Ainda são frequentes processos decisórios que não contam com a participação e a transparência necessárias, resultando em conflitos e injustiças
Passados mais de 20 anos da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – documento final da ECO-92 que define o compromisso dos governos em garantir o tripé acesso à participação, à informação e à justiça nas questões ambientais –, é chegado o momento de perguntar se estamos preparados para atender ao chamado de uma democracia ambiental. Essa questão ganha relevância diante de casos concretos de violação a esses direitos, nos mais recentes embates ambientais contra a realização de obras de grande impacto socioambiental, como a Transposição do Rio São Francisco e a construção das hidrelétricas de Belo Monte, Santo Antônio e Jirau.
Extraídos do Princípio 10 da Declaração, os direitos de acesso à informação, à participação pública e à justiça são essenciais para o desenvolvimento sustentável, e vêm sendo cobrados, internacionalmente, em diversos foros, como o que se deu durante a Conferência de Bali em 2010, promovida pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). Nessa ocasião, foram mapeadas 26 grandes diretrizes a serem adotadas pelos governos, de modo a colocar em prática o que o princípio preconiza (mais em trecho abaixo).
Princípio 10 da Declaração do Rio de 1992
A melhor maneira de tratar questões ambientais é assegurar a participação, no nível apropriado, de todos os cidadãos interessados. No nível nacional, cada indivíduo deve ter acesso adequado a informações relativas ao meio ambiente de que disponham autoridades públicas, inclusive informações sobre materiais e atividades perigosas em suas comunidades, bem como a oportunidade de participar em processos de tomada de decisões. Os Estados devem facilitar e estimular a conscientização e a participação pública, colocando a informação à disposição de todos. Deve ser propiciado acesso efetivo a mecanismos judiciais e administrativos, inclusive no que diz respeito à compensação e reparação de danos.
O Brasil reúne um farto arcabouço legal ambiental e são inegáveis os avanços que tivemos nos últimos anos em relação aos pilares da democracia ambiental, como a publicação da Lei de Acesso à Informação (LAI), em 2011, que exige maior comprometimento das instituições públicas com os seus administrados. Ao oferecer ferramentas para que se possa cobrar transparência dos órgãos públicos, a LAI tornou-se um instrumento estratégico em temas ambientais. Também vale destacar o mais recente decreto presidencial que disciplina a Política Nacional de Participação Popular, o Decreto nº 8.243/2014, que, independentemente das críticas que vem sofrendo, é uma resposta ao nosso compromisso com o Princípio 10.
Apesar de todos esses avanços, ainda são frequentes no Brasil processos decisórios que não contam com a participação e a transparência necessárias, o que resulta em conflitos e injustiças ambientais, revelando um descasamento entre o que prega a estrutura legal e como as situações se dão na prática.
Esse cenário é agravado quando se ingressa no terceiro elemento dessa busca por uma governança ambiental, que é o acesso à justiça. Ainda que este seja um direito constitucionalmente garantido, na realidade há uma sucessão de demandas que acabam não sendo analisadas em tempo hábil pelos órgãos competentes, seja no nível administrativo, seja no judicial, maculando a busca pela democracia ambiental.
Essa “falta de acesso” judicial pode ser identificada na burocracia que envolve o nosso sistema de decisão, tomado por um volume excessivo de demandas e sucessivos acessos recursais – que, aparentemente, são vistos como integral acesso à justiça, mas por vezes acabam sendo utilizados para procrastinar uma efetiva justiça ambiental.
O fortalecimento dos instrumentos já existentes só se dará com o monitoramento de sua efetividade, a divulgação de sua performance e a cobrança por melhoras contínuas, em claro controle social das questões ambientais.
Iniciativas internacionais, como a rede TAI (The Access Initiative), formada por organizações não governamentais, realizam um importante trabalho ao demonstrar, por meio de indicadores, se os governos vêm ou não cumprindo seus compromissos segundo o Princípio 10 da Declaração do Rio de 1992.
São esses os novos caminhos para a efetiva implementação dos “acessos” essenciais na direção da almejada democracia ambiental.
