De acordo com cientistas, o ano de 2015 registrou a temperatura média global mais alta desde 1880, data em que começou-se a fazer este tipo de registro técnico. Nesses 136 anos, os dados apontam para uma tendência persistente de aumento gradual da temperatura do planeta, intensificada a partir das últimas décadas do século XX.
No entanto, os dados disponíveis não contam uma história completa do processo de aquecimento moderno do planeta. Afinal, em 1880, a Revolução Industrial e o consumo de combustíveis fósseis, particularmente carvão, já faziam parte da vida econômica ocidental havia algumas décadas. Tanto que, na Grã-Bretanha, já existiam leis referentes à poluição atmosférica decorrente da atividade industrial desde 1863 (com a promulgação do Alkali Act, que restringia a emissão de ácido clorídrico gasoso decorrente do processo Leblanc para produção de carbonato de sódio, importante para as indústrias de vidro, sabão, papel e têxtil, entre outras).
Ou seja, não temos um registro técnico confiável sobre a evolução da temperatura média global nas primeiras décadas da Revolução Industrial, exatamente o momento inicial do processo de aquecimento moderno do planeta.
Uma pesquisa recém-publicada na revista Nature explorou possíveis registros de temperatura das décadas anteriores a 1880, de forma a identificar quando e como apareceram os primeiros sinais de aquecimento a partir do aumento das emissões de gases de efeito estufa (GEE) decorrentes de atividades humanas.
Usando dados paleoclimáticos a partir do ano 1500 – o registro natural da temperatura do planeta contido em fontes naturais, como as bandas de crescimento de corais (nos oceanos tropicais) e árvores, além de núcleos de gelo (nos polos terrestres) – pesquisadores australianos liderados pelo professor Nerilie Abram, da Australian National University, conseguiram estimar que a temperatura da Terra começou a subir entre os anos 1830 e 1850.
A partir de simulações climáticas, os cientistas fizeram uma correlação entre os registros de temperatura nessas fontes naturais e o aumento das emissões de GEE das atividades das primeiras décadas de industrialização na Europa. A industrialização do século XIX resultou em pequenas subidas na concentração de GEE na atmosfera, mas a reação climática a essa mudança foi rápida, algo que surpreendeu os pesquisadores.
“O início do aquecimento detectado nesse estudo indica que o clima da Terra reagiu de forma rápida e mensurável ao pequeno aumento das emissões de carbono no começo da era industrial”, apontou Helen McGregor, da Universidade de Wollongong, uma das co-autoras do estudo, para o portal Climate Home.
Essa constatação é importante para entender até que ponto os dados de base de 1880 podem ser considerados como “normais” para efeito de comparação com os registros anuais posteriores de temperatura. Se levarmos em conta os dados analisados por este estudo, a Terra já pode ter superado o limite de aquecimento de 1,5 grau Celsius acima dos níveis pré-industriais, um dos objetivos de longo prazo definidos pelo Acordo de Paris na contenção das emissões de GEE e na mitigação dos efeitos da mudança do clima – ou seja, pode ser tarde demais para evitar algumas consequências negativas desse processo, como o degelo das calotas polares e o aumento subsequente do nível do mar.
Ao mesmo tempo, o estudo oferece uma esperança. Considerando a rapidez com que o sistema climático respondeu ao pequeno aumento na concentração de GEE na atmosfera no começo da era industrial, “há potencial de que isso possa ter um outro lado”, disse Nerilie Abram ao jornal Guardian. “Se pudermos fazer alguma coisa para diminuir as emissões de GEE, ou até mesmo começar a retirá-las da atmosfera, pode haver, pelo menos, algumas áreas do sistema climático em que teremos um rápido retorno [à normalidade]”.