De Paris – 27 páginas, sendo 11 para o novo acordo climático, e 50 colchetes. Este é o saldo do texto apresentado pela presidência da Conferência do Clima de Paris (COP 21) na noite desta quinta-feira (10/12), depois de horas de atraso recheada de negociações de última hora e bastante pressão política dos anfitriões franceses.
“Vocês sabem, melhor do que qualquer outra pessoa, que o compromisso implica, por natureza, renunciar ao que é ideal para um, a fim de se chegar ao que é desejável para todos”, disse Laurent Fabius, ministro francês do Exterior e presidente da COP 21, durante a apresentação do texto, na noite de quinta.
O novo texto teve recepção mista entre negociadores e observadores. No geral, a proposta apresentada por Fabius avança em pontos importantes na agenda de negociação, como financiamento para ações de mitigação e adaptação às mudanças do clima em países em desenvolvimento.
De acordo com o texto, existe concordância dos negociadores sobre o piso de financiamento de US$ 100 bilhões anuais a partir de 2020, recursos estes providenciados pelas nações desenvolvidas. A proposta também ressalta a questão da participação de países emergentes na capitalização desse fundo, uma das bandeiras defendidas pelos países ricos na COP 21: pelo texto, esse tipo de contribuição voluntária poderá acontecer no contexto de cooperação Sul-Sul (ou seja, ajuda entre países em desenvolvimento).
A proposta também incorpora parcialmente uma das bandeiras mais fortes nesta Conferência do Clima de Paris: a definição de 1,5 grau Celsius como limite para o aquecimento global neste século com relação aos níveis pré-Revolução Industrial, defendida por países mais vulneráveis aos efeitos das mudanças do clima, como as pequenas nações insulares. Pelo texto, as nações deverão se esforçar para conter o aquecimento em níveis “bem abaixo dos 2 graus Celsius”, limite anteriormente acordado pelos países para orientar os esforços de redução de emissões no novo acordo.
No entanto, a proposta de acordo não garante insumos para que essa meta seja atingida pelos países. Para Martin Kaiser, do Greenpeace International, um grande problema no texto é que as metas de redução que estão hoje na mesa de negociação – definidas antes da COP 21 pelos próprios países, e apresentadas através das chamadas contribuições nacionalmente definidas pretendidas (INDC, sigla em inglês) – não são suficientes para conter o aquecimento em 1,5 grau Celsius, e o texto apresentado nesta quinta não traz elementos que modifiquem esse cenário.
“Estamos testemunhando um exemplo de impotência internacional. Este texto deveria dizer aos países para voltarem com números melhores, mas ele mantém os números atuais, jogando a solução para daqui a 10 ou 15 anos. Será muito tarde, eles estão fechando a porta para nossa melhor chance de enfrentar esse aquecimento perigoso”, disse Kaiser.
Segundo o Observatório do Clima, o texto também faz referência à neutralidade carbônica (emissões compensadas por esforços de mitigação ou captura de carbono) na segunda metade deste século, tendo como base a equidade e guiada pela ciência no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza. “A referência a um objetivo de longo prazo sólido foi perdida, e há incerteza sobre o impacto das revisões sobre as metas dos países para 2025 e 2030, algo criticamente importante”, apontou o OC, que reforça também que o texto seria mais apropriado se trouxesse o texto “descarbonização da economia”, o que implica no desuso de combustíveis fósseis já nos próximos 35 anos.
Para alguns negociadores, o texto encaminha boa parte das questões que atormentavam as conversas na COP 21. “Com isto, eu poderei voltar para casa e dizer ao meu povo que nossa chance de sobrevivência não está perdida”, disse Tony de Brum, ministro do Exterior das Ilhas Marshall e uma das vozes mais estridentes na defesa do limite de aquecimento em 1,5 grau Celsius. Negociadores de Estados Unidos, União Europeia, do G77 + China (países em desenvolvimento), entre outros, também se revezaram no destaque dos pontos positivos do texto apresentado por Fabius.
Ainda assim, o trabalho promete. A última reunião de negociação varou a madrugada parisiense, terminando apenas às 5h da manhã de sexta (2h horário de Brasília). O esforço das últimas horas e a indefinição em pontos cruciais – basicamente, ambição, transparência, e financiamento – acabaram minando o cronograma defendido avidamente por Fabius desde o começo da COP 21. Resultado: as negociações não terminarão hoje às 18h, conforme previsto anteriormente. Como o novo texto somente será apresentado na manhã de sábado, espera-se que a Conferência do Clima de Paris se prolongue, ao menos, até amanhã à noite.