[:en]Ainda são frequentes processos decisórios que não contam com a participação e a transparência necessárias, resultando em conflitos e injustiças
Passados mais de 20 anos da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – documento final da ECO-92 que define o compromisso dos governos em garantir o tripé acesso à participação, à informação e à justiça nas questões ambientais –, é chegado o momento de perguntar se estamos preparados para atender ao chamado de uma democracia ambiental. Essa questão ganha relevância diante de casos concretos de violação a esses direitos, nos mais recentes embates ambientais contra a realização de obras de grande impacto socioambiental, como a Transposição do Rio São Francisco e a construção das hidrelétricas de Belo Monte, Santo Antônio e Jirau.
Extraídos do Princípio 10 da Declaração, os direitos de acesso à informação, à participação pública e à justiça são essenciais para o desenvolvimento sustentável, e vêm sendo cobrados, internacionalmente, em diversos foros, como o que se deu durante a Conferência de Bali em 2010, promovida pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). Nessa ocasião, foram mapeadas 26 grandes diretrizes a serem adotadas pelos governos, de modo a colocar em prática o que o princípio preconiza (mais em trecho abaixo).
Princípio 10 da Declaração do Rio de 1992
A melhor maneira de tratar questões ambientais é assegurar a participação, no nível apropriado, de todos os cidadãos interessados. No nível nacional, cada indivíduo deve ter acesso adequado a informações relativas ao meio ambiente de que disponham autoridades públicas, inclusive informações sobre materiais e atividades perigosas em suas comunidades, bem como a oportunidade de participar em processos de tomada de decisões. Os Estados devem facilitar e estimular a conscientização e a participação pública, colocando a informação à disposição de todos. Deve ser propiciado acesso efetivo a mecanismos judiciais e administrativos, inclusive no que diz respeito à compensação e reparação de danos.
O Brasil reúne um farto arcabouço legal ambiental e são inegáveis os avanços que tivemos nos últimos anos em relação aos pilares da democracia ambiental, como a publicação da Lei de Acesso à Informação (LAI), em 2011, que exige maior comprometimento das instituições públicas com os seus administrados. Ao oferecer ferramentas para que se possa cobrar transparência dos órgãos públicos, a LAI tornou-se um instrumento estratégico em temas ambientais. Também vale destacar o mais recente decreto presidencial que disciplina a Política Nacional de Participação Popular, o Decreto nº 8.243/2014, que, independentemente das críticas que vem sofrendo, é uma resposta ao nosso compromisso com o Princípio 10.
Apesar de todos esses avanços, ainda são frequentes no Brasil processos decisórios que não contam com a participação e a transparência necessárias, o que resulta em conflitos e injustiças ambientais, revelando um descasamento entre o que prega a estrutura legal e como as situações se dão na prática.
Esse cenário é agravado quando se ingressa no terceiro elemento dessa busca por uma governança ambiental, que é o acesso à justiça. Ainda que este seja um direito constitucionalmente garantido, na realidade há uma sucessão de demandas que acabam não sendo analisadas em tempo hábil pelos órgãos competentes, seja no nível administrativo, seja no judicial, maculando a busca pela democracia ambiental.
Essa “falta de acesso” judicial pode ser identificada na burocracia que envolve o nosso sistema de decisão, tomado por um volume excessivo de demandas e sucessivos acessos recursais – que, aparentemente, são vistos como integral acesso à justiça, mas por vezes acabam sendo utilizados para procrastinar uma efetiva justiça ambiental.
O fortalecimento dos instrumentos já existentes só se dará com o monitoramento de sua efetividade, a divulgação de sua performance e a cobrança por melhoras contínuas, em claro controle social das questões ambientais.
Iniciativas internacionais, como a rede TAI (The Access Initiative), formada por organizações não governamentais, realizam um importante trabalho ao demonstrar, por meio de indicadores, se os governos vêm ou não cumprindo seus compromissos segundo o Princípio 10 da Declaração do Rio de 1992.
São esses os novos caminhos para a efetiva implementação dos “acessos” essenciais na direção da almejada democracia ambiental.