AMARÉCOMPLEXO AMARÉSIMPLES
Quem chega ou sai motorizado do Rio de Janeiro pode ver duas faixas inscritas cada uma com uma frase: de um lado “amarésimples”; do outro “amarécomplexo”. As frases inventadas pelo artista Marcos Chaves estão bem ali, fazendo um alerta-inscrição em uma das maiores favelas da cidade, o Complexo da Maré, com seus 140 mil habitantes. Prudentemente, os governos construíram um muro que impede a vista completa da multidão de barracos espalhados na paisagem. Mas os moradores da Maré estão atravessando essas barreiras de outras maneiras. Uma delas é o projeto Travessias, que já está na segunda edição.
O galpão de uma antiga fábrica de copos descartáveis usados em fast-foods transformou-se no Galpão Bela Maré. Porque transpor muros começa também pela palavra.
A ocupação do espaço começou em 2011, com a primeira edição de uma exposição de arte contemporânea na comunidade, o Travessias 1. “Nossa ideia é colocar a Maré no circuito de artes visuais do Rio”, conta a produtora do Galpão Bela Maré, Fabiana Gomes. Ano passado, outros projetos artísticos se desenvolveram no espaço e agora, para quem quiser dar uma espiada, o Travessias 2 traz nada menos que: Ernesto Neto, Vik Muniz (imagem acima), Lucas Bambozzi, Daniel Senise, entre outros grandes nomes da arte contemporânea no Brasil. Ao lado deles está Ratão Diniz (foto abaixo), fotógrafo da Maré, formado no Imagens do Povo, a escola de fotografia do Observatório de Favelas que, junto com a empresa Automatica, assina a empreitada.
Mês passado, a antiga professora de Ratão levou a turma da escola pra mostrar a obra do ex-aluno ilustre. Só orgulho. Ratão tem uma sala exclusiva para seu trabalho fotográfico. “Queremos que o projeto avance no sentido de termos artistas de muitas comunidades da cidade”, conta Fabiana Gomes.
As palavras de Marcos Chaves, que fizeram sucesso na primeira edição do projeto, voltaram à Avenida Brasil e o artista cedeu os direitos para a confecção de camisetas. Os recursos da venda serão usados na construção da universidade das artes, que se pretende construir na Maré.
O Travessias 2 inclui, além da exposição, oficinas de arquitetura que resultarão numa maquete da favela Nova Holanda, parte do Complexo; e outra de design para produção de cartazes que serão parte do catálogo final da mostra.
Fabiana diz que a comunidade tem se apropriado do Galpão Bela Maré e começa a interagir com as obras de arte. “Muitas crianças chegam até aqui com a escola e, depois, voltam com a família. Temos também um encontro com um artista a cada sábado, o que aproxima os trabalhos das pessoas que vivem na Maré”, acrescenta.
O Observatório de Favelas entende que o Travessias 2 é mais do que um evento, mas um encontro, o que balança a perspectiva expositor/visitante. “É uma cumplicidade, uma vez que o que será exposto é para ser vivido, compartilhado, experimentado em sua plenitude. É também a superação de distâncias entre sujeitos criadores e plateias admiradas, pois na mostra não se aguardam visitas ou visitantes”, descrevem os organizadores.
Há muito boas perguntas que se fazem pertinentes e que o projeto aguça (em filosofia, trata-se bem mais de encontrar e formular o problema do que de resolvê-lo, diz o filósofo francês Henri Bergson em Memória e Vida). Como a arte, como expressão da vida social, se faz presente em comunidades populares? Como a arte feita na Maré representa a vida da própria comunidade, marcada pela violência e pelo estigma social? Como a arte contemporânea, muitas vezes vista como uma “arte de elite”, pode se inserir na comunidade da Maré sem ser impositiva, mas dialógica?
