O ano de 2010 pode marcar o segundo registro de branqueamento global dos recifes de corais, fenômeno decorrente do aumento das temperaturas dos oceanos. O primeiro ocorreu em 1998 e afetou todas as regiões com recifes de corais – ecossistemas que abrigam até um quarto das espécies marinhas. Enquanto alguns especialistas fazem previsões dramáticas sobre quanto dos recifes pode sucumbir a essa nova rodada de branqueamento, Terry Hughes, diretor do Centro de Excelência para Estudos de Recife de Coral, na Austrália, prefere falar em resiliência. Os corais têm mais capacidade de se adaptar ao aquecimento global do que se pensava, revela ele, mas sua sobrevivência depende do que fizermos em relação às mudanças climáticas.
Além de uma rápida alteração do clima, os recifes de corais, assim como outros ecossistemas, têm de lidar com 7 bilhões de pessoas e impactos como poluição e sobrepesca. Segundo Hughes, ainda operamos como caçadores-coletores nos oceanos, e um manejo muito mais ativo para conservar os recursos marinhos é necessário. Embora a trajetória seja de melhoria, ela só ganha tempo para que enfrentemos o problema das emissões de carbono.
Vinte e três por cento da população global vive a 100 quilômetros da costa, e até 2030 serão 50%. Qual a importância dos recifes de corais para as comunidades humanas? O link mais óbvio é a alimentação. Muitas pessoas, particularmente em países em desenvolvimento, dependem da pesca de subsistência. A Austrália é diferente, porque somos um país rico e nossa associação com os recifes de corais é mais focada na recreação e conservação. Mas há 80 países com recifes de corais, e lugares como a Indonésia ou as Filipinas têm grandes populações que dependem muito da biodiversidade da costa como alimento.
A biodiversidade inclui não só peixes grandes, mas também uma miríade de animais minúsculos. Em geral prestamos atenção nas espécies maiores e mais carismáticas. Qual o papel dos microrganismos? Uma quantidade significativa dos esforços de conservação nos recifes de corais, assim como em terra, centra-se nas espécies carismáticas. No contexto marinho, são animais como as tartarugas, que seriam o equivalente marinho aos coalas ou ursos pandas. Mas elas não são necessariamente as espécies mais importantes em termos de como o ecossistema funciona. Tende-se a perder primeiro as espécies maiores e muito da megafauna está exaurida – acho que todos sabem da história das baleias. Baleias, tubarões, dugongos (um parente do peixe-boi) e tartarugas são muito vulneráveis à sobrepesca, porque crescem devagar e, embora vivam muito tempo, tendem a ter poucos filhotes.
Há muita preocupação agora com os corais em si, particularmente no contexto da mudança climática. Outro problema é a pesca destrutiva e, em algumas partes do mundo, os próprios corais são extraídos. Eles são amplamente utilizados para fazer cal, usada para fazer cimento, ou simplesmente esmagados e empregados na construção de casas ou para aterramento. Já perdemos muito coral e, embora não seja uma espécie carismática, é o que dá estrutura tridimensional ao recife – é o equivalente às árvores em uma floresta. Uma vez perdida tal estrutura, perdem-se todas as espécies associadas a ela, inclusive as microscópicas.
Essas espécies microscópicas são afetadas pelo aquecimento global? Provavelmente a espécie microscópica mais importante em um recife é a alga que vive dentro do coral, chamada zooxantela. O branqueamento de um coral durante um evento particularmente quente, como no caso de um episódio do El Niño, representa a quebra da relação entre o coral e a alga. A zooxantela é o que dá cor ao coral e, quando o coral sofre estresse, a alga é expelida e o coral se torna branco – por isso o nome branqueamento. Perde-se a cor das algas microscópicas e vê-se apenas o esqueleto do coral. O branqueamento não necessariamente mata o coral, mas em geral eles morrem porque perdem nutrientes, uma vez que as algas se vão. Elas fazem a fotossíntese e fornecem muita da energia que os corais usam. Outra coisa que está ocorrendo nos recifes, especialmente aqueles poluídos e estressados, é que a incidência de doença está aumentando – nesse caso, trata-se de um conjunto de espécies microscópicas que fazem algo de mal. Parte da história de perda de cobertura de coral nos últimos 20 anos é uma combinação de mais estresse devido ao aquecimento global e mais doença.
