Experiências internacionais ilustram como conciliar investimentos e crescimento econômico com uma agenda ambientalmente responsável de inclusão e combate à desigualdade
Do lançamento da Agenda 2030 aos compromissos assumidos na COP21, passando por centenas de reuniões e convenções, as nações são desafiadas a conciliar produção de energia e alimentos, extração de minérios e construção de infraestrutura com a necessidade de se preservar condições socioambientais essenciais para o futuro do planeta.
Enfrentar esse imenso desafio requer um arranjo de governança no qual Estado, setor produtivo e sociedade civil possam estabelecer acordos dialogados. Exige, ainda, que se tome em conta de forma cumulativa o impacto dos diversos projetos e empreendimentos.
Nesse contexto, têm surgido algumas iniciativas internacionais inspiradoras. O Fórum Econômico Mundial lançou recentemente uma publicação sobre o planejamento na escala da paisagem, ou Landscape-Scale Planning [1], no qual defende o planejamento territorial integrado e busca soluções para melhor gestão de riscos socioambientais, com mais segurança para o empreendimento e para as comunidades.
[1] World Economic Forum, Blueprints for a greener footprint: Sustainable Development and Landscape Scale, 2016.
Por meio de um amplo engajamento das partes interessadas, aliado à intervenção de especialistas, o processo de Landscape-Scale Planning parte de dados sobre biodiversidade, serviços ecossistêmicos, infraestrutura atual e desenvolvimento potencial para definir áreas essenciais para conservação da biodiversidade e prestação de serviços ecossistêmicos, áreas para um desenvolvimento futuro (ocupação ou exploração de recursos), áreas de uso complementar e áreas de possíveis conflitos.
Outro exemplo vem do governo de Victoria, estado da Austrália, através do Earth Resources Regulation, serviço vinculado ao Departamento de Desenvolvimento Econômico que reúne dados de geociência, serviços para a promoção de investimentos e amplo arcabouço regulatório, além de possuir sólida estratégia de engajamento de comunidades em todo o processo de planejamento territorial. A estratégia baseia-se em acesso à informação, consulta, participação, consideração e aprimoramento contínuo. O sistema permite estabelecer vastos planos de uso e ocupação territorial, conciliando estratégias governamentais, interesses econômicos e função social do território.
Mais uma linha de trabalho vem sendo desenvolvida por uma tradicional região mineradora do Norte da França (Hauts-de-France), em parceria com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig).
O projeto Riquezas Compartilhadas promove o diagnóstico das múltiplas formas de riquezas presentes nos territórios, além da identificação e análise dos meios de compartilhamento dessas riquezas entre as populações dos territórios estudados. A abordagem estabelece alguns componentes do território, como: Riqueza Humana e Social; Lugares de Enriquecimento Cultural; Equipamentos e Economia do Conhecimento; Riqueza Social e Econômica; Áreas Industriais e de Mineração, entre outros.
Uma governança territorial mais integrada apresenta uma série de obstáculos institucionais. É preciso buscar novas soluções, modelos, recortes territoriais e pactos sociais. Nesse sentido, o governo colombiano regulamentou uma nova figura administrativa reconhecendo territórios indígenas como unidades administrativas autônomas, tornando-os praticamente “municípios”. A regulamentação prevê “Planos de Vida”, como instrumentos de ordenamento territorial e planejamento , abrindo caminhos para formas de governança territorial que garantam o direito das populações tradicionais em definir os rumos de seu desenvolvimento.
O Brasil também vem percorrendo seus próprios caminhos. Um exemplo é o Programa Territórios Sustentáveis, que propõe a comunidades Quilombolas da Amazônia um planejamento territorial integrado vinculado à criação de mecanismos financeiros comunitários. Com isso, busca não só uma participação de cada um dos atores, mas também mais eficiência e viabilidade na implementação dos planos.
Essas experiências ilustram uma prática da governança territorial baseada na gestão integrada, conciliando investimentos e crescimento econômico com um desenvolvimento de fato inclusivo e centrado na redução das desigualdades.
Mais do que nunca, antecipando a chegada de um novo ciclo de crescimento econômico e consequentemente de uma grande pressão sobre os territórios, é preciso que órgãos governamentais e empresas olhem para essas experiências, entendam a exigência do momento e atualizem suas estratégias. Disso dependerá o sucesso de uma agenda nacional de desenvolvimento para todos.
*Sócio-fundador da HUMANA – Serviços em Sustentabilidade e secretário técnico do Grupo de Diálogo Latino-Americano: Mineração, Democracia e Desenvolvimento Sustentável