O mundo oriental nas artes
Várias direções tratam o conflito árabe-israelense nas telas de cinema
Um israelense e um palestino. Dois olhares sobre a aparente interminável disputa no Oriente Médio. O cineasta israelense Amos Gitai tem um olhar profundo, por vezes culpado, mas, sobretudo, “problematizante” sobre o conflito. “Ele entende que a rivalidade vai além da disputa por territórios, mostra a dificuldade de comunicação, aponta o quanto é difícil entrar em universos diferentes”, explica o crítico de cinema Marcelo Miranda, editor da revista eletrônica Filmes Polvo e um dos curadores do último Festival de Brasília.
Já o palestino Elia Suleiman tem a ironia como característica marcante em seus filmes. “Em certo sentido é menos sério que o Gitai, porque retrata sua própria experiência com uma dose de sátira. Mas esse olhar debochado só é possível para quem está dentro da realidade e apto a fazer essa intervenção”, analisa Miranda.
Outro destaque é Valsa para Bashir. Entre o documentário e a ficção, a animação é uma remontagem do que teria acontecido quando o diretor e cineasta Ari Folman participou de uma missão na Guerra do Líbano, no início dos anos 80, quando israelenses invadiram o país com apoio de milícias cristãs libanesas, ocasião em que ocorreu o Massacre de Sabra e Chatila. Como ele de nada se lembra devido a blecaute na memória, passa a buscar e entrevistar seus velhos companheiros de época. “O filme serve para expurgar esse pensamento ou delírio do cineasta, é um dos grandes filmes políticos que perpassam as questões do mundo árabe-israelense”, afirma o crítico.
Dicas do crítico:
De Amos Gitai: Aproximação (2007) e Kedma (2002)
De Elia Suleiman: Intervenção Divina (2002) e O Que Resta do Tempo (2009)
De Ari Folman: Valsa Para Bashir (2008)
Outras dicas
Caramelo (2007) – Singela e poética, essa coprodução Líbano/França é dirigida por Nadine Labaki, que também atua no filme. Caramelo aborda assuntos como amor, ilusão, homossexualidade e envelhecimento, vividos por mulheres em torno de um salão de beleza em Beirute.
Paradise Now (2005) – Fanatismo, religião, guerra. Amigos de infância, os palestinos Khaled (Ali Suliman) e Said (Kais Nashef) são recrutados para um atentado suicida em Tel-Aviv. A operação não sai como o planejado e eles acabam se separando. Com bombas escondidas em seus corpos, Khaled e Said devem enfrentar seus destinos e defender suas convicções.
A Grande Viagem (2004) – A religião e a cultura islâmica e os valores familiares estão neste bonito road movie. Imagens comoventes da viagem que vai do Sul da França a Meca, na Arábia Saudita, e a transformação do relacionamento entre pai e filho.
Do Outro Lado (2007) – Um drama (foto) que trata de forma contundente a questão da imigração e as identidades fragmentadas e perdidas. Não por acaso, o diretor Fatih Akin nasceu na Alemanha, mas seus pais são turcos. Cinema político sem ser panfletário.
Miragens
As visões estereotipadas que o Ocidente construiu sobre o Oriente ali estão com a poderosa intervenção dos artistas. Seja no humor e/ou na crítica, esses artistas contemporâneos que compartilham a matriz cultural islâmica desarticulam nossa visão, trazendo frescor e consciência em relação a estas sociedades. De um lado da exposição Miragens vemos a tradição reinventada, no outro podemos ver obras impactantes, onde o alvo passa a ser você. Vale a pena observar:
As telas de Laila Shawa – Crianças são o centro de um tabuleiro de tiro ao alvo (foto), a bandeira dos EUA tem como fundo um cenário pós-explosão de bomba, símbolos da globalização são aplicados em ícones da cultura islâmica.
A série Supermuçulmano, de Sener Ozmen – sátira com o Super-Homem. Em vez de fazê-lo voar, sua capa serve para que se ajoelhe e faça as preces.
O vídeo de Halil Altindere – por alguns segundos, nós nos transformamos no alvo de um atirador. Alusão ao olhar de fora, sempre carregado de estigmas.
O vídeo de Khaled Hafez – também na linha do humor, coloca um homem com cabeça de cavalo andando por várias cenas documentais do Líbano, passeatas, bandeiras, mulheres usando véu. Miragens está em cartaz no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo. Gratuito.