Como o Brasil se tornou uma referência internacional ao articular e implementar a Estratégia Nacional de Investimentos e Negócios de Impacto
Vivemos o início de uma revolução no capitalismo global, na qual investimentos devem aliar retorno financeiro com impacto social. O motivo dessa transformação é a percepção de que os desafios enfrentados pela humanidade hoje são tão complexos que o governo e o setor privado não conseguirão resolver sozinhos.
No Brasil, o setor público em geral é pouco eficiente, oferece serviços de baixa qualidade e enfrenta dificuldades imensas para inovar. Já as ações de responsabilidade social das empresas ou do Terceiro Setor mostram-se claramente insuficientes perante o tamanho do desafio. Por outro lado, vemos a tecnologia avançando em ritmo alucinante: nunca foi tão fácil empreender negócios inovadores por meio de tecnologias digitais amplamente disponíveis, a baixo custo e com número crescente de investidores.
A união de desafios complexos e alto potencial de inovação é o caldo perfeito para impulsionar investimentos e negócios de impacto social no Brasil – e o setor público deve fazer sua parte. O governo pode atuar no desenvolvimento deste segmento por meio de três papéis: facilitador, participante e regulador.
No de facilitador, cria organizações e sistemas que fomentam e disseminam o tema, por exemplo, apoiando a criação de negócios de impacto, incubadoras, aceleradoras, programas de capacitação e políticas públicas.
Como participante do mercado, o governo atua no acesso a capital, como fundos de investimentos e instrumentos financeiros, compras públicas e sistema de contratação baseado em pagamentos por performance.
Finalmente, o governo pode exercer o papel de regulador, oferecendo incentivos fiscais tanto aos investidores quanto aos negócios, criando personalidades jurídicas de empresas específicas para impacto e influenciando investidores institucionais para considerarem o impacto em suas decisões de alocação.
O Brasil tem se posicionado como um protagonista mundial em políticas públicas nessa área. A Estratégia Nacional de Investimentos e Negócios de Impacto (Enimpacto), liderada pela Subsecretaria de Inovação do Ministério da Economia, foi reconhecida como benchmarking pela OCDE, pelo Fórum Econômico Mundial e pelo Global Steering Group on Impact Investment (GSG).
A Enimpacto alinhou as prioridades nacionais com as internacionais do GSG e escolheu quatro grandes áreas de atuação: aumentar capital disponível para investimento e financiamento, elevar o número de negócios de impacto, fortalecer os intermediários (incubadoras, aceleradoras, universidades etc.) e aperfeiçoar o marco regulatório para este segmento.
Engajamento
Um aspecto interessante dessa iniciativa foi a maneira inovadora como uma pequena equipe de servidores públicos do Ministério conseguiu articular e envolver dezenas de áreas do governo em torno da temática de impacto. Após estabelecer parceria com a Aliança pelos Investimentos e Negócios de Impacto, a equipe mapeou no governo federal as unidades de cada agência e ministério que teriam algo a contribuir para a Estratégia. Em seguida, “evangelizou” cada área-alvo sobre a importância do tema por meio de apresentações customizadas para aquela unidade específica.
Após o engajamento, todos esses órgãos governamentais foram convidados a cocriar a política pública com os atores do ecossistema de impacto: investidores, aceleradoras, empreendedores, dentre outros. O último passo foi lançar uma consulta pública para que qualquer cidadão pudesse dar sua contribuição para a Enimpacto.
Após 18 meses, mais de 150 reuniões e muita resiliência, essa equipe conseguiu transformar um tema desconhecido dentro do governo em um decreto assinado pela presidência da República, criando uma política pública com horizonte de 10 anos e reconhecida internacionalmente. A gestão da Enimpacto também é colaborativa e está nas mãos de 16 organizações de governo e 10 do setor privado e da sociedade civil.
Governos deveriam apoiar com ênfase o desenvolvimento de investimentos e negócios de impacto simplesmente porque é um bom negócio. Esse segmento gera desenvolvimento econômico com empresas inovadoras e empregos qualificados que pagam mais impostos, aumenta a eficiência da administração economizando recursos do contribuinte e, finalmente, usa modelos de negócio inovadores para resolver problemas sociais do cidadão. Em resumo: pode gerar receita, diminuir custos, atender melhor a sociedade e ainda colher dividendos políticos com a melhora de vida da população.
*Subsecretário de Ciência, Tecnologia e Inovação da Secretaria de Desenvolvimento Econômico do Estado de São Paulo e ex-Secretário Nacional de Inovação do MDIC