Dados oficiais apontam que o ritmo de destruição da floresta foi reduzido em 16% entre agosto de 2016 e julho de 2017 na Amazônia Legal brasileira; governo destaca reforço na fiscalização como determinante para resultados positivos, mas ambientalistas apontam fatores econômicos para a contenção do desmatamento na região
Após três anos de aumentos sucessivos no ritmo de desmatamento na Amazônia Legal, o governo federal finalmente conseguiu apresentar uma boa notícia. Nesta terça (17/10), os ministros José Sarney Filho (Meio Ambiente) e Gilberto Kassab (Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações) anunciaram que a destruição da floresta amazônica caiu 16% entre agosto de 2016 e julho de 2017.
De acordo com os dados do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o corte raso no bioma amazônico no período analisado correspondeu a uma área de 6,6 mil km², abaixo dos 7,9 mil km² registrados no período anterior.
Segundo as estimativas do Prodes 2017, os Estados com maior redução no ritmo de desmatamento foram Tocantins (55%), Roraima (43%), Acre (34%) e Pará (19%).
Esses dados trazem uma boa notícia para o governo de Michel Temer, que convive com críticas agudas de ambientalistas e especialistas aos retrocessos que a agenda ambiental viveu no Brasil nos últimos meses. Para o governo federal, o anúncio pode ser o primeiro passo para a retomada do controle sobre o ritmo de destruição da floresta amazônica no Brasil, perdido em meados de 2014, ainda sob a gestão de Dilma Rousseff. Já para ambientalistas e especialistas, a situação é um pouco mais complexa e os sinais emitidos pelo Planalto – envolto em escândalos e disputas políticas – podem comprometer qualquer medida de combate ao desmatamento.
Governo destaca ações de monitoramento na Amazônia
Em coletiva improvisada no Palácio do Planalto, logo após uma reunião com o presidente Michel Temer, o ministro José Sarney Filho (Meio Ambiente) destacou que os números do Prodes corresponderam às expectativas do governo considerando as medidas tomadas no último ano para conter a destruição da floresta amazônica.
De acordo com o ministro Sarney Filho, o fortalecimento das operações de comando e controle na Amazônia Legal foi crucial para que o governo conseguisse reverter o cenário negativo do ano passado. Para tanto, a recomposição orçamentária dos órgãos de fiscalização vinculados ao Ministério do Meio Ambiente foram importantes.
No começo do ano, o governo federal contingenciou mais da metade do orçamento previsto para a pasta e suas autarquias para 2017 – de R$ 910 milhões para R$ 446 milhões. Esta redução comprometeu a capacidade de atuação do Ministério e de órgãos importantes no combate ao desmatamento, em especial o Ibama. Pressionado, o Planalto teve que liberar parte dos recursos contingenciados para conseguir financiar operações básicas de fiscalização na Amazônia Legal, financiados principalmente com recursos do Fundo Amazônia.
Além do reforço na fiscalização, Sarney Filho também destacou outras medidas importantes para a preservação da Amazônia, como manejo florestal e o papel das reservas extrativistas para a conservação do bioma. Estas medidas constam na 4ª fase do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAm), iniciada em dezembro de 2016, que prevê iniciativas para estimular uma economia florestal sustentável na Amazônia Legal.
Um dos focos nesta fase é formalizar uma política de pagamentos por serviços ambientais, como o Redd+ (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal), que permita estruturar uma economia florestal na Amazônia.
“Só vamos acabar com o desmatamento quando valorizarmos a floresta em pé”, apontou Sarney Filho, que deve colocar este tema na agenda do Brasil para a próxima Conferência do Clima (COP 23), que acontecerá em Bonn (Alemanha) a partir do dia 06 de novembro.
