Relatório do Fórum Econômico Mundial destaca que, a despeito das perspectivas econômicas positivas para 2018, desafios geopolíticos e a crise ambiental alertam para riscos intensificados nos próximos meses
Quase dez anos após a eclosão da crise financeira de 2008, a economia global apresenta resultados econômicos mais sólidos e caminha para mais um ano de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). No entanto, os riscos potenciais para esse cenário econômico positivo nunca foram tão dramáticos como agora.
A conclusão é do Levantamento Anual de Percepção de Riscos Globais (GRPS, sigla em inglês), publicado ontem (17/1) pelo Fórum Econômico Mundial em Davos, Suíça. Lançado poucos dias antes da abertura da edição 2018 do Fórum, este relatório adverte os líderes políticos e econômicos do mundo da importância de acompanhar com mais atenção as rápidas mudanças políticas e sociais que acontecem ao redor do mundo e seus impactos sobre o desempenho econômico dos países.
Cerca de mil especialistas de governos, empresas, sociedade civil e academia foram consultados sobre temas vistos como riscos potenciais para a economia mundial em 2018. O levantamento aponta que 59% das pessoas consultadas acreditam que haverá uma intensificação de riscos neste ano, em contraposição a apenas 7% que acreditam em uma queda nas ameaças.
Riscos geopolíticos e cibernéticos
O pessimismo é alimentado em grande parte pela deterioração do cenário geopolítico global: 93% dos especialistas consultados afirmam que esperam que os conflitos políticos ou econômicos entre as grandes potências devem piorar, sendo que 80% esperam um aumento nos riscos associados à guerra envolvendo esses países.
“As abordagens multilaterais baseadas em regras estão desgastadas. Restabelecer o Estado como locus primário de poder e legitimidade tem se tornado uma estratégia cada vez mais atrativa para muitos países, mas que deixa muitos Estados menores espremidos quando as mudanças geopolíticas acontecem”, aponta o relatório.
“Não há sinais que existam normas e instituições para as quais as maiores potências mundiais possam convergir. Isso cria novos riscos e incertezas: aumento das tensões militares, rupturas econômicas e comerciais e ciclos de retroalimentação desestabilizadores entre a mudança das condições globais e as condições políticas internas dos países”.
O relatório assinala a possibilidade de intensificação de situações de conflito no Oriente Médio, na África e no Leste Asiático, particularmente no contexto do recrudescimento retórico das tensões entre Estados Unidos e Coreia do Norte em torno do programa nuclear deste país.
Em parte associado com as tensões geopolíticas, outro risco destacado pelo levantamento é o das ameaças cibernéticas, com a maior probabilidade de ataques massivos nos próximos meses. O principal alvo desses ataques são as empresas; nos últimos cinco anos, o número de casos de ataque cibernético tendo empresas como vítimas quase dobrou em todo o mundo.
“A fricção geopolítica está contribuindo para um aumento na escala e na sofisticação dos ataques cibernéticos”, aponta John Drzik, chefe de risco global e digital da corretora internacional Marsh. “Ao mesmo tempo, a exposição cibernética está crescendo à medida que as empresas se tornam mais dependentes da tecnologia. Embora o gerenciamento de risco esteja melhorando, as empresas e os governos precisam investir mais em esforços de resiliência”.
O risco prioritário: meio ambiente
Mais uma vez, o meio ambiente é destaque na relação de riscos apontada pelos especialistas consultados pelo Fórum Econômico Mundial. De acordo com o levantamento, riscos como eventos climáticos extremos, perda da biodiversidade e colapso dos ecossistemas, grandes desastres naturais, destruição ambiental causada pelo homem, e o fracasso da mitigação e da adaptação à mudança do clima foram classificados como os mais proeminentes dentre os 30 riscos globais priorizados em termos de probabilidade e impacto. O clima extremo foi classificado como o principal risco nessas duas perspectivas.
“Os riscos ambientais, juntamente com a crescente vulnerabilidade a outros riscos, agora ameaçam seriamente a base da maioria dos nossos bens comuns”, destaca Alison Martin, do Zurich Insurante Group. “Infelizmente, atualmente observamos uma resposta tímida e tardia por parte dos governos e das organizações para as principais tendências, como mudança do clima. Ainda não é tarde para ações mais abrangentes, mas precisamos agir com um forte senso de urgência para evitar o potencial colapso do sistema”.
O relatório indica que os limites ambientais do planeta estão sendo pressionados até seus limites e os danos estão cada vez mais evidentes, com a intensificação de eventos climáticos extremos e a perda contínua da biodiversidade. A saúde humana também está sofrendo como esses danos, com o esgotamento dos sistemas agrícolas afetando a produção de alimentos e a poluição do ar e da água causando mais doenças.
A resolução da crise ambiental também está mais complexa nos últimos anos por conta das mudanças geopolíticas, em especial o recrudescimento do unilateralismo por parte de grandes potências. “Uma tendência em direção ao unilateralismo do Estado-nação poderá deixar mais difícil de sustentar, no longo prazo, as respostas multilaterais que são necessárias para enfrentar o aquecimento global e a degradação do meio ambiente em nível global”, ressalta o relatório do Fórum Econômico Mundial.
Riscos econômicos
No plano econômico, o relatório do Fórum Econômico Mundial ressalta que os indicadores apontam para uma estabilização dos níveis de crescimento global pós-crise de 2008. No entanto, alguns dos especialistas consultados pelo levantamento se preocupam com a possibilidade de que a melhoria das taxas de crescimento do PIB leve à “complacência” quanto aos riscos estruturais persistentes no sistema econômico e financeiro global, que ameaçam levar a economia mundial para mais uma crise na próxima década.
Segundo o relatório, a economia global enfrenta uma mistura de vulnerabilidades de longa data e de novas ameaças que têm emergido ou que se desenvolveram nos anos após a crise. Os riscos conhecidos incluem ameaças como preços de ativos potencialmente insustentáveis, aumento do endividamento (especialmente na China), e tensões contínuas no sistema financeiro global.
Já entre os riscos mais novos, estão a capacidade limitada de ação dos governos em caso de uma nova crise, a ruptura causada pela intensificação de padrões de automação e digitalização, e um acúmulo de pressões protecionistas em um cenário crescente de políticas nacionalistas e populistas.
Para Klaus Schwab, fundador e presidente executivo do Fórum Econômico Mundial, a retomada do crescimento global deve servir como oportunidade para governos e empresas enfrentarem esses desafios.
“Uma expansão da recuperação econômica nos favorece com uma oportunidade que não podemos nos dar ao luxo de desperdiçar, para combater as fraturas que permitimos enfraquecer as instituições, as sociedades e o meio ambiente”, argumenta Schwab. “Devemos levar a sério o risco de uma quebra de sistemas globais. Juntos, temos os recursos e os novos conhecimentos científicos e tecnológicos para evitar isso. Acima de tudo, o desafio é encontrar a vontade e o impulso para trabalhar em conjunto para um futuro compartilhado”.
O sumário executivo do GRPS em português está disponível aqui.