A doença está relacionada a outros estresses que afetam os corais? Sim, está, de uma forma que não compreendemos bem. É muito claro que a doença está aumentando e que ela é mais prevalente em recifes estressados por outras coisas. Não se sabe se é uma distorção do topo-para-baixo da cadeia alimentar que promove esses micróbios ou se é um efeito de baixo-para-cima da poluição. Se você pensar na cadeia alimentar com predadores – tubarões e outros – no topo, eles comem predadores menores, que comem herbívoros, que comem algas e ervas marinhas. O impacto do topo-para-baixo é causado pela remoção das grandes espécies no topo. O efeito de baixo-para-cima ocorre quando adicionamos nutrientes que estimulam espécies como algas e ervas marinhas. Nós fazemos os dois ao mesmo tempo. De qualquer forma, o que resulta é um efeito dominó para cima ou para baixo ao longo da cadeia alimentar e que a distorce.
Além de sobrepesca, poluição e aquecimento global, há outras ameaças aos recifes? Você poderia fazer uma lista muito maior e incluir lixo, derramamento de petróleo, encalhamento de navios, por exemplo, mas estas que você citou são as três grandes ameaças. E o interessante, do ponto de vista do manejo, é que elas são muito interativas. Se você quiser matar um recife, adiciona nutrientes que promovem o crescimento de algas, remove as espécies herbívoras que controlam as algas, e espera que algo de mau ocorra, que pode ser um evento natural como um ciclone ou um evento não natural como aquecimento global. Quando o coral sofre um choque como esse, normalmente se recupera, mas porque agora é um sistema poluído e explorado, em vez de se recuperar, cada vez mais há uma explosão no crescimento de algas. Essas explosões de algas podem ser muito persistentes e o que resulta é um ecossistema alternativo muito degradado.
O sistema persiste, mas em situação diferente da anterior? Chama-se de regime ou fase, e fala-se muito da mudança de fase ou de regime, ou um flip para um sistema alternativo.
Esse novo estado é necessariamente ruim? É um julgamento de valor chamá-lo de um sistema degradado. Se você gosta de alga, então é uma melhoria. Certamente o valor para o turismo é muito menor, embora isso levante a questão de como as pessoas percebem o estado de um recife de coral. Às vezes eu acho que o turista japonês médio que vem à Grande Barreira de Corais, na Austrália, provavelmente ficaria feliz com muitas algas e alguns Nemos. Eles não sabem o que estão perdendo! Mas há mergulhadores que viajam o mundo, e nas revistas de mergulho você vê resorts anunciando que seus recifes nunca sofreram branqueamento – nem sempre isso é verdade.
O fenômeno do flipping é muito comum em todo tipo de ecossistema. Se você pensar em um lago que se torna poluído, uma paisagem que se torna salina, no aquecimento global causando a desertificação ou no colapso de cardumes no meio do oceano, todos são descritos como mudanças de regime. No caso do Brasil, se você desmatar o suficiente da Amazônia, vai alterar o regime de fogo, o que pode mudar permanentemente todos os tipos de ecossistemas que são possíveis ali. Você terá então um conjunto diferente de mecanismos que ficam travados em um sistema diferente. Uma vez que o solo se torna salino, é muito difícil dessalinizá-lo. Quando as algas substituem os corais, aquele ambiente se torna um lugar terrível para um coral habitar e também não é um bom local para ser um filhote de peixe. Muitos peixes vivem nos braços de corais vivos; se o coral morre, os peixes se vão, o que tende a reforçar o novo ecossistema.
Quão importante é a biodiversidade para a capacidade de um ecossistema de se adaptar a mudanças? Há evidências de que a biodiversidade confere resiliência a um sistema, muito como um fator de segurança ao ter várias espécies desempenhando funções semelhantes. A analogia que às vezes se faz é com um portfólio de ações – se você quer que ele seja robusto, não compra apenas uma ação, mas várias, porque algumas vão subir e outras vão cair. Nesta parte do mundo, o Pacífico Ocidental, os corais são muito diversos. Ao norte de nós estão os recifes chamados de Triângulo dos Corais, que são um hotspot de biodiversidade, da mesma forma que a Amazônia é um hotspot de biodiversidade terrestre. Outros recifes ao redor do mundo têm bem menos espécies. Ao longo dos oceanos Pacífico e Índico, há um gradiente de biodiversidade em que se observa consecutivamente menos e menos espécies. A Grande Barreira de Corais, na Austrália, tem cerca de 350 espécies de corais, mas o Caribe tem apenas 60. E, se você divide as espécies em categorias, digamos, os corais com grandes braços, há 35 espécies desses na Grande Barreira, mas apenas uma no Caribe.
