O Brasil não detém nem 1% das patentes de energia limpa nos Estados Unidos
Enquanto o fantasma do agravamento da recessão na Europa assombra o mundo, um dado da vitalidade da economia de baixo carbono tem passado despercebido da opinião pública. No ano passado, o Escritório Americano de Patentes, principal referência mundial no assunto, concedeu 1.881 patentes para tecnologias relacionadas a veículos elétricos, células a combustível e aplicações energéticas de biomasa e fontes eólica, geotérmica, solar e hídrica (hidrelétricas, ondas marítimas e marés).
O número, 170% superior ao de 2009, foi divulgado em março no relatório Índice de Crescimento de Patentes de Energias Limpas, publicado trimestralmente por Heslin Rothenberg Farley & Mesiti P.C., o maior escritório de advocacia do Vale Tecnológico do Estado de Nova York, nos Estados Unidos.
Chama atenção a concentração das patentes concedidas a um seleto grupo de nove países de 2002 a 2010. Mais de 90% originam-se de empresas dos EUA (49%), Japão (27%), Alemanha (8%), Coreia do Sul (4%), Canadá (2%), Taiwan (2%), Dinamarca (1%), França (1%) e Grã-Bretanha (1%). O Brasil não aparece nem com 1% das patentes de energias limpas nos Estados Unidos, o que denota o lugar ainda marginal do País em uma dimensão estratégica da economia, que é o da inovação tecnológica voltada para a sustentabilidade.
Para incentivar tecnologias ambientais inovadoras e competitivas no mercado global, o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) iniciou em março estudos visando diminuir substancialmente o prazo de análise de patentes de tecnologias associadas aos temas mudanças climáticas e energias renováveis. Um projeto-piloto, que consistirá basicamente de uma fila exclusiva para a análise dessas patentes, será realizado a partir de junho de 2012, caso o Inpi receba sinal verde do governo federal.
Assim, o prazo de análise de patentes de energias limpas encurtará bastante em relação aos oito anos atuais, possivelmente para menos de quatro anos, prevê Júlio César Moreira, diretor de patentes do Inpi. Desde que ampliou de 112 para 270 seu quadro de examinadores em 2006, o Inpi diminuiu em quatro anos o tempo geral de análise. “Só não aceleramos mais porque são necessários três anos para capacitar um recém-contratado.” Na área de biocombustíveis, o crescimento significativo no número de pedidos de patentes no Inpi na última década comprova que as inovações no setor encontramse em pleno florescimento em universidades e empresas.
De 2001 a 2010, as publicações anuais de pedidos de patentes de tecnologias relacionadas ao biodiesel por empresas brasileiras passaram de 10 para mais de 30 nos dois últimos anos e as de etanol saltaram de 4 para 22 em 2010. Porém, esbarram no gargalo da análise, uma vez que não recebem tratamento diferenciado, como ocorre em alguns países desenvolvidos.
Até o momento, porém, o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) parece distante dos estudos do Inpi. A reportagem procurou o MCT e a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) para saber se os dois órgãos executam, ou planejam promover, programas de incentivo ao patenteamento de energias renováveis. “A Finep não lida com questões referentes a patentes e não possui área específica voltada para tecnologias de energia limpa”, informou a instituição, por meio de sua assessoria de imprensa. Apesar da inexistência de iniciativa específica em tecnologias ambientais, a Finep já investiu R$ 126 milhões em 80 projetos de biocombustíveis.
O BNDES apoia tecnologias de energias limpas em diferentes programas e fundos dedicados à inovação, como o Fundo Tecnológico (Funtec), cuja carteira contempla cinco projetos de energia renovável e seis relativos a meio ambiente, no valor de R$ 72 milhões.
O banco financia, por exemplo, o desenvolvimento de silício adequado a painéis solares fotovoltaicos. Em junho, o BNDES anunciou chamada pública para a constituição do Fundo de Inovação em Meio Ambiente, que terá aporte inicial de R$ 150 milhões para investimentos em tecnologias limpas. É o próprio diretor de patentes do Inpi quem adverte para a necessidade de o país investir na área de inovação e propriedade intelectual em tecnologias ambientais.
“Hoje periférica na área de patentes em tecnologias limpas, a China logo será uma potência também nessa área. Só na China, há 800 mil depósitos de patentes de tecnologias em geral. Os chineses gradualmente estão se enquadrando nas regras internacionais da propriedade intelectual.” E farão isso para ingressar no seleto clube do qual o Brasil continuará bem distante se não fizer o seu dever de casa. (Colaborou Gisele Neuls)