Estudo do Inesc revela total destinado aos setores de petróleo, gás e carvão por meio de isenção de impostos, regimes especiais de tributação e verba garantida no Orçamento. Volume equivale a 24 vezes o valor repassado ao Ministério do Meio Ambiente no ano passado
O governo federal concedeu R$ 85 bilhões em subsídios no ano passado para auxiliar os produtores de petróleo, carvão mineral e gás natural no País, assim como garantir aos consumidores um preço menor na aquisição desses produtos. Este é o resultado do estudo Subsídios aos Combustíveis Fósseis no Brasil em 2018: Conhecer, Avaliar, Reformar, lançado em meados de junho pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), que atua na promoção dos direitos humanos e da democracia.
Para chegar a essa cifra, a organização somou todo o dinheiro que deixou de entrar nos cofres públicos – devido aos inúmeros regimes especiais de tributação e programas de isenção de impostos –, mais os recursos oriundos do Orçamento da União para incentivar a atividade.
“Queremos ampliar o debate sobre a necessidade de tantos subsídios, sobretudo neste momento em que a economia passa por graves problemas, o corte dos gastos públicos virou pauta recorrente na política e o mundo assiste aos impactos sociais e ambientais causados pelos combustíveis fósseis”, afirma a pesquisadora Alessandra Cardoso, assessora política do Inesc.
“Com essa publicação, damos continuidade ao trabalho iniciado em 2018, quando apresentamos o balanço de subsídios aplicados entre 2013 a 2017 no setor, com o objetivo de conhecer, avaliar e reformar possíveis distorções neste cenário”, completa Nathalie Beghin, também autora do estudo. Ela lembra que R$ 85 bilhões equivalem a 2,8 vezes o orçamento do Bolsa Família ou 24 vezes o valor repassado ao Ministério do Meio Ambiente (R$3,49 bilhões) no ano passado.
O levantamento dividiu os subsídios voltados à produção e ao consumo de combustíveis fósseis. No primeiro caso, estão os regimes tributários especiais, com destaque para a suspensão da cobrança de impostos como IPI e PIS/Cofins às empresas beneficiárias do Regime Aduaneiro Especial de Exportação e de Importação de Bens destinados às Atividades de Pesquisa e de Lavra das Jazidas de Petróleo e de Gás Natural (Repetro). No total, os benefícios concedidos aos produtores de petróleo, gás e carvão natural respondem por 27% dos subsídios ou R$ 22,89 bilhões no ano.
“Importante lembrar que a aprovação do regime tributário especial para as petroleiras e a renovação do Repetro ocorreram no contexto de grande produção no Pré-Sal, beneficiando não apenas a Petrobras, como também as empresas estrangeiras”, alerta Alessandra.
De acordo com o estudo, alguns campos de exploração de petróleo e gás não só poderiam ser rentáveis sem os subsídios, mas também seriam capazes de contribuir com R$ 22,89 bilhões em impostos no ano passado – quantia superior à economia que o governo pretende alcançar em dez anos cortando os direitos de aposentados rurais, conforme a proposta da Reforma da Previdência enviada ao Congresso Nacional.
Já os subsídios ao consumo, que atingiram R$ 62,24 bilhões ou 73% do montante total, abrangem a diminuição das alíquotas para diesel e gasolina do PIS/Cofins (perda de R$ 2,88 bilhões) e da Cide (R$ 47,4 bilhões). A situação se agravou com a greve dos caminhoneiros, há cerca de um ano, quando o governo diminuiu o preço do óleo diesel em R$ 0,16/litro. Na ocasião, foi aprovada uma subvenção (recursos orçamentários ou gastos diretos do Orçamento da União) de até 9,5 bilhões para compensar os produtores, dos quais foram gastos R$ 4,81 bilhões em 2018. Somam-se ainda as contribuições pagas pelos consumidores nas contas de consumo de energia.
“Os subsídios ao consumo de combustíveis fósseis, tanto para transporte como para geração de energia, representam uma grande despesa para os cofres públicos, distorcem o sistema de preços, não levam em conta os elevados custos ambientais e sociais associados ao seu uso e dificultam a busca de alternativas”, enfatiza Alessandra.