Por que tamanha diferença? É basicamente consequência histórica de taxas diferentes de especiação e extinção em diversas partes do mundo. Mas a consequência para a ecologia é significativa. Se você tem apenas uma espécie desempenhando uma função importante em um ecossistema, e essa espécie desaparece, então a função também desaparece. Mas se você tem 35 espécies fazendo a mesma coisa, você pode perder metade delas e a função continua a ser desempenhada. Um exemplo é o que aconteceu no Caribe nos últimos 30 anos. Com a sobrepesca, os peixes herbívoros foram exauridos e os recifes efetivamente perderam o papel que eles desempenhavam. Isso não fez diferença por muito tempo, porque uma espécie de ouriço-do-mar tornou-se abundante e executou esse papel, controlando as algas. Mas uma doença veio pelo Canal do Panamá e 98% dos indivíduos dessa espécie de ouriço morreram em um único ano, foi em 1983. Era o último herbívoro no ecossistema dos recifes do Caribe, e, quando ele morreu, uma enorme quantidade de algas cresceu e tornou-se fator importante para o declínio dos recifes. Há muito poucos lugares no Caribe que estão em bom estado, e os que ainda estão são relativamente remotos e ainda têm peixes.
O senhor disse que os recifes em geral se recuperam do branqueamento. Sabemos o que determina essa capacidade de recuperação? O impacto do branqueamento depende de quão longo e grande é o estresse térmico. O branqueamento tende a acontecer quando a temperatura atinge 2 graus acima da máxima normal no verão e fica ali por cinco ou seis semanas. Mas há variações – se é um período curto ou se a temperatura não sobe tanto, pode haver eventos de branqueamento menores. E o branqueamento é seletivo, afeta algumas espécies mais do que outras. Em algumas partes do mundo o branqueamento vem ocorrendo desde a metade dos anos 80. Na Polinésia Francesa, que está muito próxima do epicentro do El Niño, no Pacífico Leste, alguns recifes sofreram branqueamento seis ou oito vezes.
E se recuperaram? De certa maneira, sim, mas o que vem acontecendo é que a composição de espécies está mudando. Os recifes ainda têm a mesma cobertura que tinham nos anos 70 e 80, mas a composição mudou em favor das espécies mais fortes, o que é boa notícia, pois sugere que eles têm mais capacidade de se adaptar ao aquecimento global do que lhes dávamos crédito. Às vezes leem-se declarações como “todos os corais estarão mortos em 20 anos” – eu acho que são extrapolações e que não ajudam.
Qual a sua projeção? Acho que a lição de eventos de branqueamento que ocorreram até agora é que algumas espécies são mais resilientes do que outras e que a recuperação é possível, desde que se administrem os outros fatores, em especial a poluição e a sobrepesca. Parte da lógica por trás do rezoneamento da Grande Barreira de Corais há alguns anos foi melhorar sua capacidade de lidar com eventos de branqueamento, ao reconstruir estoques de peixes e reduzir a descarga de nutrientes.
A Grande Barreira é um parque marinho com sete tipos de zonas – as mais comentadas são as zonas verdes, em que a pesca é proibida. Em 2004, a proporção do parque designada como zona verde subiu de 5% para 33% e passou a ser a maior rede de reservas sem-pesca do mundo. Nos primeiros três anos depois do rezoneamento, a quantidade de peixe dentro das novas zonas verdes duplicou. Houve uma resposta de todo o sistema que foi bastante significativa. A diferença entre as zonas verdes e as zonas azuis – em que a pesca é permitida – que as rodeiam é de até cinco vezes. E a lógica para o rezoneamento não foi tanto a da reconstrução dos estoques de peixes, mas a de reconstruir a capacidade funcional dos peixes. Chamamos isso de uma abordagem baseada no ecossistema, em vez de uma abordagem por pescaria, que é a mais tradicional em termos de manejo dos recursos marinhos.
Esse tipo de manejo vem ocorrendo ao redor do mundo ou ainda é raro? Acho que o mundo está experimentando novas maneiras de manejar no reino marinho. Até certo ponto ainda precisamos alcançar a história de manejo terrestre. Os parques terrestres fazem parte do mix de abordagens de manejo há mais de um século, mas no oceano eles ainda são uma ideia nova.
