O velho trabalho dos marqueteiros se faz atual como nunca. E daqui para a frente se depara com o desafio de lidar com a internet e as redes sociais – empenhadas em enxergar os políticos por trás da maquiagem
O recente lançamento nos cinemas de O Bem-Amado, obra do teatrólogo Dias Gomes, trouxe de volta a figura de Odorico Paraguaçu, arquétipo do político matreiro, envolvente, “enrolador”, corrupto até a medula e obsessivo em sua saga por inaugurar o cemitério municipal, obra representativa de sua administração. Na fictícia cidade baiana de Sucupira, convivem todos os elementos que no imaginário nacional permeiam o jogo político: amores, luxúria, dinheiro, poder, inveja e violência – personalizada na figura do matador redimido Zeca Diabo. Isso sem falar da figura ciclotímica de Nezinho do Jegue, que, quando sóbrio, era um fervoroso defensor de Odorico Paraguaçu, mas, ao ficar bêbado, transformava-se no principal acusador dos desmandos do prefeito.
O Bem-Amado talvez seja a mais bem-acabada representação de um modo de fazer política que aparentemente está enterrado no passado recente do Brasil, especialmente depois da volta do regime democrático. Mas, a cada período eleitoral, algumas das artimanhas e manejo de palavras e gestos de Odorico Paraguaçu ressurgem no processo de construção da persona pública de vários candidatos país afora.
O que Dias Gomes não previu quando escreveu sua obra foi o fluxo incontrolável de informação, comunicação e interatividade potencializado pela internet e as chamadas redes sociais, como Twitter, Facebook e Orkut. Hoje é preciso bem mais do que uma retórica laudatória e cheia de advérbios inusitados para impressionar os eleitores (mais em entrevista com Sérgio Abranches, nesta edição). As campanhas requerem não só maior investimento na construção e consolidação da imagem, como também um aprendizado sobre como usar adequadamente essas novas ferramentas, que expõem mais o candidato à opinião pública, testam sua autenticidade e espontaneidade e tendem a ganhar importância a cada eleição.
O uso da internet e especialmente das redes sociais ainda é um fenômeno novo e de certa forma os “marqueteiros” – profissionais de marketing responsáveis por ajudar o candidato a construir ou reconstruir sua imagem pública – ainda estão aprendendo a incorporá-las às campanhas. Fato é que o processo de construção da imagem dos políticos passa por um momento de transformação, no qual promessas, gestos, maneirismos e até a forma de se vestir continuam mantendo sua importância, mas terão de conviver com um escrutínio e uma interação permanentes com a sociedade promovidos e facilitados pela rede mundial de computadores.
A era do espetáculo
A emergência da internet e das redes sociais torna mais complexo um desafio que não vem de hoje: o de conhecer a fundo para onde vai o humor dos eleitores e ter respostas para as suas expectativas. O professor Marco Aurélio Prado, doutor em psicologia social pela PUC de São Paulo e presidente da Associação Brasileira de Psicologia Política, lembra que a construção do discurso político sempre se utilizou de estratégias que criassem formas de identificação com a noção de “povo” ou “população”.
Segundo ele, vários teóricos acreditavam que as massas revolucionárias do final do século XIX eram “patológicas”. Por isso, exigiriam uma forma específica de tratamento por parte do líder que passava por garantir uma comunicação que fosse abrangente o suficiente para criar formas de identificação, com afirmações rápidas e conclusões repetitivas. “Os teóricos não imaginavam que as massas viriam para ficar e que esses fenômenos só ficariam mais complexos com os meios de comunicação, o aumento populacional, as formas de gestão etc.”, diz Prado.
Opinião semelhante tem o diretor de TV Abelardo Blanco, que já assessorou diversas campanhas políticas. Para ele, a questão da representação – ou da “farsa que ocupa o lugar da realidade” – não se restringe ao momento político e à campanha eleitoral, mas é parte de um processo maior de “espetacularização” da vida cotidiana, que viria já desde fins do século XIX. Assim, o marqueteiro, por mais que se considere milagreiro, poderoso e chegue a ser incensado por muitos políticos, não passaria “de mero instrumento minúsculo de um processo histórico que vem de longe”, diz.
