violentos, enquanto o seu Twitter estava pegando fogo. Por algum motivo, o algoritmo não achou relevante mostrar um dos assuntos mais importantes nos EUA naquele momento. Se pensarmos que quase 50% dos americanos se informam pelo Facebook, este não pode ignorar seu papel na esfera pública.
A grande questão é fazer com que Facebook, Twitter ou qualquer outra rede social que funcione como distribuidora de conteúdo assumam a responsabilidade editorial que lhes cabe. Ou pelo menos problematizem a questão. Mas não acontece nem uma coisa nem outra. É comum porta-vozes do Facebook argumentarem que a empresa quer apenas oferecer uma “experiência melhor”. Ou afirmarem que o algoritmo é resultado do desejo dos usuários.
É exatamente o que um artigo publicado na revista Science por pesquisadores ligados à empresa tentou provar. O trabalho, que ficou conhecido como “estudo não é culpa nossa”, concluiu que os próprios usuários são os “culpados” por viverem em uma “bolha ideológica”.
Não se trata de um cenário de terra arrasada. Mas é preciso atenção às interrogações suscitadas pelas transformações pela quais passa o jornalismo. O que podem significar as dificuldades do Twitter, reconhecidamente uma ferramenta útil para a ação pública e jornalística? Quais serão as consequências do crescente domínio do Facebook, tido por muitos como sinônimo da própria internet, e sua negação em assumir a responsabilidade que o poder de distribuir de notícias acarreta, condição que se consolida após o Instant Articles?
Acompanhar essa discussão não é apenas tarefa do jornalismo, mas de todos os interessados no processo de desenvolvimento da sociedade civil.
Este texto, que inaugura uma seção a ser publicada ao longo deste ano, é resultado de uma parceria entre Página22 e Farol Jornalismo, com a finalidade de debater cenários e tendências da comunicação na era digital
*Jornalista e sócio fundador do Farol Jornalismo