Ao contrário do senso comum, a agricultura não precisa ser um algoz das florestas e áreas naturais. Um estudo avançado mostra que, ao contrário, esta atividade humana pode – e deve – ser aliada da conservação ambiental
Hoje, a presença dos produtores é o que impede a expansão urbana e a grilagem de terras no entorno do manancial da Bacia do Descoberto, que abastece 65% da população do Distrito Federal. O engajamento dos agricultores pode evitar o comprometimento da qualidade e do volume das águas locais, por meio de investimentos em infraestrutura verde e manejo adequado do solo, segundo o levantamento realizado.
É o que mostra um estudo lançado hoje, 11 de setembro, Dia do Cerrado, realizado pelos especialistas do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS) e do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento e Sustentabilidade (Iabs), com apoio da ONU Meio Ambiente.
O trabalho propõe um modelo estruturante de desenvolvimento rural sustentável para a Bacia do Descoberto, considerando ações para a rentabilização sustentável da produção agropecuária, a regularização hídrica e fundiária, iniciativas de proteção ambiental, de infraestrutura e saúde e promoção do ecoturismo.
“Os agricultores são os guardiões da bacia e se eles não tiverem condições de produzir, a área corre sério risco de perder sua característica de ser uma fonte de água”, explica André Lima, associado do IDS e ex-Secretário de Meio Ambiente do Distrito Federal.
As referências exploradas na proposta, como os cases das cidades de Nova York (EUA), Munique (Alemanha), Extrema (MG) e a iniciativa Cultivando Água Boa de Itaipu, mostram que é possível avançar para uma produção sustentável, que gere renda para as famílias locais e garanta a sua capacidade natural de fornecer água limpa para usos múltiplos.
“O Programa de Desenvolvimento Rural Sustentável [PDRS] do Descoberto se traduz em uma estratégia central de segurança hídrica e alimentar para todo o Distrito Federal e parte do estado de Goiás. Garantir a característica predominantemente rural da bacia, apoiar e incentivar práticas de manejo do solo e da água mais inovadoras e sustentáveis e contribuir para a geração de renda local merecem estar no topo da lista das preocupações dos governantes e da sociedade que depende da água e alimentos ali produzidos”, salienta Guilherme Checco, pesquisador do IDS e coordenador do estudo.
Somente em 2017 foram produzidas na Bacia do Descoberto 5,2 mil toneladas de morango, 9,5 mil toneladas de goiaba, além de outros produtos. Este vídeo mostra um dos sítios produtores de alimentos, que recuperou área degradada e hoje contribui também para “produzir água”:
Um exemplo de como produzir água e alimentos saudáveis no Cerrado
O trabalho estimou a necessidade de um investimento da ordem de R$539 milhões, ao longo de um período de 10 anos, para viabilizar as ações na região da bacia. O mapeamento das fontes financeiras disponíveis demonstrou ser possível viabilizar estes recursos, tanto a partir da tarifa de saneamento, de investimentos e compras públicas, quanto de recursos da cobrança pelo uso da água, de fundos nacionais e internacionais e linhas de créditos já existentes.
O relatório completo do Programa de Desenvolvimento Rural Sustentável do Descoberto foi entregue oficialmente ao Secretário de Meio Ambiente do Distrito Federal, Sarney Filho, e, nos próximos meses, a proposta será apresentada para as demais autoridades, moradores e produtores locais.