Para exemplificar seu ponto de vista, Blanco recorre a um trecho do livro A Sociedade do Espetáculo, escrito pelo pensador francês Guy Debord [1]: “Toda a vida das sociedades nas quais reinam as condições modernas de produção se anuncia como uma imensa acumulação de espetáculos. Tudo o que era diretamente vivido se esvai na fumaça da representação”.
[1] Escritor francês morto em 1994. Foi um dos pensadores da Internacional Situacionista e da Internacional Letrista, e seus textos foram a base das manifestações do Maio de 68. A Sociedade do Espetáculo é seu trabalho mais conhecido.
Isso faz com que, no processo de construção da sua imagem, o político esteja atento permanentemente aos humores da opinião pública. Com isso, as pesquisas de opinião, quantitativas e qualitativas, transformaram-se em uma ferramenta básica de trabalho e as equipes de campanha delas se valem para moldar os discursos públicos ou mesmo realizar mudanças cosméticas no vestuário ou no comportamento dos candidatos. Tudo com o objetivo de estabelecer uma ponte com os eleitores que se transforme em apoio político e votos.
Fabián Echegaray, cientista político e diretor da empresa de pesquisas de mercado Market Analysis, acredita que esse processo não é mau em si. Para ele, a crítica ao poder do marketing político vem especialmente de setores da mídia, para quem se estaria perdendo a autenticidade e o debate de ideias em favor de uma grande disputa de imagem e estilos. Echegaray defende que esta construção é não apenas necessária, como praticamente a única forma de manter sustentável uma candidatura, especialmente em um contexto de diluição das identidades partidárias.
À coerência e à habilidade em fazer promessas que atendam às expectativas dos eleitores outro elemento que se une à construção da imagem do político é a questão do estilo pessoal, sua maneira de se vestir e se comportar. Em tempos de hiperinflação de informações, com a importância da TV e a acessibilidade permanente propiciada pela internet, este tema, antes marginal, parece se tornar cada vez mais relevante. Com isso, ao lado do marqueteiro, outro profissional emerge: o personal stylist, responsável pela “paginação” do candidato com o objetivo de torná-lo mais atraente para os eleitores.
Existe até uma tipificação dos estilos pessoais mais reconhecidos pelos brasileiros, cada qual tanto com seu lado positivo quanto com o negativo. Há, por exemplo, o “romântico”, caracterizado pela “sensibilidade, suavidade e gentileza”, ou o “sexy”, cujos elementos incluem sedução, carisma, coragem e autoconfiança. São justamente esses dois estilos os que mais atraem os eleitores brasileiros, segundo a consultora de imagem Sabina Donadelli, para quem os candidatos que têm naturalmente algum desses dois elementos conquistam mais chance de encantar os eleitores.
Caiu na rede
Fato é que promessas, gestual e estilo pessoal, além de dinheiro, por muito tempo foram combinados para construir ou consolidar a imagem dos políticos, sempre com um foco nos meios tradicionais de comunicação, em especial a TV e o rádio, que são basicamente unidirecionais. Não sem razão, há um enorme investimento de tempo, saliva e compromissos para consolidar alianças partidárias com o intuito de aumentar o tempo de exposição dos candidatos no horário eleitoral gratuito.
O que esses meios tradicionais basicamente fazem é garantir a emissão da mensagem para os eleitores, mas não lhes facilita a interação direta com o candidato. Com a internet, tudo isso muda radicalmente. E como fica o jogo político neste novo contexto?
O jornalista e consultor Roberto Rech é veterano de várias campanhas políticas e um defensor da internet como um canal para quebrar o monopólio de comunicação da mídia tradicional. “Um grande veículo pode decidir não publicar algo sobre determinado candidato, por afinidade ou interesse político, mas basta essa informação cair na rede e já é de conhecimento público”, diz. Para ele, mesmo aqueles que estão na base social, com pouco ou nenhum acesso à internet, acabam sendo tocados pelo que chama de “contágio eleitoral”, muitas vezes iniciado em discussões ou ações no mundo virtual. “No caso do Barack Obama, a internet foi a grande responsável pelo contágio, pelo levante daquela onda que a gente não consegue explicar ainda direito, mas que acabou levando-o à Presidência dos Estados Unidos.”