Por que os oceanos ficaram para trás? Acho que em parte porque “o que os olhos não veem o coração não sente”. O tamanho da degradação nos oceanos é muito menos óbvio e muito mais fácil de ignorar ou negar. Em terra, é claro para qualquer um com um par de olhos que a Inglaterra não é mais coberta de florestas de carvalho e que não há mais lobos e ursos por lá. É muito menos óbvio que o número de baleias no oceano é cerca de 5% do que costumava ser. Em terra, substituímos muitos dos animais grandes por outros, por exemplo, substituímos o búfalo por vacas e ovelhas. Mas do oceano tiramos todos os animais grandes e não os substituímos. Não temos aquacultura para tubarões ou baleias. Em terra fizemos a transição de caçadores-coletores para agricultores, mas no oceano ainda estamos no começo da transição de caça-e-coleta – que é o que a pesca é – para aquacultura. A aquacultura cresce rapidamente, mas ainda estamos caçando peixe. Passamos a um sistema baseado em direitos de propriedade em terra, onde há cercas e alguém é responsável por um espaço, mas há ainda muito pouco disso no oceano.
Os oceanos são um commons global como a atmosfera. Como criar um sistema de manejo que faça sentido na escala global? O manejo espacial, como o das sete zonas da Grande Barreira, é um exemplo. Não é um sistema de direitos de propriedade, mas há elementos disso. Por exemplo, os grandes operadores de turismo têm pontões no recife. São plataformas flutuantes mais ou menos do tamanho de duas quadras de tênis e os operadores levam de 200 a 300 turistas para lá por dia. Eles assumiram contratos de locação para aquelas parcelas de recife onde os pontões estão, pagam aluguel e devem monitorar qualquer impacto que tenham na área circundante. Eles têm responsabilidades, mas são como inquilinos daquele pedaço de recife.
Outro grande avanço que estamos vendo no momento é a criação de reservas oceânicas de grande escala. A Inglaterra acaba de declarar as Ilhas Chagos, no Oceano Índico, como uma reserva sem-pesca de 1 milhão de quilômetros quadrados. Os EUA declararam vários grandes parques marinhos. São basicamente oceânicos, com muito pouca gente, então são relativamente baratos em termos de custo político, negociações e compromissos, se comparados com o manejo costeiro, que é muito mais difícil, porque é preciso lidar com interesses como os pesqueiros comerciais e de recreação. Mas há uma tendência geral em direção ao manejo do oceano como um mosaico de áreas. Acho que a tendência é em direção a um manejo melhor dos oceanos do que vimos historicamente.
Há a tentativa de que todos os países concordem sobre como manejar os oceanos, como para as emissões de gases de efeito estufa? Isso tende a ser setorializado, mas há acordos internacionais sobre coisas como o manejo da pesca de atum, por exemplo. Há alguns anos os países designaram suas zonas econômicas exclusivas – cada país agora tem um mapa mostrando sua soberania sobre o oceano nos mares que o circundam e tem direitos sobre essa propriedade, é uma extensão de sua área. O ímpeto para isso não foi o manejo da pesca, mas a exploração futura de óleo e gás, que está começando a se abrir com a tecnologia, a despeito do derramamento no Golfo do México. Acho que a tendência é de evolução dos direitos de propriedade no oceano e há exemplos nas Filipinas e no Chile de legislação que dá direitos exclusivos a pescadores de subsistência em águas costeiras. Nas Filipinas, muitos dos recifes de corais costeiros são manejados por municipalidades. No Chile, o governo tem um sistema em que enseadas são alugadas para coletivos de pescadores, que pagam aluguel e têm direito exclusivo de colheita sobre os recursos costeiros.
Tem-se falado sobre “o outro problema do carbono”, a acidificação das águas do oceano. O senhor pode explicar do que se trata e por que é importante para os recifes de corais? Como se sabe, estamos emitindo muito CO2 na atmosfera e cerca de um terço do CO2 extra que as pessoas produziram foi parar no mar. O oceano diminuiu a quantidade de aquecimento global até agora, mas a conseqüência é que há mais CO2 dissolvido e isso altera o pH da água. Isso é importante, porque muda o íon carbonato na água, que é a pedra fundamental da calcificação. Animais como corais e organismos com conchas podem ter dificuldade em fazer a calcificação no futuro, porque haverá menos carbonato em solução na água. O quão grande é esse problema ainda é uma questão em aberto. É um problema de longo prazo para os recifes de corais, porque a trajetória de absorção do CO2 no oceano é muito mais longa do que a de aquecimento da atmosfera. A quantidade de carbonato no oceano é dependente da temperatura – há mais carbonato nos trópicos do que em águas mais frias, e isso é parte da razão por que os recifes de corais são tropicais. Ninguém sabe o que vai acontecer com a taxa de crescimento dos corais se a quantidade de carbonato diminuir.