Diante desses números, o estudo do Inesc propõe: a) aprovação de uma lei que torne pública quais empresas se beneficiam de renúncias e seus valores; b) discussão com a sociedade sobre a relevância dos subsídios aos combustíveis fósseis; c) acordo para o estabelecimento de uma metodologia de mensuração desses subsídios; d) divulgação das informações sobre tipos de renúncias, como o Repetro; d) participação das discussões sobre o tema no G20. Além desses objetivos, o Inesc segue pautando suas atividades com o intuito de tornar transparentes certos dados estatais. Hoje sabemos muito pouco sobre quem recebe os subsídios e quais os valores recebidos por eles. O sigilo sobre eles impede a sociedade de saber se os benefícios prometidos estão sendo efetivos e se valem a pena. Trazer esses números à tona é evitar a corrupção, combater os privilégios, diminuir a injustiça e reduzir as desigualdades no Brasil.
A seguir, alguns números:
- Combustíveis fósseis receberam 85 bilhões em subsídios em 2018
- Esse número representa mais de 1% do PIB de 2018, que foi de 6,8 trilhões
- Os gastos tributários foram de 4,2 bilhões, representando 5% do total
- Outras renúncias foram de 69,1 bilhões, representando 81% do total
- Os gastos orçamentários diretos foram de 11,8 bilhões, representando 14% do total
- O valor de 85 bilhões representa 2,8 vezes o orçamento do Bolsa Família, de 30 bilhões
- O valor de 85 bilhões representa 2 vezes os recursos do seguro-desemprego, de 40,6 bilhões
- O valor de 85 bilhões representa 24 vezes o orçamento total do Ministério do Meio Ambiente, de 3,49 bilhões
- Os subsídios à produção (Repetro, Reide, Reporto, entre outras isenções fiscais) representaram 27% do total, somando 22,89 bilhões
- Os subsídios ao consumo (PIS/Cofins, Cide, entre outros) representaram 73% do total, somando 62,24 bilhões
- Em 2016, o Repetro teve um total de 13 bilhões em renúncias. A informação foi dada via Lei de Acesso À Informação
- O Inesc calcula que, em 2018, o Repetro teve um total de 16 bilhões em renúncias. O número não foi fornecido com atualização pelo Governo.
- Com a MP do Trilhão (Lei 13.586/2017), o governo deixou de arrecadar 5,62 bilhões de empresas do ramo. A Lei entrou em vigor em 2018.
- Em 2016, o Brasil se torna o nono produtor mundial de petróleo e outros líquidos, sendo o terceiro nas Américas (depois de EUA e Canadá).
- Em 2018, novo recorde de produção: 977,31 milhões de barris equivalentes de petróleo.
- Se sem os subsídios o setor de Petróleo e Gás estivesse produzindo nos mesmos patamares o Governo teria arrecadado mais 22,89 bilhões em 2018.
- Esse número representa 3 bilhões a mais do que o governo pretende arrecadar com uma década de retirada de direitos de aposentados rurais, segundo a reforma da previdência.
- Esse número representa um aumento de 6,6 vezes no orçamento anual do Ministério do Meio Ambiente.
- Com a greve dos caminhoneiros, o governo decidiu diminuir o preço do óleo diesel em R$ 0,16/litro.
- Foram reduzidos 11 centavos/litro no PIS/Cofins
- Foram reduzidos 6 centavos/litro da CIDE-combustível, ou seja, ela foi zerada.
- A subvenção estipulada do Orçamento Geral da União foi de até R$ 9,5 bilhões em 2018. A subvenção foi de 4,81 bilhões.
- A perda de receita do Governo foi de R$ 4 bilhões, sendo 2,75 bilhões por conta da redução do PIS/Cofins e 1,25 bilhão em função da zeragem da Cide-combustível. Essas são as estimativas.
- De acordo com cálculo do Inesc, as perdas foram de 2,88 bilhões para o PIS/Cofins (126 milhões a mais que o calculado de 2,75 bilhões) e de 1,31 bilhão para o Cide-combustível (57,5 milhões a mais do que o estimado de 1,25 bilhão).
- O INESC considerou a arrecadação potencial com base no que a lei estabelece como limite. Assim, teremos uma perda de receita de Cide e PIS/Cofins chegando a 50,42 bilhões.
- O número é dividido em 18,39 bilhões da Cide para óleo diesel; 29,14 bilhões da Cide para gasolina; 2,88 bilhões do PIS/Cofins sobre o diesel.
- Em 2010, 47% das emissões de CO2 vinham do setor de energia.
- No setor de energia, 96% das emissões vem por queima de combustíveis fósseis. Desse número, 48,9% está relacionado ao setor de transporte.