Com o advento das redes sociais na web, o trabalho dos candidatos para construir e consolidar sua imagem pública certamente ficará mais difícil. É o que pensa Haroldo Ceravolo, diretor de redação dos sites Opera Mundi e Última Instância. Ele reconhece que, nas eleições deste ano, apesar de toda a expectativa ao redor do uso da internet, a TV segue sendo o principal canal de informação e mobilização dos eleitores. Mas, para as próximas eleições, o poder da TV tende a diminuir, com mais pessoas tendo acesso à internet com uma velocidade maior.
“O modo de se fazer campanha terá de mudar. Haverá novas preocupações, porque o texto e as posturas dos candidatos estarão submetidos a um contato mais direto com as pessoas”, diz Ceravolo. Ele acredita que aí, então, será possível entender o que é uma campanha pela internet. Exemplos recentes em que a web fez diferença foram o da já citada campanha de Barack Obama e a do ex-prefeito de Bogotá Antanas Mockus, que o transformou em uma sensação ao levá-lo, contra todos os prognósticos, ao segundo turno das eleições na Colômbia.
Para Ceravolo, exemplos como os citados, de uso eficiente e criativo da internet na campanha eleitoral, ainda são poucos, mas tendem a aumentar com a crescente popularização da rede de computadores. Ou seja, os futuros Odoricos terão de usar muito mais do que advérbios, sorrisos e promessas para ser escutados. Provavelmente terão de estar conectados permanentemente, dialogando e sendo questionados em tempo real por seus eleitores e detratores. E, quem sabe, fazendo da verdade seu maior trunfo eleitoral.
Veja quadro com os estilos dos candidatos identificados pela consultora Sabina Donadelli.
Confira aqui as fotos do making-of da arte corporal de Beto França e saiba mais sobre o que inspirou Página22 a realizar o ensaio.
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O que dizem os blogueiros
Depoimentos de blogueiros referenciais colhidos por Página22 mostram a influência da internet e das redes sociais na política como uma tendência que desponta. Mas afirmam que seus recursos ainda são pouco usados pelo cidadão e muito mal explorados pelos candidatos :
Primeiro teste
As eleições 2010 serão o primeiro teste dos políticos para o jornalismo-cidadão que nós, “consumidores 2.0”, fazemos nas redes sociais desde a popularização das ferramentas de compartilhamento de notícias e de autopublicação. Se antes precisávamos ir ao ombudsman para ler uma visão mais crítica da notícia repercutida, agora temos muitos blogs e perfis de Twitter para seguir, ora concordando, ora discordando, mas acima de tudo – e felizmente – vivenciando um debate inovador na nossa sociedade. Sugiro que o eleitor interessado em votar bem escolha um foco (eu escolhi educação) e acompanhe os candidatos na temática selecionada, sendo também um propagador dos erros e acertos de suas propostas e campanhas neste assunto. Isso é ser proativo no desnudar do candidato e na tarefa de escolher quem vai representar seus interesses no próximo governo. Samantha Shiraishi, editora do blog A vida como a vida quer.
Candidatos analógicos
Há um abismo entre o que a campanha digital poderia ser e o que está sendo. Os candidatos estão mais preocupados em influenciar (ou manipular) a opinião alheia do que efetivamente compartilhar suas opiniões, conversar, mostrar quem são. Não temos candidatos na internet, são seus assessores que cuidam dos seus espaços, cometendo gafes, pinçando as perguntas que querem responder e editando tudo para que o candidato apareça plástico e sem vida, defendendo os argumentos que a campanha decidiu serem o pilar de sua candidatura. Não temos espaços abertos para conversar com os candidatos no âmbito digital, porque a candidatura off-line toma todo esse tempo: as redes sociais contemplam relacionamento e os candidatos estão usando a internet como mídia de massa. Edney Souza, editor do blog Interney.