Para ambientalistas, queda não aplaca retrocessos na agenda ambiental
A notícia sobre a queda no desmatamento na Amazônia foi bem recebida por ambientalistas, mas sem a mesma empolgação do governo federal. Isso porque, a despeito do Planalto reforçar que a queda no desmatamento aconteceu durante a gestão de Michel Temer (iniciada em maio de 2016, quando ele assumiu interinamente a presidência durante o processo de impeachment de Dilma Rousseff), o atual presidente é visto como patrocinador dos principais retrocessos sofridos pela agenda ambiental brasileira nos últimos meses (saiba mais).
“A queda de 16% em 2017 não compensa a subida de mais de 50% nos dois últimos anos”, aponta Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima (OC). “Além disso, o governo Temer segue vendendo a Amazônia, o meio ambiente e os direitos dos povos tradicionais à bancada ruralista em troca de votos no Congresso para se safar de denúncias de corrupção. Enquanto isso permanecer, nenhuma queda na taxa de desmatamento é sustentável, e o Brasil seguirá botando em risco seus compromissos internacionais e o clima do planeta”.
Se o reforço na fiscalização foi importante para a redução do desmatamento no último ano, ele não foi o único fator que causou mudança no cenário. A recessão econômica vivida pelo Brasil nos últimos anos e a queda nos preços internacionais da carne bovina também ajudaram a conter a destruição da Amazônia em 2017, apontam ambientalistas.
Para Paulo Barreto, pesquisador do Imazon, a queda no desmatamento é uma melhora pequena na situação da Amazônia, que ainda sofre com a destruição da floresta. “A febre baixou, mas o paciente continua doente. A queda foi em parte devida à recessão. Houve queda de preço do gado, sendo que a pecuária é a principal causa de desmatamento”, explica Barreto.
“Os números são altos e mostram que precisamos caminhar muito ainda para atingir o compromisso assumido pelo Brasil, no âmbito do Acordo de Paris, de zerar o desmatamento ilegal na Amazônia até 2030”, argumenta André Ferretti, gerente da Fundação Grupo Boticário e coordenador-geral do OC. “É assustador esperar mais 14 anos para zerar o desmatamento ilegal na Amazônia. Como nação, temos uma obrigação moral e estratégica de acabar com essa degradação o quanto antes, e não somente na floresta amazônica, mas também nos demais biomas brasileiros, como o Cerrado”.
Queda no desmatamento vira munição do Brasil para a COP 23
A notícia era aguardada com ansiedade pelo Palácio do Planalto, que desejava aliviar a pressão de ambientalistas sobre os retrocessos vividos pela agenda ambiental sob o governo de Michel Temer desde maio do ano passado, quando ele assumiu o poder. Além disso, a informação sobre a queda no desmatamento na Amazônia também era desejada para fazer frente aos questionamentos internacionais sobre o tema durante a COP 23.
O governo brasileiro vem recebendo críticas sucessivas de financiadores internacionais sobre a dificuldade para conter a destruição da Amazônia nos últimos anos (saiba mais). Em junho passado, o governo da Noruega anunciou uma redução no repasse anual de recursos para o Fundo Amazônia em decorrência do aumento do desmatamento a partir de 2014.
Estabelecido em 2008, o Fundo já recebeu quase R$ 3 bilhões de Oslo para financiar projetos de preservação da mata amazônica no Brasil. Estima-se que o repasse para o próximo ano, a despeito do anúncio desta terça, seja reduzido pela metade – ou seja, dos 400 milhões de reais atuais para 200 milhões em 2018.
Existia um temor de que o governo brasileiro sofresse ainda mais pressão na Conferência de Bonn caso os índices de desmatamento na Amazônia continuassem em alta. Agora, com os dados favoráveis, o Brasil destacará os esforços recentes no combate à destruição da floresta no último ano durante a COP 23.
A queda no desmatamento servirá inclusive como argumento para contestar possíveis questionamentos sobre medidas polêmicas tomadas pelo governo nos últimos meses na questão ambiental, como a alteração dos limites da Floresta Nacional do Jamanxim (PA), a tentativa de extinguir a Reserva Nacional do Cobre (Renca), além da sinalização positiva para projetos de revisão do licenciamento ambiental que correm atualmente no Congresso Nacional.