SERVIÇO:
Travessias 2 – Arte Contemporânea na Maré
Até 23 de junho, de 4ª a domingo
Galpão Bela Maré
Entrada gratuita
Rua Bittencourt Sampaio, 169. Entre as passarelas 9 e 10 da Avenida Brasil
Favela da Maré – Rio de Janeiro[:en]
AMARÉCOMPLEXO AMARÉSIMPLES
Quem chega ou sai motorizado do Rio de Janeiro pode ver duas faixas inscritas cada uma com uma frase: de um lado “amarésimples”; do outro “amarécomplexo”. As frases inventadas pelo artista Marcos Chaves estão bem ali, fazendo um alerta-inscrição em uma das maiores favelas da cidade, o Complexo da Maré, com seus 140 mil habitantes. Prudentemente, os governos construíram um muro que impede a vista completa da multidão de barracos espalhados na paisagem. Mas os moradores da Maré estão atravessando essas barreiras de outras maneiras. Uma delas é o projeto Travessias, que já está na segunda edição.
O galpão de uma antiga fábrica de copos descartáveis usados em fast-foods transformou-se no Galpão Bela Maré. Porque transpor muros começa também pela palavra.
A ocupação do espaço começou em 2011, com a primeira edição de uma exposição de arte contemporânea na comunidade, o Travessias 1. “Nossa ideia é colocar a Maré no circuito de artes visuais do Rio”, conta a produtora do Galpão Bela Maré, Fabiana Gomes. Ano passado, outros projetos artísticos se desenvolveram no espaço e agora, para quem quiser dar uma espiada, o Travessias 2 traz nada menos que: Ernesto Neto, Vik Muniz (imagem acima), Lucas Bambozzi, Daniel Senise, entre outros grandes nomes da arte contemporânea no Brasil. Ao lado deles está Ratão Diniz (foto abaixo), fotógrafo da Maré, formado no Imagens do Povo, a escola de fotografia do Observatório de Favelas que, junto com a empresa Automatica, assina a empreitada.
Mês passado, a antiga professora de Ratão levou a turma da escola pra mostrar a obra do ex-aluno ilustre. Só orgulho. Ratão tem uma sala exclusiva para seu trabalho fotográfico. “Queremos que o projeto avance no sentido de termos artistas de muitas comunidades da cidade”, conta Fabiana Gomes.
As palavras de Marcos Chaves, que fizeram sucesso na primeira edição do projeto, voltaram à Avenida Brasil e o artista cedeu os direitos para a confecção de camisetas. Os recursos da venda serão usados na construção da universidade das artes, que se pretende construir na Maré.
O Travessias 2 inclui, além da exposição, oficinas de arquitetura que resultarão numa maquete da favela Nova Holanda, parte do Complexo; e outra de design para produção de cartazes que serão parte do catálogo final da mostra.
Fabiana diz que a comunidade tem se apropriado do Galpão Bela Maré e começa a interagir com as obras de arte. “Muitas crianças chegam até aqui com a escola e, depois, voltam com a família. Temos também um encontro com um artista a cada sábado, o que aproxima os trabalhos das pessoas que vivem na Maré”, acrescenta.
O Observatório de Favelas entende que o Travessias 2 é mais do que um evento, mas um encontro, o que balança a perspectiva expositor/visitante. “É uma cumplicidade, uma vez que o que será exposto é para ser vivido, compartilhado, experimentado em sua plenitude. É também a superação de distâncias entre sujeitos criadores e plateias admiradas, pois na mostra não se aguardam visitas ou visitantes”, descrevem os organizadores.
Há muito boas perguntas que se fazem pertinentes e que o projeto aguça (em filosofia, trata-se bem mais de encontrar e formular o problema do que de resolvê-lo, diz o filósofo francês Henri Bergson em Memória e Vida). Como a arte, como expressão da vida social, se faz presente em comunidades populares? Como a arte feita na Maré representa a vida da própria comunidade, marcada pela violência e pelo estigma social? Como a arte contemporânea, muitas vezes vista como uma “arte de elite”, pode se inserir na comunidade da Maré sem ser impositiva, mas dialógica?
SERVIÇO:
Travessias 2 – Arte Contemporânea na Maré
Até 23 de junho, de 4ª a domingo
Galpão Bela Maré
Entrada gratuita
Rua Bittencourt Sampaio, 169. Entre as passarelas 9 e 10 da Avenida Brasil
Favela da Maré – Rio de Janeiro