Canal ainda mal explorado
As mídias sociais ainda estão sendo utilizadas de modo muito tímido no Brasil. Não poderia ser diferente: apesar do crescimento substancial de visitas a sites como Twitter e Facebook no País nos últimos doze meses, o fato é que a TV aberta ainda é o grande formador de opiniões no Brasil. Outro problema que diagnostico é o fato de, em blogs e mídias sociais, as discussões políticas andarem extremamente exacerbadas. O maniqueísmo desses debates empobrece demais as discussões, afastando interessados em comentar política. E a internet, que poderia representar um meio onde fosse possível encontrar informações diferenciadas, infelizmente acaba por fomentar rivalidades em vez de construir pontes de entendimento entre partidos. Alexandre Inagaki, editor do blog Pensar Enlouquece.[:en]O velho trabalho dos marqueteiros se faz atual como nunca. E daqui para a frente se depara com o desafio de lidar com a internet e as redes sociais – empenhadas em enxergar os políticos por trás da maquiagem
O recente lançamento nos cinemas de O Bem-Amado, obra do teatrólogo Dias Gomes, trouxe de volta a figura de Odorico Paraguaçu, arquétipo do político matreiro, envolvente, “enrolador”, corrupto até a medula e obsessivo em sua saga por inaugurar o cemitério municipal, obra representativa de sua administração. Na fictícia cidade baiana de Sucupira, convivem todos os elementos que no imaginário nacional permeiam o jogo político: amores, luxúria, dinheiro, poder, inveja e violência – personalizada na figura do matador redimido Zeca Diabo. Isso sem falar da figura ciclotímica de Nezinho do Jegue, que, quando sóbrio, era um fervoroso defensor de Odorico Paraguaçu, mas, ao ficar bêbado, transformava-se no principal acusador dos desmandos do prefeito.
O Bem-Amado talvez seja a mais bem-acabada representação de um modo de fazer política que aparentemente está enterrado no passado recente do Brasil, especialmente depois da volta do regime democrático. Mas, a cada período eleitoral, algumas das artimanhas e manejo de palavras e gestos de Odorico Paraguaçu ressurgem no processo de construção da persona pública de vários candidatos país afora.
O que Dias Gomes não previu quando escreveu sua obra foi o fluxo incontrolável de informação, comunicação e interatividade potencializado pela internet e as chamadas redes sociais, como Twitter, Facebook e Orkut. Hoje é preciso bem mais do que uma retórica laudatória e cheia de advérbios inusitados para impressionar os eleitores (mais em entrevista com Sérgio Abranches, nesta edição). As campanhas requerem não só maior investimento na construção e consolidação da imagem, como também um aprendizado sobre como usar adequadamente essas novas ferramentas, que expõem mais o candidato à opinião pública, testam sua autenticidade e espontaneidade e tendem a ganhar importância a cada eleição.
O uso da internet e especialmente das redes sociais ainda é um fenômeno novo e de certa forma os “marqueteiros” – profissionais de marketing responsáveis por ajudar o candidato a construir ou reconstruir sua imagem pública – ainda estão aprendendo a incorporá-las às campanhas. Fato é que o processo de construção da imagem dos políticos passa por um momento de transformação, no qual promessas, gestos, maneirismos e até a forma de se vestir continuam mantendo sua importância, mas terão de conviver com um escrutínio e uma interação permanentes com a sociedade promovidos e facilitados pela rede mundial de computadores.
A era do espetáculo
A emergência da internet e das redes sociais torna mais complexo um desafio que não vem de hoje: o de conhecer a fundo para onde vai o humor dos eleitores e ter respostas para as suas expectativas. O professor Marco Aurélio Prado, doutor em psicologia social pela PUC de São Paulo e presidente da Associação Brasileira de Psicologia Política, lembra que a construção do discurso político sempre se utilizou de estratégias que criassem formas de identificação com a noção de “povo” ou “população”.
Segundo ele, vários teóricos acreditavam que as massas revolucionárias do final do século XIX eram “patológicas”. Por isso, exigiriam uma forma específica de tratamento por parte do líder que passava por garantir uma comunicação que fosse abrangente o suficiente para criar formas de identificação, com afirmações rápidas e conclusões repetitivas. “Os teóricos não imaginavam que as massas viriam para ficar e que esses fenômenos só ficariam mais complexos com os meios de comunicação, o aumento populacional, as formas de gestão etc.”, diz Prado.
Opinião semelhante tem o diretor de TV Abelardo Blanco, que já assessorou diversas campanhas políticas. Para ele, a questão da representação – ou da “farsa que ocupa o lugar da realidade” – não se restringe ao momento político e à campanha eleitoral, mas é parte de um processo maior de “espetacularização” da vida cotidiana, que viria já desde fins do século XIX. Assim, o marqueteiro, por mais que se considere milagreiro, poderoso e chegue a ser incensado por muitos políticos, não passaria “de mero instrumento minúsculo de um processo histórico que vem de longe”, diz.
