O Projeto de Lei traz conflitos com Política Nacional do Meio Ambiente e a Constituição Federal, o que pode levar insegurança jurídica aos empreendimentos licenciados
Termina hoje, 6 de agosto, o prazo de consulta pública do Projeto de Lei 3729/2004, que tramita no Congresso Nacional e altera as regras de licenciamento ambiental no Brasil. Para ambientalistas e especialistas do setor, o projeto, se aprovado da forma como foi apresentado, prejudica o meio ambiente e cria insegurança jurídica nos empreendimentos licenciados. O governo quer votar o projeto em regime de urgência.
Em documento entregue ontem à Procuradoria Geral da República (PGR), o Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam) questiona o processo de construção da minuta do projeto e aponta distorções e inconstitucionalidades. “Há ilegalidades que vão desde permitir, ao governo, determinar a tramitação em caráter de urgência de projetos de seu interesse, com o argumento de defesa do ‘interesse nacional’, com total exclusão da sociedade civil”, afirma Carlos Bocuhy, presidente do Proam.
Yara Schaeffer-Novelli, do Instituto BiomaBrasil e professora sênior da USP, destaca o traço autoritário contido no parágrafo único do artigo 52, no qual a ordem dos processos para análise passam a ser definidas pelo governo. Segundo a especialista, “essa prática de estabelecimento de prioridades contraria a Constituição Cidadã no que tange à participação social em matéria ambiental, em um Estado Democrático de Direito”.
O Proam aponta a existência de vários conflitos legais com a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/1981) e a Constituição Federal, o que pode trazer insegurança jurídica aos empreendimentos licenciados.
“A proposta traz flexibilização e simplificação para os licenciamentos, o que pode gerar impactos sociais e ambientais como ocorreu em Mariana e Brumadinho”, afirma Bocuhy.
Para o ambientalista, a facilitação de licenças para ampliações e a falta de justificativa de alternativas tecnológicas e locacionais, assim como a falta de obrigatoriedade de se estudar os possíveis impactos em áreas indiretamente afetadas, representam uma falência dos estudos ambientais.
“Nem sequer a obrigatoriedade de audiências públicas é elencada, limitando-se a apenas uma, insuficiente em caso de grandes empreendimentos que produzem impactos regionais”, afirma Vilázio Lellis, conselheiro do Consema de São Paulo.
Segundo o parecer do Proam, a minuta confunde o instrumento da Avaliação Ambiental Estratégica (AAE), ainda não regulamentado no Brasil, que visa assegurar a definição e políticas públicas, e avança sobre requisitos já existentes para a elaboração do Zoneamento Ecológico-Econômico, atribuindo poder de decisão aos governos.
“Ao permitir a flexibilização dos estudos ambientais, com critérios diferentes a serem deliberados pelos estados, podem ocorrer efeitos de uma guerra fiscal entre as unidades da Federação”, afirma a bióloga Lisiane Becker, do Instituto Mira-Serra. “Há facilitações que se dirigem ao agronegócio, já que a simples inscrição no Cadastro Ambiental Rural passa a ter efeitos de licença para o setor agropecuário”, afirma.
O parecer do Proam, encaminhado ao MPD, conclui: “A proposta alija a necessária manifestação da Funai e outros organismos ligados ao patrimônio cultural, que são hoje condicionantes prévias ao licenciamento. Até o presente momento, o texto demonstra ter ignorado majoritariamente as exposições e contribuições ofertadas por diferentes atores sociais nas audiências públicas, e não apresenta fundamentos e justificativas para as opções adotadas, que se voltam contra a eficiência e eficácia do licenciamento ambiental”.