Desde a década de 1970, quando o conceito de sustentabilidade começou a ser delineado, o mundo discute como conciliar desenvolvimento econômico, conservação do meio ambiente e proteção dos direitos das futuras gerações. Passados pouco mais de 40 anos, alguns avanços foram registrados, entre eles o acordo firmado na França em dezembro último, ao final da COP 21 (conferência do clima da ONU). Alguns meses depois, mudanças no cenário das relações internacionais colocam em xeque a euforia gerada pela assinatura do documento de Paris. As posições contrárias de forte candidato à sucessão do presidente Barack Obama nos Estados Unidos e os problemas vividos pela Europa com a crise migratória e o terrorismo são exemplos do que pode desviar o mundo da rota almejada pelos representantes dos países membros da Convenção do Clima.
A boa notícia é que em todo o emaranhado de interesses e de disputas travadas nas esferas da política e da diplomacia, há um elemento capaz de atuar como aglutinador de forças favoráveis ao tema. Por meio da análise de índices disponíveis no mercado financeiro, é possível afirmar que as empresas alinhadas às práticas sustentáveis se apropriam de ganhos em sua cadeia de valor e estão menos expostas a perdas inesperadas. Ou seja, para empresários e investidores, apostar em sustentabilidade não é uma opção ideológica, mas uma decisão financeiramente correta.
Tema em perspectiva
A definição mais usada de desenvolvimento sustentável – “suprir as necessidades da geração presente sem afetar a habilidade das gerações futuras de suprir as suas” – foi concebida pela ONU em 1987, mas só saiu do papel em 1997, com a assinatura do Protocolo de Kyoto. O tratado, endossado por 84 nações, estipulou compromissos para a redução da emissão dos gases considerados a causa do aquecimento global.
Em pouco tempo, porém, surgiram divergências entre os países ricos e os emergentes. Ficava claro que a capacidade de governos e empresas de cumprir o acordo seria limitada – assim, era preciso recorrer a outros agentes de mudança, e caberia principalmente aos investidores institucionais assumir esse papel. Eles logo perceberam que empresas e um mundo mais sustentáveis só seriam viáveis se investidores demandassem ativos com essa natureza.
Assim, nos últimos anos, tivemos um crescimento explosivo de iniciativas de adesão voluntária de empresas e investidores a práticas sustentáveis. O chamado PRI (Principles for Responsible Investment), conjunto de iniciativas lançado em 2006 pela ONU, serve de exemplo. O PRI possui hoje 1.505 signatários, com uma carteira de US$ 59 trilhões. Outro exemplo é o Carbon Disclosure Project (CDP), entidade sem fins lucrativos que em 2015 agregava 822 empresas signatárias, que juntas totalizavam mais de US$ 57 trilhões em ativos.
Apesar dos avanços, ainda não há uma definição padronizada para o que seriam investimentos sustentáveis. Com isso, nem todos os investidores – para não dizer quase nenhum – entendem corretamente esse subgrupo. Quando se fala no tema, normalmente vêm à cabeça noções restritas, como iniciativas nas áreas de energia limpa, reciclagem e reflorestamento ou até mesmo a exclusão de setores da indústria, como de tabaco, álcool e armas de fogo.
Pontos de consenso
Dentro dessa pluralidade de definições foram criados vários índices, cada um com particularidades metodológicas e, em alguns casos , com inclusões ou exclusões de determinados setores. A partir da criação desses índices, a indústria de fundos sustentáveis floresceu e atualmente conta com mais de US$ 21 trilhões.
Uma investigação mais profunda na constituição desses índices e nas políticas das gestoras mostra que, apesar das divergências, existem três temas sempre presentes e que formam um consenso. O primeiro é a Responsabilidade Ambiental definida como práticas de sustentabilidade. Ou seja, não é preciso ser uma geradora de energia eólica para ser sustentável ambientalmente – uma empresa do ramo de mineração ou do petróleo também pode ser sustentável.
A segunda é a Responsabilidade Social definida como cumprimento das leis do sistema onde a empresa está inserida. Significa que não é preciso trazer benesses a esse ou aquele grupo, basta cumprir as expectativas impostas pela sociedade. E, por último, a Sustentabilidade Empresarial, definida como adequação às melhores práticas de governança, econômicas e financeiras.
Neste ponto, é natural que um investidor imagine que a autoimposição de restrições de sustentabilidade reduzirá a diversificação e o retorno dos investimentos. Os dados mostram, porém, o oposto – os índices de investimentos sustentáveis dão resultados melhores do que os de mercado. Basta compararmos os dois principais índices globais.
Desde sua criação, em 1999, até o final de 2015, o Dow Jones Sustentability Index (DJSI) – que mede o desempenho de empresas listadas em bolsa líderes globais em sustentabilidade – supera o MSCI World, principal índice de ações global, em 1,37% ao ano em média.
Se estudarmos o caso do Brasil, a diferença é ainda mais evidente. Ao completar uma década de existência em novembro de 2015, o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE), que compara o desempenho das empresas listadas na BM&FBovespa sob o aspecto da sustentabilidade, superava em média tanto o Ibovespa (8,04% ao ano) quanto o IBRX (3,02% ano). A diferença gritante entre o mundo e o Brasil pode ser explicada pelo terceiro tema da sustentabilidade – empresarial –, pois casos como BVA, Cruzeiro do Sul, Grupo X e Petrobras, para citar os recentes, têm sido mais comuns aqui do que nos demais países.
Apesar dos bons resultados e do reconhecimento crescente pelo mundo, a indústria de investimentos sustentáveis no Brasil ainda se arrasta. Em um setor com 15 mil fundos de investimentos que movimentam R$ 2,9 trilhões, existem apenas 11 gestores oferecendo 17 fundos de ações, cujo patrimônio total mal supera R$ 700 milhões, além de duas ETFs, ICO2 e ISUS11.
Mesmo com baixíssima relevância na indústria, esses gestores nos oferecem evidências de que investimentos sustentáveis de fato geram valor para sociedade e para os investidores. A média ponderada de retorno desses 17 fundos supera o retorno do Ibovespa em 5,65% ao ano, desde o lançamento do primeiro deles, em 2001. Por isso, empresários e investidores devem analisar o tema em profundidade, pois existem ganhos potenciais. Para o empresário, as práticas geram redução significativa de riscos, com menos ocorrências de perdas. Do lado do investidor, quanto menor os riscos, mais estarão dispostos a pagar pelo investimento.
Temos nos investimentos sustentáveis, portanto, um raro jogo do ganha, ganha e ganha. Ganha a empresa, ganha o investidor e ganha a sociedade.
*Alberto Jacobsen é CEO da Risk Office, consultoria financeira