Fontes fósseis ainda representam 85% da energia utilizada nas usinas de aço
A travessia que o setor de aço pretende fazer no Brasil para ter uma matriz energética significativamente mais limpa mal começou. O problema maior é que a embarcação parece ancorada. Entre 2007 e 2009, segundo dados do Instituto Aço Brasil (IABr), que congrega as principais empresas siderúrgicas, o uso de fontes renováveis – basicamente hidreletricidade e carvão vegetal – estancou na fatia de 15% da energia total consumida na produção de ferro-gusa e aço. A entidade ainda não divulgou dados referentes a 2010. Também é difícil conseguir informação clara, de fácil leitura e atualizada sobre a evolução das fontes renováveis na matriz energética das siderúrgicas.
Das quatro maiores companhias do ramo – ArcelorMittal, Usiminas, Gerdau e CSN -, somente a segunda dispunha no fim de julho de relatório de sustentabilidade relativo a 2010 com informações sobre a participação das renováveis, disponível na internet. Mesmo assim, a informação está um pouco prejudicada, pela não desagregação dos dados sobre energia elétrica relativamente às diferentes fontes. Resta supor que o consumo elétrico da Usiminas segue, grosso modo, o perfil da matriz de energia elétrica brasileira, em que hidreletricidade e biomassa representam cerca de 75% da matriz elétrica gerada. Temos, então, que a porção renovável da energia utilizada no ano passado pelas duas fábricas da companhia, localizadas em Ipatinga (MG) e Cubatão (SP), teria atingido 5,2%. Como os números do consumo de energia elétrica restringem-se a 2010, não é possível saber se houve aumento da fatia renovável da matriz energética da Usiminas em relação a 2009.
O carvão mineral, principal emissor de gás carbônico entre os combustíveis fósseis, responde sozinho por 60% da energia empregada nos processos de produção do segmento. Óleo, gás natural e coque são outras fontes sujas utilizadas. Não é à toa que a siderurgia é um dos setores que mais libera CO2 na atmosfera – em torno de 30% das emissões globais da indústria, segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE). E utiliza energia tão intensamente que responde por quase um quinto do consumo total do insumo pela indústria.
O IABr não soube dizer quando – e como – o barco navegará em direção a um porto seguro. De acordo com o instituto, o setor siderúrgico está muito à frente de seus concorrentes internacionais no que tange ao uso de fontes renováveis de energia. “A utilização do carvão vegetal como biorredutor (processo em que o carbono contido no carvão remove o oxigênio do minério de ferro) envolve uma tecnologia utilizada apenas no Brasil, que responde por aproximadamente 5% da produção nacional de aço”, observa o último relatório de sustentabilidade do IABr.
Ações para limpar a matriz energética esbarram em obstáculos técnicos e econômicos. Como a tecnologia existente foi desenvolvida para utilizar o coque na produção de ferro-gusa, a substituição do insumo por carvão vegetal nos altos-fornos demanda novos investimentos para que o material possa ser usado em maior escala. O temor da indústria é de que essa troca tecnológica afete a produtividade das empresas brasileiras, que atuam em um mercado conhecido por ser altamente competitivo.
Outro empecilho: não haveria oferta suficiente de carvão vegetal de reflorestamento para substituir totalmente o carvão mineral hoje utilizado pela indústria do aço no País. Portanto, a troca do insumo fóssil pelo vegetal tende a ser gradual, a depender do ritmo dos investimentos no plantio de eucalipto pelas siderúrgicas, avaliam analistas do setor.
No caso das empresas que navegam exclusivamente pela Amazônia brasileira, outros problemas ainda mais graves precisam ser resolvidos para que o passivo ambiental da siderurgia diminua de maneira mais intensa e veloz. Estudo publicado no final de junho pelo Observatório Social afirma que na Região Norte “grandes siderúrgicas operam com alto índice de ilegalidade”. Das oito empresas investigadas na pesquisa O Aço da Devastação, quatro produziram aço em 2010 com carvão vegetal de origem suspeita, provavelmente de floresta nativa desmatada ilegalmente.