Para exemplificar seu ponto de vista, Blanco recorre a um trecho do livro A Sociedade do Espetáculo, escrito pelo pensador francês Guy Debord [1]: “Toda a vida das sociedades nas quais reinam as condições modernas de produção se anuncia como uma imensa acumulação de espetáculos. Tudo o que era diretamente vivido se esvai na fumaça da representação”.
[1] Escritor francês morto em 1994. Foi um dos pensadores da Internacional Situacionista e da Internacional Letrista, e seus textos foram a base das manifestações do Maio de 68. A Sociedade do Espetáculo é seu trabalho mais conhecido.
Isso faz com que, no processo de construção da sua imagem, o político esteja atento permanentemente aos humores da opinião pública. Com isso, as pesquisas de opinião, quantitativas e qualitativas, transformaram-se em uma ferramenta básica de trabalho e as equipes de campanha delas se valem para moldar os discursos públicos ou mesmo realizar mudanças cosméticas no vestuário ou no comportamento dos candidatos. Tudo com o objetivo de estabelecer uma ponte com os eleitores que se transforme em apoio político e votos.
Fabián Echegaray, cientista político e diretor da empresa de pesquisas de mercado Market Analysis, acredita que esse processo não é mau em si. Para ele, a crítica ao poder do marketing político vem especialmente de setores da mídia, para quem se estaria perdendo a autenticidade e o debate de ideias em favor de uma grande disputa de imagem e estilos. Echegaray defende que esta construção é não apenas necessária, como praticamente a única forma de manter sustentável uma candidatura, especialmente em um contexto de diluição das identidades partidárias.
À coerência e à habilidade em fazer promessas que atendam às expectativas dos eleitores outro elemento que se une à construção da imagem do político é a questão do estilo pessoal, sua maneira de se vestir e se comportar. Em tempos de hiperinflação de informações, com a importância da TV e a acessibilidade permanente propiciada pela internet, este tema, antes marginal, parece se tornar cada vez mais relevante. Com isso, ao lado do marqueteiro, outro profissional emerge: o personal stylist, responsável pela “paginação” do candidato com o objetivo de torná-lo mais atraente para os eleitores.
Existe até uma tipificação dos estilos pessoais mais reconhecidos pelos brasileiros, cada qual tanto com seu lado positivo quanto com o negativo. Há, por exemplo, o “romântico”, caracterizado pela “sensibilidade, suavidade e gentileza”, ou o “sexy”, cujos elementos incluem sedução, carisma, coragem e autoconfiança. São justamente esses dois estilos os que mais atraem os eleitores brasileiros, segundo a consultora de imagem Sabina Donadelli, para quem os candidatos que têm naturalmente algum desses dois elementos conquistam mais chance de encantar os eleitores.
Caiu na rede
Fato é que promessas, gestual e estilo pessoal, além de dinheiro, por muito tempo foram combinados para construir ou consolidar a imagem dos políticos, sempre com um foco nos meios tradicionais de comunicação, em especial a TV e o rádio, que são basicamente unidirecionais. Não sem razão, há um enorme investimento de tempo, saliva e compromissos para consolidar alianças partidárias com o intuito de aumentar o tempo de exposição dos candidatos no horário eleitoral gratuito.
O que esses meios tradicionais basicamente fazem é garantir a emissão da mensagem para os eleitores, mas não lhes facilita a interação direta com o candidato. Com a internet, tudo isso muda radicalmente. E como fica o jogo político neste novo contexto?
O jornalista e consultor Roberto Rech é veterano de várias campanhas políticas e um defensor da internet como um canal para quebrar o monopólio de comunicação da mídia tradicional. “Um grande veículo pode decidir não publicar algo sobre determinado candidato, por afinidade ou interesse político, mas basta essa informação cair na rede e já é de conhecimento público”, diz. Para ele, mesmo aqueles que estão na base social, com pouco ou nenhum acesso à internet, acabam sendo tocados pelo que chama de “contágio eleitoral”, muitas vezes iniciado em discussões ou ações no mundo virtual. “No caso do Barack Obama, a internet foi a grande responsável pelo contágio, pelo levante daquela onda que a gente não consegue explicar ainda direito, mas que acabou levando-o à Presidência dos Estados Unidos.”
