Nesta edição que chega ao número 100, homenageamos um personagem que iluminou o projeto da revista em seu nascedouro, quando nem havia ainda sido batizada de Página22. No número zero da então Adiante, Raimundo Arruda Sobrinho, nascido em 1938, protagonizou a seção “Última” quando fazia de lar o canteiro central da Avenida Pedroso de Morais, em bairro abastado de São Paulo.
Ancorado por 19 anos no espaço que apelidou de “Ilha”, vestindo sacos de plástico contra o frio, escrevia por todo dia mensagens nas chamadas “minipáginas”, e as entregava a quem pedisse. Na ocasião, perguntamos se ele se sentia excluído, ao que respondeu: “Nada quero. Então tenho tudo”.
Mas a vida quis ser mais generosa. O contato de uma moradora do bairro com o morador de rua e o acolhimento pelo Centro de Atenção Psicossocial permitiram que ele reencontrasse a família em Goiás e resgatasse o fio de sua história. Para nós, ele havia escrito: O pensamento/ com seus frutos encalhados na memória,/ polui as águas/ do abstrato oceano da imaginação. Eram os idos de 2005. Anos depois, os frutos se soltaram e as mensagens na garrafa ganharam o mar aberto.