Os experimentos com a fisiologia dos corais hoje são feitos em aquários em que se esquenta a água ou se adiciona ácido para mudar o pH. Eles mergulham o organismo, o coral, em um aquário que representa as condições de daqui a 200 anos, mas fazem isso do dia para a noite. Eu não sei o que isso significa. A grande questão é a capacidade do recife de se adaptar, ou se aclimatar. A curto prazo, há boas evidências de que os corais têm capacidade tanto de se adaptar quanto de se aclimatar, e elas vêm de estudos sobre o que acontece dentro da distribuição geográfica de espécies individuais. A maioria dos corais tem distribuição geográfica grande, a partir do Equador a até 30 graus ao norte ou ao sul. Dentro desse “envelope”, pode haver uma diferença de 10ºC na temperatura máxima do verão. O branqueamento ocorre em qualquer ponto dentro dessa distribuição quando a temperatura sobe 2 graus acima da média para aquele ponto. Na Ilha Lord Howe, a noroeste de Sydney, está o recife mais ao sul no Oceano Pacífico. Ele tem cerca de 110 espécies de coral e elas sofrem branqueamento a cerca de 28 graus. Mas 56 dessas espécies também são encontradas no Golfo Pérsico, onde sofrem branqueamento a cerca de 34 graus. Claramente elas se adaptaram às águas quentes do Golfo Pérsico. Não temos ideia de quanto tempo isso levou. Então as questões são a velocidade da evolução e a capacidade de espécies adaptadas a águas quentes de migrar. Sabemos que os corais migraram em direção aos pólos em tempos geológicos mais quentes e recuaram nas eras do gelo. Eles têm capacidade de migrar e isso já está acontecendo com o atual aquecimento global.
Estamos tornando as coisas mais rápidas para eles? Há debate considerável sobre isso. As evidências mais recentes que conheço indicam que as eras do gelo começam e terminam muito mais abruptamente do que pensávamos antes. São testemunhos guardados no gelo, que registra a queda anual de neve e guarda bolhas que permitem observar as proporções isotópicas que, por sua vez, revelam a temperatura. Esses estudos parecem indicar que as eras do gelo começam e terminam em um período de algumas décadas em vez de séculos ou milhares de anos. Independentemente disso, é certo que desta vez os ecossistemas têm que lidar com 7 bilhões de pessoas, assim como com uma rápida mudança do clima.
Ainda assim, o senhor tem uma previsão para quanto dos recifes podem sobreviver? A resposta depende do que fizermos. Defendo que não é muito tarde para salvar os recifes de corais se realmente tentarmos. Na minha opinião temos uma janela que está se fechando. Se não fizermos nada sobre a mudança do clima e o mundo se aquecer em mais de 2 ou 3 graus, então veremos sistemas muito degradados. Mas, se lidarmos com a questão dos nutrientes e dos herbívoros, podemos ganhar tempo para que o mundo aja em relação às emissões de CO2. Já há mudanças significativas ocorrendo nos recifes de corais, em termos de composição de espécies, de distribuição geográfica. Ainda teremos ecossistemas, a questão é quão modificados eles serão. Acho que podemos ter recifes de corais funcionando se encararmos a mudança do clima antes que seja tarde.
Como os cientistas devem tentar influenciar os políticos e tomadores de decisão? Os cenários pessimistas são eficazes em gerar ação ou falar em resiliência dos ecossistemas tem mais efeito? Há o risco de que, ao passar a mensagem de que os ecossistemas podem se adaptar, não haverá ação? Não acho que o cenário de desesperança seja produtivo. Se você diz a um político que tudo estará morto em 20 anos, ele vai sacudir os ombros e dizer: “Não há nada a fazer”. Prefiro apresentar uma gama de possibilidades que requerem ação para alcançar algum resultado positivo. Se for verdade que tudo estará morto em 20 anos, então pode ser melhor desistir, pois teoricamente estaríamos desperdiçando recursos. Não quero mandar a mensagem a um político para que desista, porque não acho que é tarde demais para melhorar a situação.