“Gostaria de pedir desculpas”, disse o jornalista e ambientalista Mark Lynas logo no início de sua palestra na Conferência Agrícola de Oxford de 2013. Ele se referia à sua participação ativa no movimento contra os alimentos transgênicos nos anos 1990, incluindo a destruição de plantações. O que aconteceu para que mudasse de posição? “Bem, a resposta é muito simples: descobri a ciência e, nesse processo, acho que me tornei um ambientalista melhor” (vídeo e transcrição aqui).
Filho de agricultores orgânicos, Lynas percebeu que a régua que usava para a questão dos transgênicos era muito diferente daquela usada para a questão climática. Para esta última, enfatizava a importância de evidências empíricas, argumentos de especialistas, estudos publicados em periódicos conceituados com revisão pelos pares, consensos da comunidade científica etc. e acusava os opositores de defender uma posição anticientífica.
O mesmo não acontecia no caso dos transgênicos, no qual os argumentos que ajudou a promover tinham um embasamento muito mais emocional, de repulsa e medo. Quando essa dissonância se tornou insustentável, Lynas decidiu se debruçar sobre a literatura científica sobre o tema e, uma a uma, suas crenças foram se mostrando “lendas urbanas”. E mais: a Organização das Nações Unidas para a Alimentacão e a Agricultura (FAO) projeta um aumento de 77% na demanda por alimentos nos países em desenvolvimento (mais pessoas, renda e longevidade), com a mesma área agriculturável (caso contenhamos o desmatamento), disponibilidade hídrica cada vez menor e pressões climáticas cada vez maiores. Nesse cenário, defende Lynas, os transgênicos poderiam ser um importante aliado dos ambientalistas.
Se o consenso científico é nosso guia para a questão climática, por que não o é na questão dos transgênicos? Segundo o Pew Research Center, a proporção de cientistas da Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS) que acreditam que alimentos transgênicos são geralmente seguros (88%) é equivalente à dos que acreditam que a atividade humana é a principal responsável pela mudança climática (89%). Também há consenso entre as principais instituições científicas do mundo, incluindo a Royal Society e as academias de ciências dos Estados Unidos, Brasil, China, Índia e México (ver publicação conjunta), na Organização Mundial de Saúde e na Comissão Europeia.
Pamela Ronald é geneticista botânica e é pesquisadora da Universidade da Califórnia. Em sua palestra TED, Pamela defende a engenharia de alimentos, argumentando que plantas podem ser geneticamente modificadas para reduzir o uso de pesticida, resistir a condições climáticas cada vez mais adversas e contribuir para a luta contra a desnutrição, como o arroz dourado, rico em vitamina A (betacaroteno), cuja deficiência é responsável pela cegueira e morte de quase meio milhão de crianças por ano nos países em desenvolvimento. Detalhe: Pamela é casada com um agricultor orgânico. Juntos escreveram o livro Tomorrow’s Table [A mesa de amanhã], defendendo que a agricultura orgânica e a genética podem (devem) trabalhar juntas por uma agricultura sustentável.
Beth Skwarecki, jornalista científica, acredita que o problema que seus opositores buscam combater não estão de fato relacionados aos organismos geneticamente modificados (ver artigo). Assim como já o fazemos em tantas outras áreas, precisamos adotar a régua da ciência e da razão também em relação aos transgênicos.