(Colaborou José Alberto Gonçalves Pereira)[:en]Fontes fósseis ainda representam 85% da energia utilizada nas usinas de aço
A travessia que o setor de aço pretende fazer no Brasil para ter uma matriz energética significativamente mais limpa mal começou. O problema maior é que a embarcação parece ancorada. Entre 2007 e 2009, segundo dados do Instituto Aço Brasil (IABr), que congrega as principais empresas siderúrgicas, o uso de fontes renováveis – basicamente hidreletricidade e carvão vegetal – estancou na fatia de 15% da energia total consumida na produção de ferro-gusa e aço. A entidade ainda não divulgou dados referentes a 2010. Também é difícil conseguir informação clara, de fácil leitura e atualizada sobre a evolução das fontes renováveis na matriz energética das siderúrgicas.
Das quatro maiores companhias do ramo – ArcelorMittal, Usiminas, Gerdau e CSN -, somente a segunda dispunha no fim de julho de relatório de sustentabilidade relativo a 2010 com informações sobre a participação das renováveis, disponível na internet. Mesmo assim, a informação está um pouco prejudicada, pela não desagregação dos dados sobre energia elétrica relativamente às diferentes fontes. Resta supor que o consumo elétrico da Usiminas segue, grosso modo, o perfil da matriz de energia elétrica brasileira, em que hidreletricidade e biomassa representam cerca de 75% da matriz elétrica gerada. Temos, então, que a porção renovável da energia utilizada no ano passado pelas duas fábricas da companhia, localizadas em Ipatinga (MG) e Cubatão (SP), teria atingido 5,2%. Como os números do consumo de energia elétrica restringem-se a 2010, não é possível saber se houve aumento da fatia renovável da matriz energética da Usiminas em relação a 2009.
O carvão mineral, principal emissor de gás carbônico entre os combustíveis fósseis, responde sozinho por 60% da energia empregada nos processos de produção do segmento. Óleo, gás natural e coque são outras fontes sujas utilizadas. Não é à toa que a siderurgia é um dos setores que mais libera CO2 na atmosfera – em torno de 30% das emissões globais da indústria, segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE). E utiliza energia tão intensamente que responde por quase um quinto do consumo total do insumo pela indústria.
O IABr não soube dizer quando – e como – o barco navegará em direção a um porto seguro. De acordo com o instituto, o setor siderúrgico está muito à frente de seus concorrentes internacionais no que tange ao uso de fontes renováveis de energia. “A utilização do carvão vegetal como biorredutor (processo em que o carbono contido no carvão remove o oxigênio do minério de ferro) envolve uma tecnologia utilizada apenas no Brasil, que responde por aproximadamente 5% da produção nacional de aço”, observa o último relatório de sustentabilidade do IABr.
Ações para limpar a matriz energética esbarram em obstáculos técnicos e econômicos. Como a tecnologia existente foi desenvolvida para utilizar o coque na produção de ferro-gusa, a substituição do insumo por carvão vegetal nos altos-fornos demanda novos investimentos para que o material possa ser usado em maior escala. O temor da indústria é de que essa troca tecnológica afete a produtividade das empresas brasileiras, que atuam em um mercado conhecido por ser altamente competitivo.
Outro empecilho: não haveria oferta suficiente de carvão vegetal de reflorestamento para substituir totalmente o carvão mineral hoje utilizado pela indústria do aço no País. Portanto, a troca do insumo fóssil pelo vegetal tende a ser gradual, a depender do ritmo dos investimentos no plantio de eucalipto pelas siderúrgicas, avaliam analistas do setor.
No caso das empresas que navegam exclusivamente pela Amazônia brasileira, outros problemas ainda mais graves precisam ser resolvidos para que o passivo ambiental da siderurgia diminua de maneira mais intensa e veloz. Estudo publicado no final de junho pelo Observatório Social afirma que na Região Norte “grandes siderúrgicas operam com alto índice de ilegalidade”. Das oito empresas investigadas na pesquisa O Aço da Devastação, quatro produziram aço em 2010 com carvão vegetal de origem suspeita, provavelmente de floresta nativa desmatada ilegalmente.
(Colaborou José Alberto Gonçalves Pereira)