Empresas mostram liderança na gestão climática ao divulgar seus inventários de emissão de carbono. A análise e a comparação desses dados requerem cuidado
Baixo carbono é a expressão de ordem para a economia do século XXI, adaptada ao contexto das mudanças climáticas, marcada por eficiência e alternativas energéticas, inovação tecnológica, redução de emissões e gestão em sustentabilidade. No Brasil, 23 organizações deram um passo importante nesse rumo, no início de outubro, ao levarem a público os primeiros inventários de emissões feitos com a metodologia GHG Protocol. Trata-se da ferramenta mais utilizada no mundo para identificar fontes e calcular o volume de emissões nas empresas. Sua adaptação para o contexto brasileiro está a cargo do Gvces e seu Programa Brasileiro GHG Protocol. Lançado em maio de 2008, o programa anunciou os primeiros inventários de emissões GHG Protocol feitos no Brasil. Acesse os 23 inventários disponíveis para consulta pública.
Esses dados são importantes, na medida em que começam a incorporar o método de mapeamento e contabilização de emissões à rotina das empresas. Elas não só ganham tempo e economizam recursos na corrida do baixo carbono, como já se destacam como líderes no combate às mudanças climáticas globais em seus setores.
A disposição de uma parcela do empresariado brasileiro em estimular a economia de baixo carbono ficou ainda mais patente com o lançamento, em 8 de outubro, do programa Empresas pelo Clima (EPC). Com o objetivo de discutir soluções práticas e contribuições ao marco legal no País, a plataforma iniciou atividades reunindo parte dos membros fundadores do Programa Brasileiro GHG Protocol e algumas outras empresas de diferentes segmentos. Todos os integrantes do EPC se comprometem a realizar seus inventários de emissões.
Os membros do EPC, ao liderar esse novo movimento na economia, sinalizam que construir a realidade de baixo carbono implica um esforço coletivo e de cooperação. A sociedade, tendo à disposição os inventários, deve estar atenta para comparar e entender o desempenho das organizações em relação às emissões de um setor, de uma esfera econômica nacional, ou mesmo no contexto global, considerando suas particularidades. Comparar números absolutos é errado.
Por exemplo, após um crescimento econômico meteórico na última década, a China ocupa hoje o posto de maior emissor mundial, desbancando por pouco o líder histórico, os Estados Unidos. Mas não podemos perder de vista que a população chinesa é 4,3 vezes maior do que a americana. Isso indica que o american way of life ainda mantém os EUA como um dos líderes nas emissões per capita.
O mesmo vale quando se analisam duas empresas diferentes. É essencial estabelecer métricas específicas para cada setor produtivo, aplicáveis a empresas de tamanhos diferentes. No caso do setor financeiro, a comparação poderia ser feita em termos de emissão por lucro líquido; no caso de uma siderúrgica, a métrica pode ser emissões por produção de ferro; em uma petroquímica, essa comparação pode ser feita em relação à produção de um dado combustível (tCO2e/litros de gasolina).
Processos de grande consumo energético em geral estão associados a elevadas emissões. É o caso de organizações com operações na área de extração e refino de óleo e gás, siderurgia e alumínio, química, entre outras. Portanto, deve-se ter em mente o tipo de atividade de cada empresa ao se julgar o seu impacto climático. Algumas das principais atividades industriais brasileiras demandam uso intensivo de energia. De 1994 a 2007, estima-se que a matriz brasileira tenha sido consideravelmente carbonizada por termoelétricas, fazendo com que a intensidade de emissões do setor energético aumentasse aproximadamente 22%. E a tendência é que a matriz brasileira se torne mais “suja” na próxima década, devido a novos projetos de geração térmica previstos no Plano Decenal de Energia.
Por isso é tão importante que o setor empresarial brasileiro caminhe para uma economia de baixo carbono, a fim de impedir o aumento de seus impactos climáticos. Esta é justamente a missão do EPC. Descolar a curva de crescimento da curva de emissões não se faz do dia para a noite. É necessário um processo de engajamento, capacitação, mapeamento e gestão para alcançar esse estágio. Um desafio histórico e uma oportunidade de diferenciação que já foram percebidos pelas empresas do Programa Brasileiro GHG Protocol, e agora serão aprofundados pelo EPC.
*Coordenador do Programa Empresas pelo Clima
**Coordenador do Programa Brasileiro GHG Protocol