Com o advento das redes sociais na web, o trabalho dos candidatos para construir e consolidar sua imagem pública certamente ficará mais difícil. É o que pensa Haroldo Ceravolo, diretor de redação dos sites Opera Mundi e Última Instância. Ele reconhece que, nas eleições deste ano, apesar de toda a expectativa ao redor do uso da internet, a TV segue sendo o principal canal de informação e mobilização dos eleitores. Mas, para as próximas eleições, o poder da TV tende a diminuir, com mais pessoas tendo acesso à internet com uma velocidade maior.
“O modo de se fazer campanha terá de mudar. Haverá novas preocupações, porque o texto e as posturas dos candidatos estarão submetidos a um contato mais direto com as pessoas”, diz Ceravolo. Ele acredita que aí, então, será possível entender o que é uma campanha pela internet. Exemplos recentes em que a web fez diferença foram o da já citada campanha de Barack Obama e a do ex-prefeito de Bogotá Antanas Mockus, que o transformou em uma sensação ao levá-lo, contra todos os prognósticos, ao segundo turno das eleições na Colômbia.
Para Ceravolo, exemplos como os citados, de uso eficiente e criativo da internet na campanha eleitoral, ainda são poucos, mas tendem a aumentar com a crescente popularização da rede de computadores. Ou seja, os futuros Odoricos terão de usar muito mais do que advérbios, sorrisos e promessas para ser escutados. Provavelmente terão de estar conectados permanentemente, dialogando e sendo questionados em tempo real por seus eleitores e detratores. E, quem sabe, fazendo da verdade seu maior trunfo eleitoral.
Veja quadro com os estilos dos candidatos identificados pela consultora Sabina Donadelli.
Confira aqui as fotos do making-of da arte corporal de Beto França e saiba mais sobre o que inspirou Página22 a realizar o ensaio.
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O que dizem os blogueiros
Depoimentos de blogueiros referenciais colhidos por Página22 mostram a influência da internet e das redes sociais na política como uma tendência que desponta. Mas afirmam que seus recursos ainda são pouco usados pelo cidadão e muito mal explorados pelos candidatos :
Primeiro teste
As eleições 2010 serão o primeiro teste dos políticos para o jornalismo-cidadão que nós, “consumidores 2.0”, fazemos nas redes sociais desde a popularização das ferramentas de compartilhamento de notícias e de autopublicação. Se antes precisávamos ir ao ombudsman para ler uma visão mais crítica da notícia repercutida, agora temos muitos blogs e perfis de Twitter para seguir, ora concordando, ora discordando, mas acima de tudo – e felizmente – vivenciando um debate inovador na nossa sociedade. Sugiro que o eleitor interessado em votar bem escolha um foco (eu escolhi educação) e acompanhe os candidatos na temática selecionada, sendo também um propagador dos erros e acertos de suas propostas e campanhas neste assunto. Isso é ser proativo no desnudar do candidato e na tarefa de escolher quem vai representar seus interesses no próximo governo. Samantha Shiraishi, editora do blog A vida como a vida quer.
Candidatos analógicos
Há um abismo entre o que a campanha digital poderia ser e o que está sendo. Os candidatos estão mais preocupados em influenciar (ou manipular) a opinião alheia do que efetivamente compartilhar suas opiniões, conversar, mostrar quem são. Não temos candidatos na internet, são seus assessores que cuidam dos seus espaços, cometendo gafes, pinçando as perguntas que querem responder e editando tudo para que o candidato apareça plástico e sem vida, defendendo os argumentos que a campanha decidiu serem o pilar de sua candidatura. Não temos espaços abertos para conversar com os candidatos no âmbito digital, porque a candidatura off-line toma todo esse tempo: as redes sociais contemplam relacionamento e os candidatos estão usando a internet como mídia de massa. Edney Souza, editor do blog Interney.
Canal ainda mal explorado
As mídias sociais ainda estão sendo utilizadas de modo muito tímido no Brasil. Não poderia ser diferente: apesar do crescimento substancial de visitas a sites como Twitter e Facebook no País nos últimos doze meses, o fato é que a TV aberta ainda é o grande formador de opiniões no Brasil. Outro problema que diagnostico é o fato de, em blogs e mídias sociais, as discussões políticas andarem extremamente exacerbadas. O maniqueísmo desses debates empobrece demais as discussões, afastando interessados em comentar política. E a internet, que poderia representar um meio onde fosse possível encontrar informações diferenciadas, infelizmente acaba por fomentar rivalidades em vez de construir pontes de entendimento entre partidos. Alexandre Inagaki, editor do blog Pensar Enlouquece.